Jornalista (UFC-CE) e licenciada em Letras (Uece), é doutoranda em Linguística (PPGLin-UFC), mestra em Estudos da Tradução (UFC-CE), especialista em Tradução (Uece) e em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais (Estácio). No O POVO, já atuou como ombudsman, editora de Opinião, de Capa e de Economia, além de ter sido repórter de várias editorias. É revisora e tradutora.
Para muitos, o ato de votar para escolher seus governantes é, além de uma obrigação com a Justiça Eleitoral, uma ação afetiva. Há quem faça questão de manter seu domicílio eleitoral na cidade em que nasceu ou no bairro em que foi criado para manter o compromisso de voltar ali a cada dois anos.
Talvez fosse até mais coerente que se mudasse o lugar de votação, visto que o eleitor não mora mais naquela região e, portanto, o prefeito e o vereador que ele ajudaria a escolher devessem ser os de seu local de moradia. Há, no entanto, razões maiores para a resistência dessa transferência.
A desculpa proposital de voltar à cidade natal, mesmo a cada par de anos, faz da "festa da democracia" uma chance ao reencontro. Rever amigos da infância, relembrar causos da adolescência, revisitar a escola que oportunizou os primeiros conhecimentos e abraçar novamente os conhecidos animam uma agradável lembrança saudosa. E só quem tem o umbigo no Interior entende desse sentimento.
A volta ao bairro de origem tem relação semelhante. Retornar, a cada dois anos, à vizinhança em que se nasceu e foi criado é trazer à memória emoções guardadas de um passado, às vezes, distante, mas quase sempre querido. Quando o local de votação é na escola em que se estudou, aí a visita é mais esperada. Mesmo num domingo, o passeio pelas instalações que acolheu tantos momentos protagonizados anos antes torna a obrigação cívica numa ambulação afetuosa.
Há, por óbvio, quem se mude e logo providencie a transferência do local de votação. Ou se quer definitivamente encerrar o vínculo com o lugar ou não se pretende despender tempo de voltar ali periodicamente. E todos têm seus justos motivos para o rompimento.
Surpreende é que, diante de uma rotina cada vez mais desassossegada em que se exigem praticidade e redução das distâncias, ainda haja muitos que façam questão de manter essa viagem - de volta à sua cidade e às suas memórias. Nem sempre é fácil. Por vezes, há um passado que se quer esquecer ou omitir. Por vezes, não há bons motivos para lembrar. A viagem de volta pode alcançar reelaborações para as quais não estamos prontos.
Mas, quando a viagem é prazerosa e sustenta a dimensão simbólica de voltar para casa, a obrigação de votar é também um momento bom de resgate com a nossa história. E mesmo por pouco tempo, a gente se vê tal qual Rachel de Queiroz construiu tempos atrás: "no mesmo ponto em que começou, como a cobra que morde o rabo". n
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