Série da Globoplay resgata parceria de Michael Sullivan e Paulo Massadas
Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM
Série da Globoplay resgata parceria de Michael Sullivan e Paulo Massadas
Série da Globoplay explora parceria de Michael Sullivan e Paulo Massadas, dupla que marcou os anos 1980 com canções de amor feitas sob encomenda para o sucesso
Quem viveu os anos 1980 na frente da TV ou de um rádio ouviu, quisesse ou não, alguma composição de Michael Sullivan e Paulo Massadas. Do fim dos 1970 até meados dos 1990, eles alimentaram um balaio de sucessos que foi cantado a plenos pulmões por toda a pirâmide social brasileira. Do quarto dos fundos até a sala de jantar, difícil encontrar quem não conhecesse os versos de "Deslizes", "Nem morta" ou "Lua de Cristal".
Essa história que fala de reconhecimento, amizade, estética e noção de bom gosto na sociedade brasileira é o tema da série "Retratos & Canções", disponível na Globoplay. Dirigida por André Barcinski e produzida pela Kuarup, a série promove o reencontro da dupla após 26 anos. Sentados lado a lado, eles vão contando como criaram tantos hits, um completando o outro, e contando a história do Brasil pós-ditadura militar. "A gente ocupou um espaço que era de um governo militar e deu lugar a um governo democrático. Antes as letras eram cifradas. Na democracia, isso não era mais necessário. O povo queria falar de amor e fomos perfeitos tradutores dessas novas emoções. O inconsciente coletivo nos abraçou", explica Paulo Massadas, por telefone.
Juntos em entrevista exclusiva ao Discografia, Sullivan e Massadas falam da alegria de ter essa história registrada em uma série de cinco episódios que conta com depoimentos de gente como Angélica, Fagner e Roberto Carlos. Gal Costa, em um de seus últimos depoimentos, conta bastidores (e confusões) da gravação de "Um dia de domingo" em dueto com Tim Maia. Também convidada, Xuxa senta ao lado da dupla - que criou um mercado de música infantil até então inédito - para relembrar como se tornou cantora.
No entanto, junto com o sucesso veio a patrulha e a crítica pesada. A cada novo hit, mais eles eram chamados de bregas, popularescos e outras coisas assim. "Eu estou cansado dessa pauta. A sociedade evoluiu. O que eu acho disso tudo é que os críticos mais importantes rebobinaram o filme e viram que nem tudo era ruim. Acharam muita coisa boa na nossa música e estou muito feliz por isso", responde Sullivan sem esconder o enfado. "É normal. Sempre que vem uma onda nova, o pessoal da outra onda se incomoda. A gente não veio para brigar com ninguém", acrescenta Massadas.
Na série, Fagner critica uma ideia "elitista" de cultura que deixa de lado tudo que faz sucesso de massa. "No nosso caso, a crítica era maior que a roupa que a gente usava. Sempre tinha um grilo com a crítica. Mas tem a crítica do momento e a de anos depois. A do presente nunca é uma boa. Você só analisa no futuro", afirma Sullivan. Sobre esse debate do que é música boa, Massadas é mais sintético: "Se arrepia a tua pele, não adianta. Ponto". Sullivan aproveita o mote: "A música é como um sorriso, que tem que ser simples".
Pois foi arrepiando muitas peles que eles uniram o que tinham de comum e construíram a trilha sonora de uma geração. O carioca Paulo Cesar Guimarães Massadas e o pernambucano Ivanilton de Souza Lima nasceram no mesmo ano, 1950, foram impactados pela beatlemania, viveram a noite em bandas de baile e se encontraram no fim dos 1970 para fazerem músicas juntos. A experiência de tocar na noite foi fundamental para entenderem o que o povo queria ouvir. Fosse dançar ou cantar baixinho no ouvido de alguém, os bailes foram fundamentais para que eles aprendessem a medir a temperatura do público. "Você é o resultado de tudo que presenciou. De gente anterior a você. É assim a formação de cada um. Nós tivemos a sorte de nascer numa época em que era impossível não se apaixonar. E tivemos o desejo de apaixonar as pessoas", entrega Massadas.
Hoje, eles estão distantes mais de 11 mil quilômetros - Sullivan mora em Miami e Massadas em Los Angeles. Mas os 30 anos desde que assinaram a última canção juntos parece não fazer mais diferença. A cumplicidade foi mantida, assim como os versos das centenas de canções que ganharam versões em português, inglês, espanhol, alemão, russo e outras línguas. De Dionne Warwick ao Trem da Alegria, de Fafá de Belém ao Zezo, de Sandra de Sá a Nelson Gonçalves, de Alcione a Kelly Key, a contribuição deles para a música brasileira se mede não somente em números, mas em memórias. No volume de vidas reais que tomaram emprestadas as trilhas sonoras de filmes e novelas feitas por eles.
Registros pessoais
Não bastasse todo o tempo investido em composições para outros artistas, Michael Sullivan e Paulo Massadas ainda gravavam e faziam os próprios shows. A dupla lançou um primeiro registro de estúdio em 1987, com 11 parcerias e a participação de alguns "clientes", como Joanna, Trem da Alegria, Rosana e Fagner. O pianista Sérgio Mendes, já radicado nos EUA, é convidado em "Quero Mais", e Jermaine Jackson, irmão de Michael Jackson, canta em "I need somebody". Em 1991, eles lançaram um trabalho gravado ao vivo no Rio de Janeiro. Com mais alguns convidados, eles reuniram alguns muitos sucessos, como "Nem um toque", "Um dia de domingo" e "Whisky a go go".
Solo, mas nem tanto
Em 2013, Michael Sullivan lançou o disco "Mais forte que o tempo", em que convida 19 artistas para regravarem alguns de suas composições, quase todas elas em parceria com Paulo Massadas. Entre as exceções, tem "My life", uma de suas primeiras composições que aqui ganha a voz de Sandy. O auto-tributo conta ainda com Adriana Calcanhotto ("Me dê motivo"), Ney Matogrosso ("Amor perfeito"), Negra Li ("Não vá"), Paulinho Moska ("Retratos e canções") e Carlinhos Brown ("Whisky a go go"), entre outros. "Um dia de domingo" é incluída em sua versão original e insuperável, com Gal Costa e Tim Maia.
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