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Tania Maria, o mistério do samba e do jazz brasileiro
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Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Tania Maria, o mistério do samba e do jazz brasileiro

Desconhecida no Brasil, Tania Maria conquistou o mundo com seu piano e tornou-se uma fiel representante do jazz nacional
Tipo Análise
Tania Maria, cantora, compositora, instrumentista maranhense (Foto: Reprodução Facebook Tania Maria)
Foto: Reprodução Facebook Tania Maria Tania Maria, cantora, compositora, instrumentista maranhense

No último dia 9 de maio, Tania Maria completou 76 anos de uma vida quase que inteiramente dedicada à música. Não é exagero. Seu disco de estreia, "Para Dançar - Vol. II", gravado aos 14 anos, completou 60 anos em 2023. Uma curiosidade: ela estreia com o segundo volume, sem nunca ter havido o primeiro. "Aqui está ele, o álbum de estreia de TANIA MARIA e seu Conjunto, com deliciosos números bem dançantes", atesta Clovis Mello no texto de apresentação do LP lançado pela CBS.

A confusão no título é só um dos mistérios em torno da trajetória de Tania Maria Correa Reis. Sem redes sociais, site ou biografia, a forma mais fácil de conhecer essa maranhense de São Luís é ouvindo sua música. Aí, diz Clovis Mello, é "realmente fenomenal". Junte o suingue de Jorge Benjor, o senso rítmico de João Gilberto, a ginga de Elza Soares, a elegância de Joyce, o pop soul do Earth, Wind & Fire e os improvisos de Ella Fitzgerald. O resultado é algo muito parecido com esta cantora, compositora, arranjadora, pianista, jazzista, sambista, bossanovista apontada por Ed Motta como "a raiz de toda essa história, dessa coisa da música instrumental e vocal. A pessoa que teve a coragem e a dignidade da vida inteira fazer o que quis na música, de representar o Brasil realmente como a gente merece".

Filha de um metalúrgico e músico amador, ela praticamente começou a dedilhar o piano ao mesmo passo que aprendeu a andar. Aos 12, radicada no Rio de Janeiro, já liderava a primeira banda de baile. Pouco depois, vieram muitos prêmios e reconhecimento, depois casamento, três filhos e um curso de Direito que não foi para a frente. Após se radicar na Europa, vieram mais prêmios, discos gravados e shows lotados na Indonésia, Georgia, Inglaterra, EUA, Alemanha, só para citar alguns disponíveis no Youtube. Um destaque: Tania venceu o mundo tocando piano, sem padrinho famoso e cantando as próprias canções. Um caso raro - se não único - para uma mulher negra brasileira.

"Tânia Maria representa a vitória de uma coisa que a gente realmente almeja, independente de qualquer adversidade que tenha na vida", resume Lael Medina, baterista do Projeto Tania Maria. Formado ainda por Anette Camargo (voz, piano e teclados), Libero Dietrich (baixo) e Danilo Moura (percussão), o projeto nasceu no fim de 2017 como uma forma de homenagear o universo sonoro da artista que dividiu com Fagner a faixa "Homem feliz", do disco que o cearense lançou em 1982.

Quando o projeto nasceu, a banda ainda descobria a rara discografia de Tania Maria. Hoje, o repertório mistura "Yatra tá", "Euzinha" e o clássico "Funk tamborim" com composições da própria banda, muito inspiradas na homenageada. "Essa sempre foi a principal ideia: divulgar o trabalho da Tânia Maria ao máximo no Brasil, porque mundo afora ela já é muito conhecida", comenta Lael que até planeja aumentar o repertório autoral do quarteto, mas sem deixar de lado a proposta que os reuniu.

A estreia ao vivo do Projeto Tania Maria aconteceu em 16 de maio de 2018, tendo a homenageada na plateia. Contando com o apoio da irmã Tania, Vania Reis, o quarteto teve a oportunidade de tocar para sua musa que, desde aquele ano, voltou a morar no Brasil. Depois de ficar viúva, Tania Maria viu sua saúde debilitar e passou a morar com a irmã. Desde então, também não se apresenta em público e só toca piano em raros concertos íntimos para a família. Um deles foi registrado no último 11 de maio, em sua festa de 76 anos, que contou com a presença do Projeto que lançou dois singles recentemente. "Parabéns, Tania", de Anette, é uma homenagem a Tania Maria e a outras mulheres que dedicam a vida à música. Já "Johnny Demais" é uma homenagem a Johnny Alf que Tania compôs, cantou em shows, mas nunca gravou oficialmente. "Acho que todo ser humano, independente do que ele faça, quer ter sucesso. O sucesso no sentido de conseguir mostrar para as pessoas aquilo que realmente ele acredita, que é verdadeiro para ele. E ela conseguiu isso de uma maneira exemplar. A Tania Maria teria muitas questões para desistir, sabe? Ainda mais na época dela, mulher, negra, fazendo música. Acho que ela representa essa vitória do sucesso de cada um, independente das adversidades", atesta Lael.

projeto Tania Maria
projeto Tania Maria

A lista do Projeto Tania Maria

Lael Medina - "Yatra-Tá" foi a primeira música que eu conheci da Tania e isso me levou a gostar de todo o trabalho dela e virar fã. Essa música tem, ao mesmo tempo, um suingue muito musical, uma originalidade muito peculiar das composições da Tania e também não é fácil tocar.

Libero Dietrich - "Lemom Cuica" é uma música que desde o começo me agradou muito. E eu acho a estrutura, a melodia, a harmonia, o ritmo, tudo muito rico. Tudo muito bem feito e elaborado. Sempre foi muito prazeroso poder ensaiá-la, executá-la em show e também gravá-la.

Danilo Moura - Essa música, "Euzinha", se você quiser saber mais dos afetos da Tania Maria, tem que escutar porque ela fala com muito carinho da tia, dos tios, dos primos. É uma música que me traz várias paisagens, fala do Maranhão, fala das comidas, das lendas e de toda essa inspiração que ela traz.

Anette Camargo - Essa composição, "210 west", é muito interessante pela fusão de música brasileira com a música latina. A maneira que ela construiu os tumbaos (na música afro-cubana, é o ritmo básico tocado no baixo), a melodia muito interessante com cara de música brasileira. Ela tem uma forma muito original e muito peculiar.

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Notas musicais

A benção

O primeiro disco ao vivo de Virginia Rodrigues está disponível nas plataformas digitais. "Poesia e Nobreza" traz composições de Paulinho da Viola e Tiganá Santana. Com seu canto único, a baiana interpreta "Minhas madrugadas", "Num samba curto" e outras.

Parceria

Milton Nascimento está lançando disco em parceria com a baixista norte-americana Esperanza Spalding. Em streaming e LP duplo, o disco traz releituras de "Morro velho", "Cais", "A day in the life" e ainda a participação de Paul Simon. O primeiro single, já lançado, é "Outubro".

Novidade

Formada pelo americano Alex Tea e pelo cearense Klaus Sena, a Orquestra Raiz apresenta "Seiva", seu terceiro disco. A ideia é misturar sons tradicionais e contemporâneos em nove faixas. Participações de Igor Caracas, Manoel e Felipe Cordeiro, e poema de Paulo Leminski.

Foto do Marcos Sampaio

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