Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM
Daniel Peixoto, Mulher Barbada, Moon Kenzo
e Georgez para ouvir, sofrer e dançar
Os últimos anos têm sido generosos nos lançamentos de uma música que podemos chamar de Ceará Queer - artistas LGBTQIAPN , que mostram intensamente sua criatividade, seja em performances efusivas nos palcos, ou em lançamentos de EPs e álbuns brilhantes. É reflexo de uma cena eloquente (que em 2024 trouxe também os álbuns de Assucena, "Lusco-Fusco", e "Caju", de Liniker, entre muitos outros trabalhos com essa devoção e intensidade).
Daniel Peixoto mora em São Paulo, onde incendeia noites quentes também como DJ. Com a banda Montage (criada em 2005), é um dos precursores dessa cena nacional, artista do mundo. Rodrigo Ferrera, a drag queen Mulher Barbada, estreou o álbum e show "Bárbara!" em turnê carioca do circuito SESC este ano, e vai do samba ao rock nos rolês alencarinos. Moon Kenzo desbravou o sertão, o litoral e a capital com sua poética das entranhas do álbum e
show "Amarga".
Georgez pode ser o último príncipe das trevas pós-punk e o romântico new wave que nos leva de volta, com muito gosto, aos anos 1980. Mas a música que fazem vai muito além do que qualquer tentativa de definição com um slogan de legenda. Exala verdade num mundo cada vez mais estranho. É disso que eu gosto, das profundezas.
Para escutar
Daniel Peixoto - De Presente - Miami Acid remix
Daniel vem com o EP "De Presente - Miami Acid remix", segundo lançamento de uma série de remixes, das músicas do álbum "Tropiqueer", de 2023. Traz três versões da faixa, remix, acapela (karaokê) e instrumental, mimos para os DJs e produtores criarem novas versões. Com produção de Alahin, o EP marca também a estreia da cantora Thalia Luz, uma das novas vozes de Fortaleza.
Ouça o EP de Daniel Peixoto
https://ditto.fm/de-presente-miami-acid-remix
Mulher Barbada - Bárbara!
Um álbum confessional, de romance, sensualidade e, claro, dores de amores. É "Bárbara!", de Rodrigo Ferrera, nossa Mulher Barbada, que balança o carnaval e outras datas com o Bloco Mambembe. A história da Barbada passa pelo Coletivo As Travestidas, e a personagem tomou conta da cidade há quase 10 anos. Produzido pelo compositor, cantor e músico Caio Castelo, juntamente com Guilherme Kastrup, o álbum ousadamente prioriza autores e autoras cearenses, como clau aniz e Caiô. "Bárbara!" passou pelo Laboratório de Música da Escola Porto Iracema das Artes. A base é MPB, mas flerta com rock e R&B.
Depois do EP CIO (2022), Moon Kenzo mergulhou com tudo nas águas da afetividade para se banhar nos EPs "Invídia" e "Sanha", que antecedem o álbum "AMARGA". De Sobral à Ponta Negra, como diz um dos versos da canção-título, ela "surfa na poesia navalhada de suas canções" para desespero e consolo dos corações. As dez faixas passeiam do R&B ao Vaporwave. São narrativas de luta e ascensão. Com produção de Moon Kenzo e Gegê Teófilo, coprodução musical de Susannah Quetzal, participações especiais de Mona Gadelha, Simone Sousa, Angel History, Jocasta Britto, Rami Freitas, Agê e Marcus Au Coelho.
Com histórico de passagens por várias bandas independentes dos palcos cearenses (Lascaux, Januei, The Dead Lives), Georgez , performer, compositor, ator, arte-educador formado em filosofia, lançou o EP "Gravura" ainda em 2023, antecedido pelo single "Um para o outro" e pelo EP "Rolo Compressor" (2022). Ele diz que "Gravura" é "um pequeno compilado pop-rock, transcendental e pós-pandêmico, ainda digerindo os efeitos do luto e isolamento". Produzido pelo próprio Georgez, Agê e Marcos Au Coelho, traz quatro canções autorais - A Fera Selvagem, Ciudad Triste (em parceria com Coelho), La Sombra e Mentalizando.
Desde adolescente, convivendo com a nascente cena rock de Fortaleza, nos anos 70, Jorge Helder já mostrava suas habilidades de grande músico. Tive a sorte de conviver um pouco com ele, nessa época, ao lado de Siegbert Franklin (1957 - 2011 ), grande admirador de Jorge e sempre ressaltando seu virtuosismo musical.
No dia em que o estádio do Castelão se rendeu à canção brasileira nas vozes de Caetano Veloso e Maria Bethânia (no último 16 de novembro), estava lá no palco Jorge Helder, marcando a presença cearense, muito além das lembranças, integrando a banda e fazendo a direção musical da turnê (ele divide esse trabalho com Lucas Nunes).
Incontáveis gravações em discos (são mais de 350) e participações em shows perpetuam a marca de Jorge Helder como o "baixista mais requisitado da MPB".
Ao mesmo tempo em que está tocando o repertório de mais de meio século de canção brasileira na turnê, ele acaba de lançar o álbum "Samba e Amor" (o terceiro na sequência de "Samba Doce" e "Caroá"), dedicado à obra de seu caro amigo Chico Buarque, parceiro nas músicas "Bolero blues", "Rubato" e "Casualmente" - gravadas no primeiro.
O momento propício são os 80 anos de Chico, completados em 19 de junho. Assim como "Samba Doce", "Samba e Amor" também é lançado pelo Selo Sesc. Ao escolher o repertório, Jorge quis priorizar músicas somente de autoria de Chico Buarque, para lembrar o poeta também como exímio melodista.
É um álbum com alma coletiva, como descreve Jorge. Para essa viagem à gloriosa música de Chico, ele convidou as vozes de Vanessa Moreno, Filó Machado, Chico Pinheiro (guitarra), Hélio Alves (piano e teclados), Vitor Cabral (bateria e percussão), Rafael Mota (percussão em "Ela Desatinou") e Iury Batista (segundo contrabaixo em "Morro dois irmãos"). Pode ouvir nas plataformas, começa belamente com: "Eu te vejo sair por aí…" ("As Vitrines").
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