Biografia de Waltel Branco reacende memória e esclarece lendas do maestro
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Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM
Foto: Reprodução Facebook waltelbranco101
Maestro Waltel Branco tem sua história resgatada em biografia
Em 1986, o Herva Doce - aquela banda do "Amante Profissional" - lançou um compacto com uma balada rock composta pelo tecladista e vocalista Renato Ladeira com Cazuza. Cheia de efeitos bem datados, vocais exagerados e solo de guitarra genérico, "Faz parte do meu show" tocou pouco e passou batida na discografia roqueira nacional. Só dois anos depois ganhou nova chance, quando o próprio Cazuza quis regravá-la no disco "Ideologia". Ninguém queria mais aquela coisa melosa de antes, mas faltava uma ideia original. Foi então que alguém despiu a canção toda, pensou a introdução com violinos tensionando as cordas até que entra um violão em lento ritmo de bossa nova para fazer uma cama simples, direta e confortável para a voz doce do ex-Barão Vermelho.
O nome desse alguém é Waltel Branco, maestro, instrumentista, compositor, arranjador e figura presente em momentos fundamentais da história da MPB. Nascido no município de Paranaguá (PR), em 22 de novembro de 1929, sua história insólita começa logo no batismo: ele deveria se chamar "Walter", mas o oficial do cartório entendeu errado quando o avô, de ascendência alemã, falou o nome do neto. Acabou ficando assim, com L mesmo.
Muito do que aconteceu daí em diante está contado na biografia "O maestro oculto" (Banquinho), lançada em 2023 pelo jornalista Felippe Aníbal. À medida que as histórias vão se sucedendo, o livro vai revelando um personagem movido pelos acasos numa época em que a indústria musical brasileira se profissionalizava. Por exemplo, Waltel chegou a morar na mesma pensão que abrigava um João Gilberto ainda desconhecido. Foram tão amigos que surgiu à época uma lenda de que o arranjo de "Garota de Ipanema" seria dele - quando, na verdade, é de Tom Jobim. Ainda assim, a amizade permaneceu ao ponto de Waltel ter feito arranjos para João (incluindo o de "Me Chama"), viajado com João em turnês pelo Exterior e ainda coube a João acordar o amigo para casar, uma vez que Waltel confundiu a data do próprio matrimônio.
Outra lenda em torno da obra de Waltel Branco é que ele seria o verdadeiro compositor de "The Pink Panter Theme", a famosa trilha do filme "A pantera cor-de-rosa". Felippe confrontou esta afirmação com outros projetos do maestro apresentados na mesma época em que a comédia de Blake Edwards foi produzida e lançada (1963), foi em busca de provas documentais e chegou à conclusão de que o tema é mesmo de Henry Mancini, com quem, aí sim, Waltel trabalhou no exterior e ficou amigo. Na segunda metade daquela mesma década, ainda caberia a Waltel escrever os arranjos do disco "Mancini também é samba", com versões tropicais da obra do maestro norte-americano.
Outra passagem curiosa da vida do musicista é quando ele conheceu, por acaso, num fim de show na boate Number One, o empresário Roberto Marinho, que o convidou para trabalhar num novo canal de TV. Era a rede Globo que estava para nascer e tinha como principal produto as novelas. Ao longo de 25 anos, ele participou como maestro e produtor de uma infinidade de trilhas de novelas, incluindo o super sucesso "Irmãos Coragem", de onde ele pegou um tema, remodelou e entregou para um jovem intérprete gravar em seu disco de estreia. Esse jovem era Tim Maia.
Outra pessoa que Waltel conheceu nesta época foi um alagoano de voz bonita e composições consideradas complicadas. A mistura de jazz, samba, soul que Djavan fazia não era considerada palatável para o grande público, o que dificultava dele fechar contrato com alguma gravadora. Waltel o incentivou, afirmando que essa "complicação" seria o diferencial da obra. De quebra, ainda presenteou o aspirante a artista com um violão, para que pudesse trabalhar no Rio de Janeiro.
Waltel trabalhou por 25 anos na Globo, até que perdeu o emprego - junto com vários outros músicos - para a popularização dos sintetizadores. Nesse período, ainda esteve presente nos primeiros passos de gente como Odair José, Agepê e Evaldo Braga, bem como no retorno de Cauby Peixoto ao posto de ídolo quando assinou o arranjo de "Bastidores". Após sair da emissora de TV, Branco viveu uma história errante. Se afastou da família, dava sumiços, voltou para o Paraná e passou a viver em um pequeno hotel cercado de caixas cheias de memórias desorganizadas. Aos poucos, as muitas partituras assinadas pelo maestro foram se perdendo. Muitos músicos que o conheceram nessa época de solidão e ocaso profissional criaram projetos para mantê-lo vivo, seja shows ou disco. Waltel adorava estar num palco, mesmo quando já não tinha mais segurança no que estava tocando. Morreu em 28 de novembro de 2018, longe das capitais, dos estúdios e dos palcos. Mas com uma história que poucos podem contar semelhante.
Augusto Licks – Ex-Engenheiros da Hawaii. Ele foi o primeiro guitarrista que eu tive a vontade de aprender a tocar guitarra. Aqueles timbres dos anos 1980. Eu comecei minha carreira de aprendizado no final dos anos 1980, através de primos e amigos escutando Engenheiros do Hawaii, sempre me chamou muito a atenção o lance das guitarras do Augusto Licks. Aquele álbum deles que tem a música “Terra de Gigantes”, aquele timbre de guitarra, do solo inicial, que é o álbum chamado “Revolta dos Dandes”, é um álbum que me marcou muito nessa coisa da guitarra. Aliás, os álbuns do Engenheiros do Hawaii com a formação com o Augusto Licks. E esse é o meu lado meio rock, da coisa brasileira, de músico brasileiro.
Robertinho de Recife – Além de um músico extraordinário, tem também toda essa coisa do rock. A veia do rock e a veia nordestina, o melhor dos dois mundos. E eu lembro que um álbum que me marcou muito foi o “Rapsódia do Rock”, que é um disco instrumental, em que ele toca músicas autorais, uma coisa meio de música clássica. E na época desses shows, ele tocava “Jesus e Alegria dos Homens”, misturando a música clássica com a pegada do rock. Fora as produções dele que são belíssimas, além das músicas autorais, da banda Yahoo, que tem a música “Mordida de Amor”, e aquelas guitarras icônicas do Fagner, Zé Ramalho e coisa e tal.
Heraldo do Monte – Até me inspiro muito nele quando estou tocando esse lance mais forró meio com jazz, xote, essa coisa toda. É um guitarrista e violeiro que tem uma grande contribuição para a música brasileira. Essa pegada que a gente conhece meio jazzística dentro do forró é uma coisa que veio dele. Me inspiro muito em escutá-lo tocando, inclusive com os álbuns autorais.
Armandinho – Além de não ser a guitarra convencional, grande, é a guitarra menor, a guitarra baiana, que é um outro instrumento que eu também toco, e essa pegada, essa coisa dele de fazer os frevos, de fazer a música brasileira. Aliás, de fazer a música mundial, de tocar Beatles na guitarra baiana, trouxe toda essa história da música mundial para um instrumento pequeno, em tamanho mais grande e em sonoridade.
Manassés – Tive o prazer de tocar com ele, o um prazer de ser amigo dele, e ele toca também um violão que tem outro som, que é a viola de 12 cordas. Também tem o lance da sonoridade da viola, das ideias, de trazer o Luiz Gonzaga para um instrumento que hoje em dia, que eu sinto que está um pouco esquecida essa coisa de viola. A gente tem feito um resgate, eu com as violas caipira, com a viola dinâmica, com a própria viola de 12 cordas, tenho feito muitos shows, muitas produções sempre colocando esses instrumentos. São de uma timbragem, de uma textura lindíssima.
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