Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
O golpe de 1964, que completa 60 anos neste domingo, valeu-se de estratagemas tcom objetivo de dar aparência de legalidade e institucionalidade
Foto: Reprodução/Agência Brasil
PRESIDENTE do Senado, Auro de Moura Andrade lê a vacância do cargo em 2/4, com Jango ainda em território nacional
Golpes precisam de fingimento para acontecerem. Isso vale desde os desfalques financeiros até os golpes de Estado. A defesa dos golpistas de 2022 busca afirmar que não estava sendo feito nada de ilegal, apenas eram usados instrumentos constitucionais. Querem fazer crer que golpe é apenas tanque de guerra na rua. A minuta encontrada com alguns dos envolvidos era justamente uma tentativa de dar verniz legal ao movimento que violentaria a ordem democrática.
O golpe de 1964, que completa 60 anos neste fim de semana, valeu-se de estratagemas também com objetivo de dar aparência de legalidade e institucionalidade ao que foi nada mais foi que um golpe.
Oficialmente, o cargo do presidente João Goulart foi declarado vago. Foi talvez a maior vergonha da história do Poder Legislativo no País. Na madrugada de 2 de abril, o então presidente do Senado, Auro de Moura Andrade (do velho PSD), visceral adversário de Jango, declarou vago o cargo de presidente da República. A Constituição de 1946, então em vigor, previa três hipóteses para um presidente deixar o poder: renúncia, que não aconteceria, impeachment, para o qual os votos eram insuficientes, e, no artigo 85: “O Presidente e o Vice-Presidente da República não poderão ausentar-se do País sem permissão do Congresso Nacional, sob pena de perda do cargo”.
Na madrugada de 2 de abril, em sessão na calada da noite, o Congresso se reuniu às pressas. De 460 membros, estavam 178, 158 deputados e 26 senadores. O então presidente do Senado, Auro de Moura Andrade (do velho PSD), visceral adversário de Jango, afirmou que Jango havia deixado o País diante do avanço das tropas contra ele. Era mentira e isso foi comunicado. O secretário do Congresso leu carta do então ministro da Casa Civil, informando que o presidente estava no Rio Grande do Sul. Moura Andrade ignorou. A questão nem foi votada.
"O senhor presidente da República deixou a sede do governo, abandonou o governo! Assim sendo, declaro vaga a Presidência da República", gritou, sob protestos e gritos de "canalha". Retirou-se sob escolta. Ainda recebeu cusparada do deputado Rogê Ferreira.
Foi empossado como chefe do Poder Executivo o presidente da Câmara, Ranieri Mazzilli, até a eleição indireta que, em 11 de abril, confirmou o cearense Castello Branco como primeiro ditador do regime militar. Mazzilli era figura cerimonial. O poder de fato, até a posse de Castello, era exercido por uma junta militar, que assinou, em 9 de abril, o ato institucional número 1. Peça que chega a ser hilária na tentativa de se legitimar.
“(...) a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma”, diz o AI-1. Ah, bom. Se é legitimada por si mesmo, então é fácil e não há golpe, está tudo certo. “Ela (revolução) edita normas jurídicas sem que nisto seja limitada pela normatividade anterior à sua vitória”, prossegue o texto. “Os Chefes da revolução vitoriosa, graças à ação das Forças Armadas e ao apoio inequívoco da Nação, representam o Povo e em seu nome exercem o Poder Constituinte, de que o Povo é o único titular”. Só faltou perguntar ao povo se ele queria isso.
Pior que o erro é como lida com ele
O governo Elmano de Freitas (PT) consegue transformar em desgaste uma agenda positiva que lhe caiu no colo. A questão dos precatórios do Fundef, a serem pagos aos professores, foi resolvida no governo Camilo Santana (PT) e chegou de bandeja para o atual governo pagar. A terceira estava prometida para ser paga em 1º de abril. Os professores se programaram. Para muitos deles, é bastante dinheiro e houve quem tenha gastado por conta. Podem ter precisado, e confiaram no anúncio oficial. Mas, o pagamento foi adiado. Quando a notícia é boa, o governador comunica. A trapalhada foi informada em nota da Secretaria da Educação (Seduc) e da Secretaria do Planejamento e Gestão (Seplag). O pior é a falta de transparência. “Por questões técnicas”. Quais questões técnicas? Site do banco fora do ar, computador quebrado, internet caiu, o responsável viajou na Semana Santa? A informação foi vaga e irritou os professores numa notícia que seria só alegria. A data do pagamento? “O mais breve possível”. Se é no fim da semana, no outro mês, no outro ano ou na outra década não se sabe. Nem sinalização há se será folha suplementar ou outra coisa.
A situação transforma em problema uma notícia boa. Mas o pior é como o governo lida com o problema. É essa postura que separa a percepção de um governo bom de um ruim. Lição que Elmano poderia ter aprendido com Camilo.
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