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A retórica de violência de Trump a Maduro
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

A retórica de violência de Trump a Maduro

Quando se critica uma postura do adversário, mas se defende quando o aliado faz coisa parecida, tem-se casuísmo e desonestidade intelectual
Tipo Opinião
NICOLÁS Maduro faz discurso insuspeitamente parecido com o de Trump (Foto: ZURIMAR CAMPOS / AFP)
Foto: ZURIMAR CAMPOS / AFP NICOLÁS Maduro faz discurso insuspeitamente parecido com o de Trump

O ambiente de violência política não surge do nada. É fomentado por alguns dos principais líderes. Gostem ou não os militantes, eles estão em diferentes campos políticos. Donald Trump foi vítima de um disparo no último sábado, num episódio espantoso e simbólico da política desses tempos. Condenar e repudiar o atentado não significa deixar de levar em conta o quanto ele é produto de uma atmosfera adoecida, do belicismo apregoado, do armamentismo e da linguagem violenta. Em comício no último mês de março, Trump falou: “Se eu não for eleito, será um banho de sangue para o país”. Não é metáfora, simbolismo, alegoria. Não é evidente que esse tipo de manifestação é danoso à democracia? Não é óbvio que fomenta a violência?

Nessa quinta-feira, Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, fez discurso que são soa nem inspirado em Trump, mas imitação mesmo. “Se não querem que a Venezuela caia em um banho de sangue, em uma guerra civil fratricida, produto dos fascistas, garantamos o maior êxito, a maior vitória da história eleitoral do nosso povo”.

Políticos que se veem como inimigos são capazes de exprimir idêntico pensamento de que eles são a única opção, que o eleitor não pode fazer outra escolha, sob pena de uma carnificina.

Fico intrigado com os apoiadores, capazes de defender ontem a fala de Trump e criticar hoje a de Maduro, e vice-versa. (Joe Biden, antes do atentado, havia falado que Trump deveria ser colocado “no centro do alvo”. Após o disparo de sábado, reconheceu que a fala tinha sido um erro.)

O que se chama em honestidade intelectual consiste na disposição de reconhecer estar errado quando se percebe o equívoco. Basicamente, buscar sinceramente a verdade, mesmo que contrarie as convicções pessoais. É questão de ética. Passa por ter parâmetros e princípios mínimos que orientem posicionamentos com alguma consistência. Não dá para ter duplo padrão. Quando se critica uma postura do adversário, mas se defende quando o aliado faz coisa parecida, tem-se casuísmo e desonestidade intelectual.

Paralelismos falsos e verdadeiros

Não dá para defender a fala de Maduro e criticar a de Trump, nem o contrário. Existe um recurso retórico bastante flexível, que se tornou moda nas redes sociais, que é apontar “falso paralelismo”. Consiste em desqualificar comparações entre políticos que fazem coisas semelhantes, com o argumento de que são situações diferentes.

Claro que há comparações descabidas. Porém, as situações nunca são idênticas. Quando se avalia os índices de inflação, ou de crescimento econômico, ou de desemprego entre os governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) ou Jair Bolsonaro (PL), por exemplo, há realidades muito diversas. Cenário nacional e internacional, crises etc. Tudo isso tem de ser ponderado e considerado. Mas, não impede comparações. Caso se pretenda traçar paralelos apenas entre situações absolutamente iguais, então nunca se terá parâmetros para avaliar diferentes governos, os políticos e suas políticas.

O que mais vejo é o uso de “falso paralelismo” para refutar comparações inconvenientes para o político a quem se apoia. A diferença muitas vezes não é de conjuntura. O que muda de uma situação para outra costuma ser o político envolvido. Isso pode fazer toda diferença.

O que importa mesmo em paralelismo não é se as situações são diferentes, pois nada é idêntico. Importa ir a fundo para observar se as mudanças entre os contextos em questão justificam as semelhanças ou diferenças de posturas. Não me parece haver conjuntura que legitime os discursos violentos de Biden, Trump ou Maduro.

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