Onde estão os conservadores nos costumes e liberais na economia?
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista
Onde estão os conservadores nos costumes e liberais na economia?
As ideias de livre mercado e livre concorrência, circulação de pessoas e produtos, o princípio de que a competição faz as indústrias internas se aperfeiçoarem, isso nunca foi abraçado de verdade pelas maiores nações do planeta
Foto: Rebecca Noble /AFP
DONALD Trump recorre ao protecionismo
Liberal na economia e conservador nos costumes foi a auto definição que se tornou usual no Brasil dos tempos de Jair Bolsonaro (PL). O ex-presidente nunca foi liberal. Projetou-se como defensor corporativo dos militares e como defensor da pena de morte (procure saber da trajetória parlamentar de Bolsonaro na década de 1990.) Diferentemente do que ocorre com quase todos que detêm poder político, Bolsonaro nunca se importou nem entendeu de economia. Por isso, não fez questão de esconder que entregaria a condução ao “Posto Ipiranga” Paulo Guedes — este sim um liberal. O bolsonarismo recebeu a adesão, menos ou mais envergonhada, do grosso dos liberais brasileiros — um segmento eleitoralmente mais barulhento que numeroso. Além disso, na direção inversa, bolsonaristas passaram a se dizer liberais, ainda que superficialmente.
O bolsonarismo nasce do trumpismo e, neste retorno do presidente dos Estados Unidos, está mais agarrado às pessoas e ideias que subjugam a Casa Branca. Porém, Trump nunca agiu como liberal, desde o primeiro mandato e muito menos agora. Aliás, até tem ingredientes quando olha para o mercado interno. Para dentro apega-se e até radicaliza o clássico ideário liberal republicano, ao pregar redução de impostos, corte de gastos públicos e desregulamentação da economia. Mas, o livre mercado só vale para dentro. Para fora, adota taxações, nas receitas mais convencionais do protecionismo do século XX. E, bem, para o Brasil é essa parte que importa.
As ideias de livre mercado e livre concorrência, circulação de pessoas e produtos, o princípio de que a competição faz as indústrias internas se aperfeiçoarem, isso nunca foi abraçado de verdade pelas maiores nações do planeta. Os Estados Unidos sempre adotou barreiras protecionistas, a União Europeia nem se fala. É curioso revisitar o noticiário dos primeiros meses do Plano Real, já com Ciro Gomes ministro da Fazenda e travando debates com a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) — gente de capa muito liberal — mas que estava furiosa com aquela globalização que estimulava a concorrência externa como uma das formas de conter a inflação interna. Quem viveu aquela fase lembrará da inundação das lojas de R$ 1,99.
O fato é que Trump está defendendo o País dele e nisso não está errado. Está errado em quase tudo o mais, mas não nisso. A questão para eles é saber se os efeitos colaterais internos — notadamente a inflação — valerão à pena para proteger a indústria. Essa é a questão para eles.
Para o Brasil, a taxação do aço e do alumínio é um problema. E errados são os trumpistas-bolsonaristas que se enfurecem com a “taxa das blusinhas”, reclamam do “Taxad” — alusão ao ministro Fernando Haddad — mas aplaudem ou silenciam quando Trump faz a mesma coisa, em escala muito maior, e contra o Brasil. Outro dia, no podcast Jogo Político, um comentário espirituosamente os chamou de “patriotas da pátria alheia”. É, na verdade, um atrelamento ideológico além de qualquer fronteira ou coerência.
Outro assunto
O campo conservador/(ex?)liberal brasileiro costuma desenvolver versões e teses para justificar qualquer coisa, inclusive o 8 de janeiro. Sobre a taxação de Trump e os impactos para o Brasil, o assunto tem sido evitado. Mesmo entre forças que efetivamente colocam o liberalismo como bandeira principal, caso do Novo — no Ceará, representado pelo senador Eduardo Girão.
O assunto praticamente único nas redes conservadoras é a anistia para os presos e condenados pelo 8 de janeiro. Em muitos perfis da direita nas redes sociais, é como se a taxação de Trump, que atinge o Brasil, não existisse. Experimentassem Lula e Haddad fazer o mesmo em relação a empresas dos Estados Unidos e veríamos as indignações ancestrais irromperem.
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