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A nem tão sutil diferença entre Rubens Paiva e os presos do 8/1
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Escreve sobre política, seus bastidores e desdobramentos na vida do cidadão comum. Já foi repórter de Política, editor-adjunto da área, editor-executivo de Cotidiano, editor-executivo do O POVO Online e coordenador de conteúdo digital. Atualmente é editor-chefe de Política e colunista

Érico Firmo política

A nem tão sutil diferença entre Rubens Paiva e os presos do 8/1

Qualquer pretensão de comparação entre os assassinatos e desaparecimentos promovidos pelo Estado brasileiro na ditadura e a situação dos condenados judicialmente por ataques golpistas é desinformada ou desonesta, até canalha mesmo. Ou tudo isso e mais
Tipo Opinião
HORDA que atacou três poderes em 8 de janeiro era composta de idosas e mães, diz Eduardo Bolsonaro (Foto: EVARISTO SA/AFP)
Foto: EVARISTO SA/AFP HORDA que atacou três poderes em 8 de janeiro era composta de idosas e mães, diz Eduardo Bolsonaro

A vitória de Ainda Estou Aqui no Oscar mobilizou as redes sociais no mundo, graças aos brasileiros. Porém, no recorte entre os conservadores, o engajamento, no jargão do meio, foi pouco. Bem dizer um flop — ainda na terminologia das redes. Os patriotas não se animaram muito com o primeiro Oscar a um filme que representou o Brasil na premiação mais badalada da indústria do cinema.

O filme tem teor fortemente político e expõe internacionalmente a situação da ditadura militar brasileira. Entre os políticos de direita que não evitaram o tema, a abordagem preferida foi traçar paralelo com os presos e condenados pelos ataques ao 8 de janeiro de 2023 contra os três poderes. Filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) foi além ao atacar o filme em si e, principalmente, o realizador, Walter Salles. Referiu-se ao ganhador do Oscar de Filme Internacional como “psicopata cínico”.

“Acredito que o sujeito que bate palmas para prisão de mães de família, idosos e trabalhadores inocentes, enquanto faz filme de uma ditadura inexistente e reclama do governo americano, que lhe dá todos os direitos e garantias para que suas reclamações públicas e mentirosas sejam respeitadas pelo sagrado direito da liberdade de expressão, define, em essência, o conceito do psicopata cínico”, publicou no Xuíter.

Sempre me intriga a lembrança de que o discurso que se tentou emplacar no começo era de que o 8 de janeiro foi coisa de infiltrados da esquerda. O próprio Eduardo Bolsonaro disse isso na CPI que investigou o caso. Não sei se cochilei no filme e perdi a cena em que os “infiltrados” viraram pobres idosos e mães de família, as pessoas mais injustiçadas do mundo. (Reveja as imagens da destruição de 8 de janeiro, observe as pobres senhoras em ação.)

O que foi feito com Rubens Paiva

Há algumas diferenças notáveis entre Rubens Paiva e os condenados pelo 8 de janeiro. Rubens Paiva teve o mandato de deputado federal cassado, foi sequestrado por agentes do Estado brasileiro, a serviço da ditadura militar. O corpo nunca foi encontrado.

Em 2014, o coronel reformado do Exército, Paulo Malhães, admitiu à Comissão da Verdade ter sido o responsável pelo desaparecimento do cadáver do ex-deputado. Ele narrou que o corpo foi sepultado, depois desenterrado e atirado em um rio de Itaipava, na região serrana do Rio de Janeiro, ou no mar — o relato variou em alguns momentos. O coronel disse na época que não se arrependia: “Eu acho que eu cumpri o meu dever”.

Um mês após o depoimento, Malhães foi encontrado morto. No primeiro momento, a Polícia relatou marcas de asfixia. Legista, porém, falou em infarto.

O que é feito com os condenados pelo 8 de janeiro

A localização de todos os presos do 8 de janeiro é conhecida. Foram denunciados, julgados, têm advogados. Receberam condenações na forma da lei. Ainda que seja passível de discussão, como em qualquer processo. Reclamam das condições em que estão — e têm razão para tal. Assim como a totalidade dos presos no Brasil, a maioria dos quais é desprezada pelos que defendem os condenados do 8 de janeiro.

A cada três presos, dois receberam oferta de acordo de não persecução penal. Pela proposta, eles não seriam presos, desde que cumprissem três condições: fazer curso sobre democracia no Ministério Público, não usar redes sociais por dois anos e, aqueles em condições, pagar multa de R$ 5 mil. Mais da metade dos coitadinhos recusou ou nem respondeu à proposta.

Qualquer pretensão de comparação entre os assassinatos e desaparecimentos promovidos pelo Estado brasileiro na ditadura e a situação dos condenados judicialmente por ataques golpistas é desinformada ou desonesta, até canalha mesmo. Ou tudo isso e mais.

Foto do Érico Firmo

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