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A cruzada de Elon Musk contra o Brasil
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Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros

A cruzada de Elon Musk contra o Brasil

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Tipo Notícia

O bilionário Elon Musk é um inescrupuloso showman do capitalismo de plataforma, excitado com a capacidade que adquiriu de causar e, com isso, apresenta-se como uma espécie de paladino do reino dos concentradores da riqueza e da renda mundial. Mostra-se astucioso o suficiente para seduzir legiões de seguidores que se imaginam seus pares, quando não passam de incoerentes úteis no aprofundamento das desigualdades sociais.

Musk está se aproveitando do momento em que o Brasil procura se achar, depois de passar por uma desordem ultraconservadora, para travar no país uma cruzada tecnológica e dogmática de padrões medievais. Como cavaleiro pouco honrado dessa empreitada por um entreposto comercial e ideológico, ele partiu para cima do Judiciário e do Executivo, livrando apenas o Legislativo, onde tem aliados do mesmo naipe.

A desproporção dessa investida está sendo possível porque o Brasil tem insuficiência de sociedade civil. A aglutinação de forças distintas que deu início à redemocratização (1979) tendia à construção de uma sociedade civil, com o engajamento de parte expressiva da classe média e com movimentos sociais ativos. Com a troca no poder da República (2003), o governo precisou de quadros e foi exagerado na arregimentação de ativistas sociais, deixando um vazio que passou a ser ocupado por pastores oportunistas e narco-milicianos.

As improbidades cometidas e assumidas em delações premiadas por aloprados durante os mandatos seguidos da esquerda no poder afastaram muitas pessoas que, por desilusão, deixaram de lado os movimentos políticos ou passaram a apoiar partidos menores como forma de preservação de consciência crítica, ficando esse outro vazio preenchido por ganhadores de dinheiro pouco interessados em justiça social.

Some-se a isso o lapso de ruptura democrática do golpe jurídico-parlamentar (2016) e a intensificação da vulgata do empreendedorismo de bico difundida pelo capitalismo inclusivo; fatos que influíram para a escalada de uma massa, mista de endinheirados e lisos, movida pela avidez da prosperidade imediata. Avidez é o substantivo da pregação desse alto patrono da antipolítica e da aceitação massiva de avanços de um sistema dogmático combinado entre negócios fora-da-lei e o mercado da falsa fé.

Assim, a figura insolente de Musk pôde colocar a sua empresa de fofocas e fake news a serviço da desestabilização de poderes constitucionais brasileiros, com a contribuição de gente do próprio país que fortalece o X (ex-Twitter) como uma espécie de bomba de fragmentação de reputações, capaz de lançar ao vento digital submunições de ódio e mentira, atingindo indiscriminadamente a população, violando a capacidade civil, as regras civilizatórias e o direito internacional.

Não é fácil para o Estado lidar com isso enquanto o governo corre atrás de unir e reconstruir o país em meio aos escombros resultantes dos descasos patrocinados pelo desgoverno anterior; destroços esses que se estendem desde o sucateamento das estruturas de educação até o encorajamento armamentista e golpista da população, o desmonte de organismos de atenção a grupos vulneráveis, a contaminação ideológica das Forças Armadas e da Polícia Federal e a antidiplomacia que fez o país passar vergonha nas relações internacionais.

Urge que se trabalhem os campos psicológicos e culturais da gente brasileira, a fim de que cidadãs e cidadãos teçam uma sociedade civil com condições de deter ameaças como a cruzada de Elon Musk contra o país. Quem atua na política partidária e acredita na democracia também precisa rever conceitos, se abrir à cidadania e colaborar para que o Brasil saia dessa situação em que as culturas de massa e de nicho se encontram paradoxalmente em diferentes perspectivas, no entanto com semelhante ideia aviltada de liberdade.

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