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O movimento dos grandes animais na África
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Flávio Paiva é jornalista e escritor, autor de livros nas áreas de cultura, cidadania, mobilização social, memória a infância. Escreveu os livros

O movimento dos grandes animais na África

Estar diante dos maiores animais terrestres em seu habitat natural transpareceu para mim algo como a revelação de um movimento fundamental ao debate ambiental e climático
Tipo Crônica
Guarda florestal com um filhote de rinoceronte negro (Foto: MARTIN BUZORA/WPY)
Foto: MARTIN BUZORA/WPY Guarda florestal com um filhote de rinoceronte negro

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É impressionante como em um tempo que parece resumido ao imediato, ao pequeno e à pressa, os grandes animais da Terra ainda mostrem que a natureza tem na existência paciente, na imensidão e na vida lenta relevantes pontos de conexões com os destinos do mundo. Refleti sobre isso na primeira quinzena deste mês, quando pude observar de perto, e em territórios variados, o viver natural de herbívoros grandiosos, felinos majestosos e outros viventes das savanas preservadas e protegidas do Quênia e da Tanzânia.

Longe de circos e zoológicos, todos estavam ali na liberdade da vida e da morte: elefantes, hipopótamos, rinocerontes, búfalos, zebras, girafas, leões, leopardos (estes não deu para ver), guepardos, javalis, hienas, chacais, gazelas, impalas, dik-diks, topis, gnus, elands, babuínos, flamingos, pelicanos, cegonhas, secretários, grous coroados, águias, patos, kwenzis, répteis, anfíbios e peixes, entre acácias, baobás e outros habitantes desses parques e reservas.

Estar diante dos maiores animais terrestres em seu habitat natural transpareceu para mim algo como a revelação de um movimento fundamental ao debate ambiental e climático. Foi como se eu tivesse testemunhado a fé que os animais têm na natureza e o respeito que dá a si mesmo o povo africano que mantém essas grandes áreas como fontes de expectativas de reversão da realidade indesejável a que está submetida o planeta.

Cada qual com a sua plasticidade, as terras altas do Ngorongoro e as planícies do Serengeti chamaram a minha atenção de forma especial. A primeira, pela densa floresta tropical que se atravessa rumo ao topo da montanha de 2.440m de altitude, e pela paisagem que se descortina com a cratera de 304 quilômetros quadrados e 600 metros de profundidade. A segunda, pela imensidão de um ecossistema de 45 mil quilômetros quadrados, dos quais dois terços estão na Tanzânia e um terço no Quênia.

A cratera do Ngorongoro resulta do que os geólogos chamam de 'caldeira', ou seja, um afundamento que se dá após erupções ou afastamento de placas tectônicas. Mais de cinquenta espécies de animais convivem nesse espaço ovalado, com cerca de 21 quilômetros de leste a oeste, e de 18 quilômetros de norte a sul. No centro da cratera, o lago Magadi assegura as condições de nutrição da flora e da fauna que preenche o seu interior. E cada ser, cada grupo e cada espécie segue o seu ritmo no equilíbrio da cadeia alimentar.

Na altitude entre 1.600 e 1.800 metros do Serengeti é onde se dá a surpreendente migração cíclica dos grandes animais por planícies que ultrapassam horizontes de pastos e sombras, poeiras e alagados. A rota é definida pelo regime de chuvas e disponibilidade de alimentos. Neste mês de junho eles estão rumando da Tanzânia, onde a pastagem começa a secar, para o Quênia que, no momento, parou de chover, mas que estará com verde farto por volta de outubro, quando esse ciclo será concluído.

Quando manadas de milhares de gnus e zebras passavam ao lado do Land Cruiser Toyota em que estava, eu sentia uma vibração energizante e vital. Elefantes marchando em fila e grupos de hipopótamos relaxando nos rios projetavam em mim a calma que existe nas forças reais. Filhotes de leões desfilando em locas de pedras com suas mães e guepardos deslocando-se com suas crias no descampado da savana também sinalizavam que o destino desses animais é uma aposta no destino do planeta.

O constante movimento dos grandes animais da África em reservas preservadas é um tesouro que o continente berço da humanidade oferece à permanência do mundo. Nas savanas abertas a grande migração ficam para trás os caminhantes que não resistem à trajetória, enquanto um número semelhante nasce durante o percurso. Inquietante!

Foto do Flávio Paiva

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