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Mais duas condenações da Corte de Direitos Humanos
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Advogado, pós-graduado em Processo Penal e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É professor do Centro Universitário Estácio/Ceará e da Universidade Sete de Setembro (Uni7). Fundador do escritório Hélio Leitão e Pragmácio Advogados

Mais duas condenações da Corte de Direitos Humanos

A ninguém é dado desconhecer a crise na segurança pública. O aumento crescente do número de mortes violentas intencionais, em especial o feminicídio, e o avanço da criminalidade organizada representam um repto à democracia brasileira
Tipo Opinião

Em um momento em que os índices de violência e letalidade decorrentes de intervenção policial crescem assustadoramente no país, o estado brasileiro acaba de sofrer mais duas condenações pelo sistema interamericano de proteção dos direitos humanos.

As condenações proferidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no último mês de março guardam pontos em comum. Ambas dizem respeito à violência policial, ao uso abusivo e ilegal da força por profissionais da segurança pública.

No "Caso Antônio Tavares Pereira" houve a responsabilização internacional do Brasil pelo assassínio do militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) que dá nome ao caso e lesões em outros tantos, quando participavam de uma manifestação pública pela reforma agrária, isto no dia dois de maio de 2000, em Campo Largo, estado do Paraná. Já o chamado "Caso Castelinho" deu-se cerca de dois anos antes, quando a polícia militar paulista trucidou 14 pessoas em uma emboscada armada na Rodovia Senador José Ermírio de Moraes (SP-75). Os trabalhos de perícia concluíram à época que pelo menos 700 disparos foram desfechados pelo dispositivo policial. As vítimas não teriam esboçado qualquer reação.

Não demanda muito esforço concluir que a violência policial no Brasil segue endêmica. Segundo dados do Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as polícias brasileiras foram responsáveis pela morte de nada menos que 6.430 pessoas no ano de 2022. Já a polícia paulista matou à razão de duas pessoas por dia no primeiro trimestre de 2024, número 138 por cento maior do que em 2023. Num caso como no outro, os mortos de sempre - negros e jovens periféricos. Confrontado com estes números e denúncias recorrentes de tortura e execuções sumárias perpetradas pela polícia do estado que governa, o militar da reserva Tarcísio de Freitas, assegurou, em seu português um tanto pobre e com aquela sua cara de bebê chorão e um tanto cínica, que os incomodados poderiam "…ir na ONU, na liga da justiça, que não tô nem aí…"

A ninguém é dado desconhecer a crise na segurança pública por que passa o país. O aumento crescente do número de mortes violentas intencionais, em especial o feminicídio, e o avanço da criminalidade organizada que a cada dia mais ganha estrutura e capilaridade, representam um imenso repto à democracia brasileira. Não construiremos, todavia, uma sociedade mais justa, segura e fraterna transformando as forças de segurança em grupos de extermínio.

A criminalidade é um problema estrutural, multicausal, de que as polícias são apenas uma parte, parte importante, na busca da solução. Jogar para a plateia como fazem muitos homens públicos, estimulando e aquiescendo com ações policiais violentas, é um desserviço ao processo civilizatório. Passados mais de vinte anos, os episódios tratados nas recentes decisões do Tribunal de San José da Costa Rica fazem lembrar a atualidade do dito do jornalista e escritor carioca Millôr Fernandes, frasista inexcedível e espirituoso - o Brasil tem um longo passado pela frente.

 

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