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O STF e a favela
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Advogado, pós-graduado em Processo Penal e mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (Unifor). É professor do Centro Universitário Estácio/Ceará e da Universidade Sete de Setembro (Uni7). Fundador do escritório Hélio Leitão e Pragmácio Advogados

O STF e a favela

Em seu voto o ministro relator não proíbe a realização de operações policiais, mas apenas indica a necessidade de fixar parâmetros mínimos de planejamento e transparência, o que deveria sempre orientar iniciativas do poder público
Rio de Janeiro - Operação policial após ataques às bases das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) nas comunidades do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, em Copacabana. (Fernando Frazão/Agência Brasil) (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil Rio de Janeiro - Operação policial após ataques às bases das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) nas comunidades do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, em Copacabana. (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Incursões policiais violentas em comunidades do Rio de Janeiro, em que a regra é a violação de direitos, muitas das quais resultando em verdadeiros morticínios - sem que haja a devida apuração de responsabilidades, não são propriamente uma novidade. A prática já ensejou a condenação do estado brasileiro pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em sentença publicada em 16 de fevereiro de 2017- o caso Favela Nova Brasília.

Vale a pena recordar os fatos sobre que se debruçou o chamado Tribunal de San José. Um deles, que remonta a outubro 1994, cerca de 80 policiais invadiram casas e mataram treze pessoas, entre as quais quatro crianças. No ano seguinte, em nova incursão policial na mesma Favela Nova Brasília, outras treze pessoas perderam a vida. Em ambos os casos as ocorrências foram anotadas como "resistência seguida de morte". As apurações acabaram sendo um tiro, desta vez na água - a pretensão punitiva foi alcançada pela prescrição, razão da intervenção do sistema interamericano de direitos humanos.

O tema volta à agenda pública por força do julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 365, proposta pelo Partido Socialista Brasileiro, relator o ministro Edson Fachin, que apresentou o seu voto no último dia 5. Nele apontou a existência de um "estado de coisas inconstitucional na segurança pública fluminense", invocando formulação jurídica elaborada pela Corte Constitucional da Colômbia e por primeira vez adotada pelo nosso Supremo Tribunal Federal quando deliberava sobre a situação do sistema carcerário brasileiro.

Como sempre acontece, a arena em que se trava o debate sobre as questões da segurança pública acaba sendo tomada pela baixa política, que encontra momento propício para a verbalização de frases de efeito e jogos de cena que falam irresponsavelmente ao desejo de uma população que anseia por segurança e paz para tocar a vida. O prefeito Eduardo Paes, animando a sua plateia, posicionou-se contra a ADPF 365, dizendo-se preocupado com que o Rio de Janeiro se tornasse um "resort para delinquentes".

Entendamos o debate posto. Em seu voto o ministro relator não proíbe a realização de operações policiais, mas apenas indica a necessidade da fixação de parâmetros mínimos de planejamento e transparência, o que de resto deveria sempre orientar as iniciativas do poder público. Nele propõe medidas que garantam a efetividade de investigações que apurem circunstâncias e responsabilidades por quaisquer mortes ocorridas em ações policiais; o uso de câmeras corporais e o afastamento temporário das ruas de policiais envolvidos em mais de uma ocorrência com resultado morte no período de um ano.

Não se desconhece a situação de deterioração da segurança pública em nosso país. Tampouco se tem a ingenuidade de acreditar que o combate ao crime prescindiria do uso da força. O caso aqui é de estabelecerem-se padrões mínimos de racionalidade e civilidade nas ações policiais. Ou assim fazemos ou estará instalada a barbárie sob o patrocínio estatal. Com as vítimas de sempre. Os pobres.

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