Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
O caldo parece ter entornado de vez entre o prefeito José Sarto (PDT) e o governador Elmano de Freitas (PT), mas é apenas o começo. Tende a piorar. Se a contenda serve de algo a esta altura da corrida pelo voto, é para explicitar as armas eleitorais de cada um.
O chefe do Paço, como já ficou claro, tem um alvo: a segurança pública, teto de vidro das gestões Cid Gomes, Camilo Santana, Izolda Cela e agora de Elmano, a quem Sarto (à exceção do último) sucessivamente emprestou o seu entusiasmado apoio. Eram outros tempos.
Agora, a reorganização do baralho político no Ceará desde 2022 impôs ao pedetista um reposicionamento no tabuleiro (uma espécie de "rebranding"), e o que era virtude rapidamente se converteu em pecado. Daí os termos mais incisivos disparados lá e cá. Provocado, Elmano tem se movido pela tangente, adotando discurso semelhante ao de Camilo quando se desvencilhava da artilharia de Ciro e Roberto Cláudio na última campanha.
O governador tenta evitar o confronto direto com o prefeito a fim de esvaziar as críticas, deixando-as ricochetearem sem réplica e à espera de que caiam no vazio. É um risco. Como também é temerário aceitar que o tópico da segurança se torne de fato a principal agenda na briga pela Prefeitura de Fortaleza em 2024. Se isso acontecer, e a estratégia de Sarto prosperar, a vida de Evandro Leitão como candidato pode ficar mais difícil.
Secretário municiou a oposição
É a par de tudo isso que as declarações do titular da SSPDS, Samuel Elânio, têm de ser tomadas. Em coletiva, o secretário de Elmano foi terrivelmente sincero: admitiu um "aumento (de criminalidade) considerando reduções em cima de reduções", mas ponderou: "Comparado com todo o período, um período bem maior do que esse, nós ainda estamos com um número razoável. Mas sabemos que devemos melhorar e vamos melhorar".
Noves fora o contexto de enunciação da frase e a sua escolha vocabular relativizada logo em seguida, como se tivesse detectado o erro e tentado corrigi-lo de imediato, Elânio atravessou a rua para escorregar numa casca de banana plantada por ele mesmo.
Cheiro de "sangue"
Pelas redes sociais, Sarto foi o primeiro a se manifestar, como tem sido frequente há umas duas semanas, quando passou a exibir novo repertório, incorporando figurino mais beligerante. Sapecou: "Leviano é esse governo do PT, que deixou as facções criminosas tomarem conta de Fortaleza e do Ceará. Assim como as declarações infelizes desse secretário, que dizem que os índices de criminalidade são razoáveis. Razoáveis para quem?".
Numa queda de braço mais renhida como a deste ano, é natural que os competidores explorem a guarda baixa de seus adversários e maximizem os erros dos concorrentes. Foi o que se viu ontem no Paço, com uma valiosa colaboração do próprio Abolição - e num setor bastante sensível para o governo do petista.
Tropa de choque
Mas a base de Elmano não ficou de braços cruzados. À coluna, Guilherme Sampaio, deputado estadual e coordenador-executivo do programa de governo de Evandro, afiançou que "Samuel tem trabalhado diuturnamente com sua equipe para combater o crime, inclusive com ideias inovadoras como o programa 'Meu Celular', que essa semana já devolveu quase 500 aparelhos roubados aos seus donos, além da ampliação radical do investimento em inteligência".
Presidente estadual do PT, Antônio Conin Filho foi na mesma toada. Questionado se a sentença do chefe da SSPDS fora mal escolhida, respondeu: "Uma palavra ou outra não tira o mérito do trabalho que ele vem fazendo. É um delegado, um estudioso, que vem dando continuidade ao trabalho dos governos Cid e Camilo".
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