Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
A tentação de traçar paralelos entre a vitória de Donald Trump nos EUA e o cenário político no Brasil é muito grande para não cair nela. Ressalvando-se distinções de modelo e perfil, convém entender lá e cá certo esgotamento de um discurso articulado a partir de bandeiras mais ou menos definidas como "identitárias" - o que também é um procedimento ardiloso de depreciação de um conjunto de pautas urgentes.
A isso se somou o uso por Kamala Harris de uma retórica segundo a qual Trump representa o extremismo (também acho que represente), mas cujos efeitos se mostraram inconvincentes. Entre uma figura em torno de quem recaem investigações sérias e a atual vice de Joe Biden, fatia majoritária dos estadunidenses resolveu apostar no magnata.
Por quê? É essa a pergunta que o setor progressista deve se fazer a fim de compreender as razões pelas quais mesmo segmentos antes simpáticos aos democratas passou ao lado "trumpista". Ou seja, por que trocaram candidata mais bem equipada para administrar impasses contemporâneos por um ex-presidente inepto e em cujo governo foi levada a cabo uma tentativa de embaraçar o processo eleitoral.
O populismo avança
A vitória de Trump também explicitou uma incômoda desconexão entre largos setores do establishment ilustrado (campos intelectual e artístico, jornalistas e outros atores cuja voz tem peso no debate) e estratos da população para os quais essa "casta escolada" não tem nada a oferecer. Disso não se entenda que o retorno do "trumpismo" à Casa Branca se dê na esteira de um receituário engajado na melhora das condições de vida.
Trump foi apenas mais bem-sucedido ao explorar o descontentamento real de faixas do eleitorado. Afinal, ninguém se alimenta de PIB, tampouco de números que não reflitam prosperidade. Daí que haja descompassos entre a imagem que um governante projeta de si e a que efetivamente se constrói no dia a dia.
Um exemplo caseiro
Querem uma mostra dos limites de um tipo de discurso moralmente bem-intencionado, mas lastreado em categorias vazias, como "bem" e "mal"? Olhem para a disputa em Fortaleza.
Nela, um deputado federal bolsonarista, que jamais havia se notabilizado por nenhum ímpeto propositivo, mobilizou amplo contingente de eleitores com acenos para agentes de um "novo mundo do trabalho" (motoristas de aplicativo, empreendedores etc.). Do outro lado, havia a plataforma do progressismo com um repertório cujo principal trunfo foi referir-se ao adversário como extremista.
Pode-se dizer que a estratégia deu certo - por uma diferença de 0,76 ponto, ao menos -, mas os sintomas de defasagem entre essa agenda e uma parcela dos fortalezenses estão escancarados.
Uma nota local
A disputa pelo comando da Assembleia Legislativa e da Câmara Municipal transcorre sem sobressaltos visíveis, mas começa a esquentar nos bastidores. Diz-se, por exemplo, que o ministro da Educação Camilo Santana estaria dedicado a emplacar Fernando Santana (PT), vice-presidente da Alece e candidato derrotado em Juazeiro do Norte.
Correndo por fora, há o também deputado estadual Sérgio Aguiar (PDT), sempre frequente nessas listas de presidenciáveis, e Zezinho Albuquerque (PP), que se revelou interessado no cargo. Licenciado do mandato parlamentar, Salmito Filho (PDT) é nome cogitado, mas esbarra em vetos de algumas forças governistas.
Já Guilherme Landim (PDT) tem contra si o fato de concorrer com Fernando na região do Cariri. Na Câmara, por seu turno, a fatura tenderia a se concentrar entre os vereadores Leo Couto (PSB), Ronaldo Martins (Republicanos) e Eudes Bringel (PSD).
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