Henrique Araújo é jornalista e doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC). Cronista do O POVO, escreve às quartas-feiras no jornal. Foi editor-chefe de Cultura, editor-adjunto de Cidades, editor-adjunto de Política e repórter especial. Mantém uma coluna sobre bastidores da política publicada às segundas, quintas e sextas-feiras.
Pela primeira vez desde muito tempo, o diretório municipal tende a passar às mãos do setor mais afinado com o governismo, o que eliminaria dificuldades para chancelar concorrentes ou definir apoios
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Camilo começa a atuar mais diretamente na vida partidária local
O PT está perto de passar por um teste de fogo no Ceará, com as eleições diretas previstas para julho e nas quais devem se confrontar campos divergentes: o de "esquerda", capitaneado por Luizianne Lins, o "democrático", liderado por José Guimarães, e o "popular", ligado a um conjunto de nomes, entre parlamentares e outras figuras cujo denominador comum são seus laços com o governador Elmano de Freitas, o prefeito Evandro Leitão e o ministro Camilo Santana. Noves fora as negativas tanto do Abolição quanto do Paço, trata-se de uma ala que opera duplamente, primeiro como contraponto ao bloco de Luizianne, segundo como contrapeso ao de Guimarães. A esse respeito, não custa lembrar que, embora já detentor de capital considerável, o então governador e hoje ministro da Educação nunca granjeou influência superlativa nas disputas internas do PT. Exemplo disso são as derrotas de suas teses de composição com Roberto Cláudio em 2016 e com José Sarto em 2020 - em ambas, o obstáculo foi a bandeira postulada por LL, ou seja, a de candidatura própria, que lhe coube representar nesses dois pleitos, sem qualquer adesão de Camilo. O cenário agora, porém, é outro. Pela primeira vez desde muito tempo, o diretório municipal tende a passar às mãos do setor mais afinado com o governismo, o que eliminaria dificuldades para chancelar concorrentes ou definir apoios. Daí o interesse que o "campo popular" alimenta como novidade na dinâmica da legenda, mas também como instância por meio da qual Camilo começa a atuar mais diretamente na vida partidária local.
"Acordo" de cavalheiros
É o caso da tentativa de acerto entre o bloco "popular" e o de Guimarães, sobre a qual já falei em outras ocasiões. O raciocínio é simples: o líder do governo Lula é ainda a maior liderança do partido no interior, condição que o torna indispensável em qualquer tratativa que se queira fazer para as eleições de direção. Excluí-lo não é opção - tampouco vencê-lo no voto. Logo, convém pactuar uma solução, que muitos têm chamado de "unidade", isto é, uma mediação considerando-se interesses comuns: o de Guimarães é continuar influente no âmbito estadual (e quem sabe postular o Senado), enquanto o segmento que orbita Elmano/Evandro/Camilo pretende assegurar domínio da executiva na capital cearense, de maneira a evitar que o "campo de esquerda" recupere força, chegando com chances de jogo em 2026 - ano de montagem de chapa, com vagas de governador e de senadora (Luizianne, por sinal, é pré-candidata a uma vaga).
PT lançou, no último sábado, o Campo Popular, novo bloco interno do partido
Crédito: Marcelo Bloc/O POVO
Um novo PT?
Por razões óbvias, não se admite publicamente qualquer conflito de interesses ou uma escalada de animosidades entre Luizianne e Camilo (ou entre LL e Guimarães), rusga que paira como música de fundo nesses processos do PT há quase uma década, quando a ex-prefeita se lançou ao Palácio do Bispo tendo Elmano como vice. O fato é que o PT se reorganiza como resultado de uma configuração que reflete uma mudança significativa na balança de pesos intrapartidária. Nela, a máquina da agremiação passa a desempenhar papel de esteio político das administrações, tanto estadual quanto municipal.
Um novo Camilo?
O rito da corrida petista assinala ainda uma faceta pouco explorada de Camilo, que não descura mais das articulações dentro do partido, empenhando-se pessoalmente - mesmo que por "procuração", digamos - na eleição de figuras próximas para o comando no Ceará. É uma medida profilática para contornar dificuldades como a que se viu em 2024, quando Evandro teve de travar uma queda de braço interna antes de se consagrar como candidato de fato do petismo local na briga pela Prefeitura de Fortaleza.
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