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Os desafios de Claudia Sheinbaum no México
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Editor de Política do O POVO, escreve sobre Política Internacional. Já foi repórter de Esportes, de Cidades e editor de Capa do O POVO

Os desafios de Claudia Sheinbaum no México

São muitos os atributos de Claudia Sheinbaum suficientes para fazer a vitória dela no último fim de semana um momento histórico
Tipo Notícia
CLAUDIA SHEINBAUM foi eleita com 59% dos votos (Foto: GERARDO LUNA / AFP)
Foto: GERARDO LUNA / AFP CLAUDIA SHEINBAUM foi eleita com 59% dos votos

Cientista climática, vencedora de prêmio Nobel, judia num país majoritariamente católico e defensora do reconhecimento do Estado Palestino. A partir de outubro, primeira mulher eleita presidente do México em 214 anos de história, com uma votação incontestável – a maior em 42 anos – e onde a violência de gênero uma triste constante. São muitos os atributos de Claudia Sheinbaum suficientes para fazer a vitória dela no último fim de semana um momento histórico.

O desempenho eleitoral de Claudia Sheinbaum confirmou as previsões das pesquisas. Com quase 60% dos votos, a candidata governista de centro-esquerda obteve mais que o dobro de votos da senadora Xóchitl Gálvez (30%), que liderou a coalizão de direita formada pelos tradicionais Partido Ação Nacional (PAN) e pelo Partido Revolucionário Institucional (PRI).

Claudia – como é mais conhecida no México – construiu carreira política primeiro dentro do ambiente universitário, como estudante e como professora. Em 2000, o então prefeito da Cidade do México e atual presidente, Andrés Manuel López Obrador (AMLO), queria um nome técnico para ser secretária do Meio Ambiente e a escolheu.

As duas trajetórias políticas se encontraram para nunca mais se separar. Claudia foi porta-voz das campanhas presidenciais de AMLO derrotadas em 2006 e 2012 e o ajudou a fundar em 2014 o Movimento de Regeneração Nacional (Morena). Pelo partido que hoje hegemônico na política mexicana, foi eleita prefeita da gigantesca Cidade do México (5ª maior do mundo com mais de 21 milhões de habitantes) em 2018, mesmo ano em que Obrador enfim chegou à presidência.

Há paralelos e paralelos

São inevitáveis as comparações entre a sucessão de AMLO para Sheinbaum no México para a que ocorreu em 2010 entre Lula e Dilma Rousseff no Brasil. Nos dois casos, perfis mais técnicos e menos políticos substituem nomes com alta popularidade que não poderiam se reeleger.

Cabe a importante ressalva de que todo o paralelo feito entre contextos distintos corre o risco de estar fadado ao erro. O México de hoje é diferente do Brasil da última década. Claudia já governou uma das maiores cidades do mundo antes de chegar à presidência. Nesse caso, ela estaria com perfil mais próximo ao de Fernando Haddad, ex-prefeito de São Paulo, ex-presidenciável e atual ministro da Fazenda de Lula. Em teoria, Sheinbaum estaria mais familiarizada com o “fazer política” que Dilma não soube fazer e a levou ao impeachment.

No entanto, a história serve também para educar. Dilma foi a 1ª presidente mulher do Brasil e a 6ª da América Latina. Claudia é apenas a 8ª dessa lista. E ela sabe que por questões de gênero em um país tão machista como o nosso enfrentará muito mais desafios que seus antecessores para se provar.

Diferenças de personalidade

Ao longo dos seis anos de governo de López Obrador, foi ficando cada vez mais claro que Sheinbaum seria a escolhida por ele para a sucessão. Apesar das gritantes diferenças de estilo e personalidade política. Ele, um político mais à moda antiga, falastrão e briguento com os opositores. Já ela, pragmática e com um perfil técnico e acadêmico de gestão.

Embora alinhados ideologicamente, AMLO e Claudia nunca esconderam as muitas diferenças que possuem. A mais gritante foi vista durante a pandemia de Covid-19. Enquanto o presidente abraçou o negacionismo e defendeu tratamentos sem comprovação científica (tal como o presidente brasileiro da época), a prefeita liderou esforços para implantar políticas de segurança sanitária na Cidade do México e fez questão de estar de máscara sempre que esteve em público. Inclusive em eventos ao lado de um AMLO como rosto todo à mostra.

O risco de ficar à sombra do padrinho

É inegável a importância do atual presidente na vitória de Claudia Sheinbaum. AMLO deixará o governo com mais de 60% de aprovação, uma alta popularidade que pode ser explicada por vários fatores. Primeiro pelos ganhos na economia, com melhoria da renda dos mais pobres. Após décadas de estagnação, o poder real de compra praticamente duplicou nos últimos seis anos, com o salário mínimo crescendo 120% acima da inflação.

Outro ponto é a capacidade que o atual presidente tem de usar a comunicação a seu favor. AMLO sabe como poucos aplicar o tom certo de seus discursos para a imprensa, para a população e para atacar os adversários, de modo que conseguiu criar uma narrativa quase de uma figura mítica em torno de si.

Todo político que assume um mandato no lugar de alguém que deixa o poder com grande aprovação tem como primeiro grande desafio, pelo menos, manter esses índices. Com Claudia Sheinbaum não será diferente.

Herdar um legado de popularidade como este lhe dará vantagens como governar com maioria nas duas Casas Legislativas e com uma oposição desarticulada e enfraquecida. Mas logo surgirão cobranças para que Claudia Sheinbaum não fique à sombra de López Obrador e lidere um governo com identidade própria para enfrentar os inúmeros problemas do país. Principalmente a violência dos cartéis do narcotráfico.

 

Foto do João Marcelo Sena

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