
Editor de Política do O POVO, escreve sobre Política Internacional. Já foi repórter de Esportes, de Cidades e editor de Capa do O POVO
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Desde que o Hamas colocou em prática os ataques de 7 de outubro do ano passado, duas consequências pareciam muito claras. A primeira era de que a resposta de Israel na Faixa de Gaza seria desproporcional ao que sofrera, o que de fato ainda não parou de ocorrer. E a segunda era de que cresceria a possibilidade de uma guerra regional mais ampla, envolvendo outros atores do Oriente Médio como o Hezbollah ou mesmo o Irã contra os israelenses.
Quanto a este segundo ponto, quase um ano depois, os sinais são cada vez mais fortes de que um conflito maior está perto de ocorrer. A troca de hostilidades entre Israel e Hezbollah ganhou corpo após o 7 de outubro e ficou cada vez mais intensa desde então, com dezenas de milhares de civis deslocados da área de atrito.
Embora Israel nunca vá confirmar – nem negar – que está por trás do ataque dos pagers realizado na semana passada, os últimos dias foram de avançar nos degraus de uma guerra contra o Hezbollah cada vez mais inevitável.
Não é novidade para ninguém que Benjamin Netanyahu usa a guerra como instrumento de sobrevivência política. Sustentado pelos partidos da extrema-direita religiosa israelense, ele alonga e intensifica as ações militares para se manter no poder, ciente de que se não mais o tiver, estará sob risco de prisão. Se o massacre em Gaza não surte mais tanto efeito, na lógica dele, que tenha início o conflito em outra frente.
A questão é que uma incursão no Líbano é complexa e traz muito mais consequências ao tabuleiro político do Oriente Médio. Primeiro porque Israel é o único ator, no momento, a querer de fato uma guerra mais ampla.
Principal financiador do Hezbollah, o Irã não parece desejoso por uma escalada no conflito. Mesmo atacado por Israel em abril – quando o general Mohammad Reza Zahedi, da Guarda Revolucionária, e outros seis militares foram mortos, a reposta persa foi muito tímida. Em julho, o então líder do Hamas Ismail Haniyeh foi morto em Teerã. Pelo menos até agora, também não houve retaliação pelo Irã.
Mesmo que não larguem a mão de Israel, os EUA tentam colocar um freio em Netanyahu pela via diplomática, o que surtiu efeito nulo até o momento. Outros atores regionais como Arábia Saudita e Jordânia também querem evitar ao máximo conflito de maiores proporções no Oriente Médio.
Embora a destruição de Israel seja a razão de existir do Hezbollah, suas principais lideranças seguem receosas de embarcar na onda bélica contra Israel. A percepção é de que uma guerra provocaria uma destruição maior que poderia suportar, o que retiraria apoio ao grupo dentro do Líbano. O líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, já afirmou que o grupo está pronto para um grande confronto, mas indicou mais de uma vez que não está interessado em um conflito.
O ataque do pagers não atingiu apenas o Hezbollah. Crianças e mulheres morreram indiscriminadamente por “objetos civis" usados como arma. Como isso mexe com o Líbano, mesmo os muçulmanos sunitas e cristãos que são contra o Hezbollah?
Fato é que Israel intensificou bombardeios ao Líbano após os ataques do pagers. Só nesta segunda-feira, 356 pessoas foram mortas, sendo 24 crianças. O buraco deixado na comunicação do Hezbollah após a explosão de pagers pode servir como janela pra Israel aumentar ainda mais sua ofensiva diante de um amigo vulnerável.
O Estado de Israel usa a força como forma de imposição existencial diante dos vizinhos com os quais se sente ameaçado. E isso é algo que não se limita ao governo Netanyahu, é bom que se diga. A diplomacia israelense justifica o emprego desta força, mas nunca é instrumento para evitar conflitos.
A repercussão do ataque dos pagers no ocidente focou muito mais na linha do quão engenhosa foi a empreitada – de fato o foi – e na discussão sobre o porquê do Hezbollah utilizar objetos obsoletos do ponto de vista tecnológico como pagers e walkie-talkies.
Em nenhum momento vi algo a respeito do uso de equipamentos não militares serem usados como explosivos de guerra para vitimar civis. Muito menos qualquer tipo de problematização a respeito disso.
Como forma de exercício, tente imaginar qualquer outro grupo não ocidental fazendo algo do tipo, fazendo com que as pessoas passassem a temer estar perto das outras e de objetos normais do dia a dia. Que nome daríamos a um ataque assim?
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