
Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor
Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor
A tolerância é uma virtude importante para a saúde de qualquer democracia. Inspira a capacidade de convivência com os divergentes, assegurando-lhes o direito à liberdade de expressão de suas opiniões e sentimentos. Não se pode, contudo, confundir a virtude da tolerância com a conivência com a violação da lei. Quando ilegalidades são banalizadas, a norma perde sua força e todos perdem. Essa tolerância tóxica com o não cumprimento da lei foi por muitos a regra quanto à legislação voltada à proteção das mulheres na política. Descumpria-se a lei já na confiança da anistia futura.
Parece haver uma tendência de mudança, que vale nosso registro. As instituições que compõem o sistema de justiça têm trabalhado para oferecer uma resposta mais contundente à violência política de gênero. O caso dos ataques reiterados de Ciro Gomes à Janaína Farias é paradigmático: além de ter sido denunciado pelo Ministério Público do Ceará pela prática do crime, o político sofreu, durante a semana, uma derrota importante no processo cível movido pela senadora, que busca a reparação pelos danos morais sofridos.
Relembro ao leitor que Ciro Gomes, talvez ressentido por ver a suplente assumindo uma cadeira no Senado, repetiu algumas vezes declarações vulgares sobre Farias, chamando-a de "assessora para assuntos de cama" e de "cortesã". A baixeza dos impropérios evidencia uma intenção de constranger muito clara: de acordo com a lei, configura crime de violência de gênero todo ato voltado a "assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato usando a condição de mulher como fator de menosprezo ou discriminação". O fato de que o MP tenha respondido com celeridade ante a insistência de Gomes em violar a lei é significativo, e traz alguma esperança de que essas atitudes deixem de ser repetidas e banalizadas.
Também é digno de nota o esforço que o Tribunal Superior Eleitoral tem empreendido para punir as fraudes eleitorais que se valem das candidaturas femininas laranjas. Como os partidos precisam atingir a cota de 30% de candidaturas femininas para os cargos cuja eleição se dá pelo sistema proporcional (vereadores, deputados estaduais e federais), não é raro que as legendas violem a lei apresentando candidaturas laranjas, quando não há intenção real de oferecer o nome à disputa (muitas vezes sem o conhecimento das próprias mulheres indicadas como candidatas). Esta fraude leva à outra: o percentual de recursos do fundo eleitoral que deveria financiar essas candidaturas acaba deslocado para incrementar as campanhas dos candidatos reais.
Durante a semana, o TSE editou a súmula 73, que uniformiza o entendimento já consolidado sobre os critérios para configuração de fraude nesse caso: votação zerada ou inexpressiva, prestação de contas zerada e ausência de atos efetivos de campanha. A principal consequência? A nulidade dos votos obtidos pelo partido. A súmula já deve orientar partidos e candidatos e será aplicável para as eleições de 2024.
Tais reações são importantes para reafirmar um princípio básico: todas as mulheres merecem o máximo de respeito dentro e fora da arena política. n
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