Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor
Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor
Compartilho com o leitor uma confissão: eu adoro votar, adoro o dia da eleição. A política não tem oferecido muitas razões para sorrisos ou esperanças, mas a verdade é que nós, brasileiros, sabemos fazer eleições como nenhum outro país. O primeiro turno transcorreu sem quaisquer transtornos, lindamente organizado pela Justiça Eleitoral. Tudo saiu conforme o previsto na liturgia institucional. Depois de uma pandemia e dos abismos da polarização extremada que marcaram os pleitos de 2018 e 2022, podemos afirmar: a democracia brasileira resiste bem a seus testes, por mais duros que sejam.
Apesar de meu otimismo, confesso que um ponto me abate até o fundo da alma: o número tão baixo de mulheres ocupando espaços de poder, o obstáculo representativo vivenciado por nós ciclo após ciclo. Para ilustrar minha preocupação, ofereço o recorte de Fortaleza: nenhuma mulher candidata a prefeita na cabeça de chapa e apenas 9 vereadores eleitas para uma Câmara Municipal que conta com 43 cadeiras. A presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Carmen Lúcia, em fala após a conclusão do primeiro turno, reafirmou a preocupação com o dado de que nenhuma mulher foi eleita para as capitais de estado no país.
É impressionante pensar que ainda precisamos, depois de duas décadas vividas no século XXI, justificar por que a democracia só pode ser digna do nome se experimentada com igualdade de participação entre homens e mulheres. A democracia pressupõe equilíbrio de representatividade: a exclusão política, seja de um gênero, de um grupo étnico-racial ou de um certo grupamento ideológico, é um obstáculo concreto a que tenhamos, de fato, um sistema político em que se reconhece a soberania popular realizada, quando somos nós, ao mesmo tempo, os autores e os cumpridores das leis que regem nossas vidas. Evocando Olympe de Gouges e o seu texto Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã, reconhecemos: "a constituição é nula se a maioria dos indivíduos que compõem a nação não cooperou com a sua redação".
Apesar de intuitiva, essa correlação entre democracia e igualdade ainda pede para ser bem demonstrada, porque há um número razoável de pessoas que resistem no apego a certos estereótipos de gênero. É preciso convencê-las, é preciso conversar com elas. Só poderemos sossegar na certeza de vivermos em democracia quando todos os espectros políticos à esquerda e à direita concordarem com esse princípio básico: sem igualdade de participação, não há democracia.
A democracia só pode ser considerada plena se contar com a participação das mulheres porque, substancialmente, as mulheres trazem à deliberação um acervo de experiências e um olhar sobre o mundo vivido a partir de sua condição. As mulheres fortalecem qualitativamente a deliberação com sua inteligência, sua experiência e saber acumulado, seu entendimento sobre os papeis que ela, em razão da cultura, desempenha. Por isso parece tão temerário decidir sobre questões que, historicamente, tocam a vida das mulheres sem que elas participem da decisão. Como imaginar que apenas homens decidam sobre temas como direitos reprodutivos, planejamento familiar, violência doméstica e assédio sexual?
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.