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Roberto Cláudio e a tentação do rancor
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Juliana Diniz é doutora em Direito pela USP e professora da Universidade Federal do Ceará. É editora do site bemdito.jor

Roberto Cláudio e a tentação do rancor

O valor moral de um bom político se revela no limite, quando ele tem de escolher e, em nome do bem-estar coletivo, mostra-se capaz de deixar suas paixões pessoais em segundo lugar. O PDT em Fortaleza não tem sido um bom exemplo disso

Sabíamos que não seria fácil uma composição entre o que restou do PDT e o grupo de Camilo Santana. Um apoio explícito à candidatura de Evandro Leitão era improvável depois de tanto ressentimento declarado por Ciro Gomes após as eleições de 2022. Apesar disso, não deixa de ser surpreendente o entusiasmo com que Roberto Cláudio não só declarou apoio a André Fernandes, como passou a trabalhar pela vitória do opositor.

O movimento começou com uma nota pública. Logo depois, vimos o ex-prefeito aparecer no palanque de Fernandes, saudado com vivas de ex-adversários, e culminando com sua aparição no programa destinado ao horário eleitoral. Recebeu mensagens de boas vindas de nomes fortes do bolsonarismo como Bia Kicis e foi abraçado publicamente por ninguém menos do que o também derrotado Capitão Wagner.

Érico Firmo foi de uma precisão irretocável ao analisar o (mau) passo de Roberto Cláudio. Em sua coluna, definiu o ex-prefeito como homem bomba, ressaltando que, se podemos concluir alguma coisa, é o fato de que os homens bombas são sobretudo destrutivos para si mesmos. Nada garante que o cálculo realizado, voltado à destituição da força de seus opositores personificados na figura de Camilo Santana, renderá frutos. Por hora, a única certeza é a do choque com uma decisão tão pouco estratégica.

Costumamos pensar que os políticos profissionais não fazem nada sem avaliar, pragmaticamente, todos os benefícios possíveis de seus movimentos. Que mesmo um abraço agridoce em um adversário histórico pode fazer sentido quando rende acesso ao butim. Segundo essa lógica, Roberto Cláudio teria feito um movimento racional em direção à sua sobrevivência política depois de duas derrotas importantes: a de 2022, quando terminou em terceiro lugar no primeiro turno, vendo Elmano de Freitas vitorioso com mais de 50% dos votos válidos, e a deste ano, quando viu Sarto perder a reeleição, em derrota histórica em Fortaleza. Esse raciocínio, contudo, esquece que políticos profissionais são sobretudo humanos, demasiadamente humanos, e que também podem ser vítimas do próprio rancor.

Atormentada pela perda de um poder que já foi muito grande, essa humanidade se revela em escolhas pouco sábias, inspiradas não por pragmatismo, porque só provam para o eleitor o oportunismo e a incoerência. Essas provas têm como custo a destruição de um passado e a inviabilização um futuro político. O que explica a decisão de Roberto Cláudio não é a preocupação com Fortaleza ou com seu futuro, é a força de seu rancor. Mais do que ganhar, importa evitar que Evandro Leitão e Camilo Santa ganhem, custe o que custar.

É um comportamento mesquinho, mas a humanidade não é feita só de grandes exemplos de civismo, como vimos com Tasso Jereissati ou Geraldo Alckmin, nomes de peso da direita moderada que souberam se posicionar ao lado de seus adversários históricos em um momento culminante de risco de ascensão bolsonarista. O valor moral de um bom político se revela no limite, quando ele tem de escolher e, em nome do bem-estar coletivo, mostra-se capaz de deixar suas paixões pessoais em segundo lugar. O PDT em Fortaleza, certamente, não tem sido um bom exemplo disso. n

 

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