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Juliana Diniz é doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC). É editora do site bemdito.jor
Juliana Diniz é doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC). É editora do site bemdito.jor
Quando Lula tomou posse para seu terceiro mandato como presidente, ele assumiu um compromisso com as lutas antidiscriminatórias. Como primeiro ato de governo, compôs um time de ministros para o qual foi escalado um número recorde de mulheres. O leitor lembrará de uma imagem: a subida da rampa do palácio de um presidente abraçado a personagens representativos da diversidade da população brasileira, uma imagem-símbolo entre tantos outros marcos históricos daquele tumultuado janeiro de 2023.
Uma postura combativa contra as desigualdades estruturais tornou-se quase uma obrigação para qualquer político de esquerda progressista. Faz parte da cartilha da construção de imagem mostrar-se solidário com a inclusão, afirmando-se um aliado de uma causa justa.
Entre o discurso e a práxis, contudo, há uma distância maior do que gostaríamos de admitir. Podemos enumerar muitos casos em que o discurso contra a discriminação foi utilizado estrategicamente apenas para trazer um verniz de diversidade a práticas arcaicas. A história dos dois últimos anos é representativa disso.
De janeiro de 2023 para cá, vimos a forma pouco honrosa com que pelo menos duas ministras foram descartadas para ceder lugar aos interesses de partidos de centro. Ana Moser, na pasta dos Esportes, e agora Nísia Trindade, na Saúde, foram escolhidas por seu perfil técnico, por sua biografia consistente nas áreas que iriam atuar.
Foram muito úteis para mostrar um governo bem intencionado com a mudança, mas trocadas, sem muita cerimônia, por homens quando sua presença tornou-se um peso para a negociação de apoio político a um governo enfraquecido.
O leitor poderá dizer que a política real exige pragmatismo e capacidade de mover peças em benefício de um fim maior. Eu diria que, se é certo que na vida real de Brasília temos um vale-tudo pelo poder, uma pergunta é sempre digna de ser feita: por que as mulheres são mais vulneráveis ao descarte? Por que é mais fácil derrubar uma ministra (ou uma presidente, que seja)? Essa é a questão que vale ser feita.
Em artigo para Folha de São Paulo, Angela Boldrini contribui bem para esse debate, ao ressaltar o déficit de capital político das mulheres nos partidos políticos. Situadas em posições de menor destaque, sem capacidade de influência efetiva e com pouquíssimas oportunidades de ascensão, as mulheres orbitam as figuras de poder, permanecendo à margem de uma participação concreta nas tomadas de decisão. Trata-se, diz a jornalista, de uma questão estrutural que contamina o funcionamento saudável das siglas partidárias e que só pode ser mudada com pressão da opinião pública.
Para nós, mulheres, é imperioso tomar consciência crítica desse estado de coisas e adotar uma postura menos complacente com os partidos e com os políticos que admiramos por sua contribuição. Lula, apesar da sua magnitude para história da democracia brasileira, é pródigo em pequenos e grandes gestos de machismo estrutural, e seu governo não parece mais engajado do que outros em nos ceder espaços. Só o voto e a construção de lideranças femininas fortes nos permitirão mudar esse cenário, abrindo espaços que não poderão ser retomados a canetada.
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