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Backlash Cultural: A marcha - à - ré e o abismo
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É doutora em Educação pela UFC. Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro

Kalina Gondim comportamento

Backlash Cultural: A marcha - à - ré e o abismo

No Brasil, o backlash (retaliação) cultural promoveu ataques ao exame do ensino médio (Enem), por ocasião de uma questão que trazia o pensamento da feminista Simone de Beauvoir
Tipo Opinião
 Lei Maria da Penha  está sob ataque no Brasil (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Lei Maria da Penha está sob ataque no Brasil

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Já virou lugar-comum afirmar que derrotamos Bolsonaro, mas não o bolsonarismo. É fato inconteste que a aliança entre conservadores e a nova direita é o fundamento político-ideológico do bolsonarismo. A coalizão está muito bem representada no Congresso, detém uma força considerável perante parte do eleitorado religioso. Com um esquema de comunicação robusto e barulhento, faz suas ideias se propagarem de forma veloz e abrangente. O conteúdo, por sua vez, é bastante questionável, a argumentação sai de cena para trazer a lume os memes, os debates erguidos em torno de ideias se degeneram na destruição simbólica do interlocutor.

O emprego da desinformação e da mentira aliados ao uso abusivo da liberdade de expressão, na maioria das vezes, degrada a imagem e a reputação dos adversários. A linguagem beligerante, muita das vezes, tem como alvo a agenda de direitos femininos. Em muitos países, a aliança entre conservadores e a nova direita vem promovendo ataques aos avanços obtidos pelas mulheres. A jornalista Susan Faludi, em sua obra intitulada “Backlash: o contra-ataque na guerra não declarada contra as mulheres”, analisa o caso paradigmático dos Estados Unidos onde há em curso uma campanha antifeminista na política, na TV, no cinema, na literatura e também na moda.

No Brasil, o backlash (retaliação) cultural promoveu ataques ao exame do ensino médio (Enem), por ocasião de uma questão que trazia o pensamento da feminista Simone de Beauvoir, atuou também de forma sistemática para que meninas de escolas públicas não tivessem acesso à educação sexual e promoveu intenso ativismo contra direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

O backlash cultural brasileiro persegue de forma contumaz o feminismo, a independência e o protagonismo das mulheres. O alvo mais recente é a lei Maria da Penha. Fato muito preocupante quando lembramos que a cada duas horas uma mulher é morta no Brasil. Quarenta e um anos depois do crime, a farmacêutica Maria da Penha tem sua história e sua luta vilipendiadas por narrativas mentirosas que intentam tão somente atacar um instrumento de proteção das mulheres.

Os ataques dirigidos à lei Maria da Penha se configuram como um ataque a todas as mulheres e a própria democracia, dado que uma sociedade democrática não pode conviver com relações de gênero violentas e desumanizadoras. A agenda de direitos das mulheres não pode ficar susceptível a retrocessos políticos, constrangimentos financeiros, perseguições. O Brasil ostenta a marca vergonhosa do 5º lugar no ranking mundial de feminicídio. O terreno instável por onde caminham os poucos avanços nos aponta o tamanho do dever de casa que o Brasil precisa fazer.

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