Logo O POVO+
Dados do TSE evidenciam a existência de um poder intocável
Foto de Kalina Gondim
clique para exibir bio do colunista

É doutora em Educação pela UFC. Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro

Kalina Gondim comportamento

Dados do TSE evidenciam a existência de um poder intocável

A supremacia masculina silencia a voz de muitas mulheres e deixa suas pautas em permanente imobilismo
Tipo Opinião
Voto feminino em 1932 (Foto: FGV/CPDOC)
Foto: FGV/CPDOC Voto feminino em 1932

 

No decurso da democracia liberal, o direito ao voto foi um processo lento e árduo. Os critérios de renda estipulados pelo voto censitário e as exclusões por marcadores de gênero e raça deixaram grande parte da população à margem dos debates públicos e decisões políticas. A desigualdade posta no plano de participação política ensejou a emergência de movimentos que contestavam a exclusão bem como reivindicavam por direitos políticos. Entre estes movimentos, destacam-se as sufragistas que encampavam a luta pelo direito ao voto feminino.

Nesse ínterim, o ano de 1848 testemunhava os ciclos revolucionários na Europa central e oriental e a publicação do Manifesto Comunista de Marx e Engels. Entre esses eventos, permanece ainda pouco conhecida do grande público: a Convenção de Seneca Falls que reuniu mulheres norte-americanas com o propósito de denunciar a exclusão delas do direito ao voto.

No mosaico histórico que ilustra o sufrágio feminino, a Nova Zelândia despontou como o primeiro país do mundo a conceder o voto às mulheres, seguido pela Austrália; nas contradições históricas, a França - berço da revolução que estampou a igualdade, a liberdade e a fraternidade -, as mulheres tiveram direito ao voto apenas em 1945.

No Brasil, o acesso ao voto veio em 1932, no entanto o Código Civil ainda em vigor dava ao homem o poder de autorizar ou não o voto de sua esposa. Vale ressaltar que, na época, o voto feminino não era obrigatório, além disso muitas também permaneciam afastadas da política pelo contingente expressivo de mulheres analfabetas, dada a exclusão histórica das mulheres do direito à educação, isso porque o voto para analfabetos foi possível apenas com uma emenda constitucional de 1985.

Desse modo, apesar de o voto feminino ser instituído em 1932, os embaraços contextuais produziram discrepâncias abismais entre o número de mulheres e daquelas aptas a votar. O acesso gradual ao voto trouxe outras demandas de luta. As mulheres entenderam que não bastava apenas ter direito ao voto, elas precisavam participar do jogo democrático como candidatas, envolvendo-se no debate político e defendendo uma agenda com pautas femininas que foram historicamente negligenciadas. 

Como corolário, as mulheres começaram a ingressar nos partidos políticos e lançaram-se como candidatas. Na década de 1990, a Lei de Cotas de gênero na política veio coroar a luta das mulheres por maior representatividade. Olhando do presente, é inquestionável que as mulheres continuam sub-representadas na política.

Semanas atrás, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou o número de candidatos e o perfil destes para o pleito eleitoral. Segundo dados do TSE, em 2024, o Brasil terá 456.310 candidatos, dos quais 301.310 são homens e apenas 155.000 são mulheres. É perceptível a desigualdade demonstrada pelos números. Eles atestam que o poder político tem um gênero e sabidamente ele não é feminino.

Essa supremacia masculina silencia a voz de muitas mulheres e deixa suas pautas em permanente imobilismo. Há um pacto invisível e silencioso que tem por intuito deixar intocável o retrato do poder. A proposta de conceder anistia aos partidos que não cumpriram as cotas de gênero e de raça nas eleições de 2022 é um sintoma dos freios e artimanhas colocadas no caminho das mulheres.

Foto do Kalina Gondim

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?