Logo O POVO+
A Bola de Ouro que perdeu Vini Jr.
Foto de Mailson Furtado
clique para exibir bio do colunista

Mailson Furtado é escritor, dentre outras obras, de À Cidade (livro vencedor do Prêmio Jabuti 2018 – categorias Poesia e livro do Ano). Em Varjota-CE, fundou a CIA teatral Criando Arte, em 2006, onde realiza atividades de ator, diretor e dramaturgo, e é produtor cultural da Casa de Arte CriAr. Mailson escreve, quinzenalmente, crônicas sobre futebol e outros temas

A Bola de Ouro que perdeu Vini Jr.

O maior derrotado de todo esse certame passa longe de ser o brasileiro, mas o próprio prêmio, que há alguns anos desandou em credibilidade naquilo que se diz julgar
Tipo Crônica
Atacante Vinícius Júnior no amistoso Real Madrid x Barcelona, no MetLife Stadium, em New Jersey (Foto: Ira L. Black / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP)
Foto: Ira L. Black / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP Atacante Vinícius Júnior no amistoso Real Madrid x Barcelona, no MetLife Stadium, em New Jersey

A semana foi marcada pelo boicote do Real Madrid e de Vinicius Jr. à cerimônia da entrega da Bola de Ouro da France Football, onde o brasileiro era, com sobras, o maior favorito, no entanto, o título seguiu para o espanhol Rodri, do Manchester City.

Dentro da busca de explicações para o que aparentemente não há, é incontornável não trazer toda a luta antirracista travada por Vinicius Jr. ao longo de toda a última temporada, e seu apontar de dedo na cara de um país inteiro, a Espanha, e de todo um continente com seu ego de superioridade civilizacional como principal motivo para a sua não premiação.

É nítido o desconforto do “ser superior” europeu entender-se como um criminoso racista. Mais difícil ainda enxergar a riqueza construída por quase cinco séculos através de trabalho alheio, grande parte por sangue africano.

Nunca ninguém como Vinicius Jr. enfrentou, de forma tão incisiva e corajosa, tal luta em pleno território “inimigo”. Dia a dia insultado e tratado como ré e não vítima de asquerosos acontecimentos, segue a desbravar não apenas o campo, mas as arquibancadas raivosas por sua luta e sucesso.

Suponho que não “cairia” bem para Uefa, maior instituição de futebol da Europa, legitimar tal personagem, que quebra o establishment de uma sociedade que leva aos estádios seus preconceitos como forma de entretenimento.

A busca de tratar o futebol — e o esporte no geral — como um acontecimento à parte da sociedade não é o exercício de agora. Tão logo o futebol tornou-se uma máquina incomensurável de lucro, as instituições que o dirigem lutam para inibi-lo de qualquer interferência externa que possa ferir suas arrecadações.

Posicionamentos políticos de profissionais ligados ao esporte, quando existentes, são contornados dentro de uma diplomacia hipócrita por parte dessas instituições na busca do “preservar” o espetáculo, e circunscrevê-lo apenas às quatro linhas.

Vinicius Jr. há tempos cruzou tal fronteira, travando luta até contra a própria Uefa, que, além de imprimir frases feitas para fotos nos pré-jogos, mostra-se inerte na luta antirracista. Assim, depois de tanto, é realmente representativo receber uma comenda por parte de uma instituição como essa?

Creio que não, e o maior derrotado de todo esse certame passa longe de ser o brasileiro, mas o próprio prêmio, que há alguns anos desandou em credibilidade naquilo que se diz julgar.

O verdadeiro e maior prêmio de Vinicius Jr. já está escrito e inscrito na história e é coletivo: o seu enfrentamento aos racistas — um legado para todos nós.

Foto do Mailson Furtado

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?