Mailson Furtado é escritor, dentre outras obras, de À Cidade (livro vencedor do Prêmio Jabuti 2018 – categorias Poesia e livro do Ano). Em Varjota-CE, fundou a CIA teatral Criando Arte, em 2006, onde realiza atividades de ator, diretor e dramaturgo, e é produtor cultural da Casa de Arte CriAr. Mailson escreve, quinzenalmente, crônicas sobre futebol e outros temas
Entre TVs e streamings em disputa pelos direitos de transmissão, o rádio segue como garantia de sucesso para quem quer se perder pelos lances imperdíveis do futebol
Foto: Pixabay
Foto de um rádio antigo
Meu pai, sertanejo de plantar roçado, depois de um produtivo dia de trabalho, aliado por conta de um bom ano de chuvas, cruza os pés na rede da sala, abrindo a última cerveja da geladeira, para enfim acompanhar o jogo do dia, já tema desde a outra semana entre os fuxicos de bodega.
No futricar do controle remoto, quede o jogo? O canal de sempre, ainda na novela; o outro, ainda no jornal; o que inventou de transmitir pela primeira vez ano passado, reprisa o jogo do gol mil do Romário. Sem paciência, em um só gole a cerveja perde o motivo, entaramelada por um ou outro resmungo sobre o fim dos tempos, onde agora não é possível saber onde se assistir um jogo de futebol. A que ponto chegamos?!
De canto, rindo e assistindo a situação, me intrometo dizendo que basta dar um Google perguntando sobre e tudo estaria resolvido. Ele, sem muita trela para conversas de tecnologias, sem paciência pra pedir favor a seu ninguém, sobe o tom me botando no meio da briga — ora não sou eu quem tem que tá perguntando, se querem que o povo assista que divulguem.
Driblando as possibilidades, podia sair à primeira esquina para acompanhar o jogo em um bar, mas nunca foi disso. Podia pedir o primeiro com um celular à mão para sanar toda a situação, mas não. O orgulho a mostrar-se capaz de resolver os próprios problemas, ali tomava o campo, e ai de quem duvidasse disso.
Rumo ao quarto, cuspindo abelhas, volta menos revoltado quando sua última aposta, ali, se mantinha firme, no mesmo lugar, do mesmo jeito, desde sempre, desde antes, o rádio.
Neste ínterim de um cômodo a outro, por minha culpa, a TV estampava a transmissão do jogo tão esperada, na mais recente plataforma de streaming.
Ao cruzar a esquina da sala, e com o sentimento de quem não ficaria por baixo com tudo aquilo. De forma reta e sem rodeios, antes de cruzar novamente as pernas na rede, meu pai em um clique no controle remoto — que vá agora pra baixa da égua!, e a TV apaga.
Sem surpresas ou descobertas, entre tantos lugares possíveis, no mesmo lugar, o jogo no rádio conteve-se em se dizer.
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página
e clique no sino para receber notificações.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.