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Girassóis dentro do peito
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Marília Lovatel é escritora, cursou letras na Uece e é mestre em literatura pela UFC. É professora de pós-graduação em escrita literária e redatora publicitária. Tem livros publicados por diversas editoras, entre elas, Scipione, Moderna, EDR, Armazém da Cultura e Aliás. Vários dos seus 12 títulos são adotados em escolas de todo o país, tendo integrado 2 vezes o Catálogo de Bolonha, 2 vezes o PNLD Literário e sido finalista do Prêmio Jabuti 2017.

Girassóis dentro do peito

Tenho visto essa flor para onde me viro: no quarto da Marcela (filha), no adesivo protetor do meu notebook, na capa do livro que comprei
FORTALEZA, CEARÁ, 15-03-2023 : Exposição imersiva 8K de Vincent Van Gogh, no estacionamento do Shopping Rio Mar Fortaleza. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo) (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA, CEARÁ, 15-03-2023 : Exposição imersiva 8K de Vincent Van Gogh, no estacionamento do Shopping Rio Mar Fortaleza. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)

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Um quadro com os girassóis de Van Gogh no pôster — emoldurado como obra de arte — decorou por décadas a sala de jantar da casa de meus pais. Talvez essa referência e a exposição imersiva em que estivemos tenham se somado no imaginário de minha filha quando ela idealizou para si um quarto tendo o pintor holandês como tema. Além de sua arte, a história pessoal desse gênio — que fez ponte do Impressionismo para tudo o que veio depois — é tocante, e, de maneira particular, me emociona a sua relação com o irmão Theo. Ainda que geograficamente distantes, os dois se mantiveram unidos. As cartas trocadas entre eles nos arrancam da alma suspiros semelhantes aos que nos ocorrem diante das telas de Vincent.

Ao evocar esse amor fraterno, deixo-me inundar pela luz do portal. Existe um portal, velho conhecido dos escritores, que se abre de tempos em tempos e ajusta o mundo na mesma sintonia. Agora ele se abriu para me trazer os girassóis. Tenho visto essa flor para onde me viro: no quarto da Marcela, no adesivo protetor do meu notebook, na capa do livro que comprei — é sobre o processo criativo de “Encantado”, recente lançamento do cantor e compositor Silva —, no clima de uma festa próxima, na sala de jantar da memória, acompanhando as refeições à mesa com quatro lugares ocupados.

Há muitos anos, minha irmã foi morar fora do Ceará, longe do litoral. Primeiro, em São Paulo; depois, na serra fluminense, em Petrópolis — cidades sem praia. Sempre que podemos nos visitamos. Eu vou para lá, ela vem para cá. Não nos falamos todos os dias, mas a nossa ligação não se desfaz em nenhum minuto. No momento, arruma as malas, guarda nelas uma surpresa para mim — não adivinho, a própria me contou isso —, e eu escrevo esta crônica sobre nós duas.

Enquanto espero a sua chegada, reúno os girassóis em palavras, frases, com eles enfeito cada linha. Como em um plantio de cataventos, os sóis estão a girar dentro do meu peito, por recebê-la. Comemoro antecipadamente mais uma oportunidade de estar com ela, de sentar-me ao seu lado sob os coqueiros, em frente ao mar, de celebrar o meu aniversário com os nossos pés na areia.

Foto do Marília Lovatel

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