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As eleições de 2024 e a democracia no Brasil
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É mestre em Direito pela UFC e doutorado em Direito pela Johann Wolfgang Goethe-Universität Frankfurt am Main. Atualmente é professor da Universidade de Fortaleza e Procurador do Município de Fortaleza

As eleições de 2024 e a democracia no Brasil

Quando o povo se recusa a proteger mecanismos democráticos e prefere escolher candidatos cool ou pastores endinheirados, sem nenhum apelo pela racionalidade da política, se abdica de seu papel protagonista, não há muito o que se fazer
Tipo Opinião

Uma das figuras mais representativas da história política dos Estados Unidos da América é Benjamin Franklin. Após a Convenção da Filadélfia e a aprovação da Constituição em setembro de 1787, Franklin foi perguntado sobre quanto tempo aquela Constituição duraria: "durará tanto quanto o povo a mereça". Franklin acreditava que não havia garantias de que o povo não se corrompesse, a ponto de "escolher novamente o despotismo". Que a passagem é demonstrativa do realismo e da racionalidade de um intelectual e político, ninguém tem dúvida. A pergunta que nos assoma hoje em dia é, pois, para que servem as sábias advertências?

Para muito, ou melhor: para tudo. Somente com o olhar da história é que compreendemos nosso presente e podemos arriscar o futuro. A ideia de Benjamin Franklin se aplica ao Brasil e a qualquer canto do mundo. Só terá democracia quem a merece e quem a defende. É uma escolha simples e, ao mesmo tempo, trágica. Nos dias eleitorais atuais, nas Américas, na Europa, em qualquer lugar. Bolsonaro, assim como Trump, ou Alice Weidel, André Ventura, Marine Le Pen, Santiago Abascal compõem o cenário mundial de destruição da democracia e seu pluralismo. São figuras da retórica destrutiva, e conseguem esvaziar a mediação da política democrática com o Estado.

Em anos eleitorais como o de 2024, observa-se que os candidatos destes grupos e seus representantes abandonaram temas políticos que determinam a vida em sociedade, e focaram em maneiras de comunicação rápidas e vazias, mas que capturam atenção. Discutir renda, emprego, soberania deixou ser questão relevante tanto quando o saneamento. O tema da violência urbana e da imigração ganhou sentido sob a fórmula simplista de se atirar aos pobres a responsabilidade por sua catástrofe. A miséria econômica e política jamais foi escola da razão!

Não, não é responsabilidade somente de quem defende a democracia e o pluralismo enfrentar este quadro. O argumento do realismo cínico de que a esquerda que se vire para resolver esta nova realidade, ou da incapacidade da mesma esquerda em superar este cenário, não sobrevive quando se confronta com a ideia de Franklin. No Brasil da década de 1950, até o pensamento mais conservador e autoritário olhava para a sociedade - e não somente para o Estado - para interpretar nosso País. Como não formamos uma sociedade capaz de si mesma, não merecemos democracia.

Sem o apreço massificado pela democracia econômica e política, não há constituição democrática que sobreviva. Tem-se os meios institucionais para a salvaguarda da democracia, que estão previsto na nossa legalidade. Se o povo se recusa a proteger estes mecanismos, se prefere escolher candidatos cool ou pastores endinheirados, sem nenhum apelo pela racionalidade da política, se abdica de seu papel protagonista, não há muito o que se fazer. Não merece a democracia que tanto lhe custou, como a brasileira. As gerações futuras olharão com desprezo para o grosso dos pais e avós que hoje deixaram de ser senhores e senhoras de seu próprio destino, e apenas curtem likes em redes sociais, recusando-se a enxergar o perigo que está diante de seus olhos.

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