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Quem sabe faz a hora, não espera acontecer
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Ex-Ministra da Igualdade racial, no período entre 2003 e 2008, e, atualmente, professora na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro brasileira (Unilab). Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) e Doutora Honoris Causa pela Fundação Universidade Federal do ABC (UFABC)

Quem sabe faz a hora, não espera acontecer

Antes de qualquer coisa, superar o caráter autoritário do atual Estado Democrático de Direito, por meio da participação plena, é o que existe de mais revolucionário
Tipo Opinião
Matilde Ribeiro, ex-Ministra da Igualdade racial. Atualmente professora na UNILAB - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro Brasileira. Doutora em Serviço Social pela PUC - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Doutora Honoris Causa pela UFABC - Fundação Universidade Federal do ABC. (Foto: Divulgação )
Foto: Divulgação Matilde Ribeiro, ex-Ministra da Igualdade racial. Atualmente professora na UNILAB - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro Brasileira. Doutora em Serviço Social pela PUC - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Doutora Honoris Causa pela UFABC - Fundação Universidade Federal do ABC.

Quando era jovem, no período da Ditadura Militar, ouvia a frase - "Quem sabe faz a hora não espera acontecer", refrão da música - "Pra não dizer que não falei das flores" (escrita e cantada por Geraldo Vandré, em 1968) e mesmo sem muito entender, procurava me inteirar dos dizeres e dos fatos! Hoje compreendendo perfeitamente o terror que foi a Ditadura Militar, após o golpe 31 de março de 1964 e seus efeitos até os dias atuais, e, como toda/o brasileira com consciência crítica e integrante das trincheiras de luta pela vida digna das/os trabalhadoras/es, mantenho a indignação em relação ao passado e o pesar quanto a atualidade, com o reavivamento da extrema direita.

Diante da dureza da falta de democracia nesse país, infelizmente a juventude brasileira, mesmo com todo o arsenal informativo e tecnológico possível de ser acessado, padece da inércia causada pelo não saber da história dos anos de chumbo e de seus desdobramentos. Como professora em na Unilab - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (instituição de Ensino Público Federal, sediada nos Estados da Bahia e do Ceará), no convívio com jovens pobres, negros, quilombolas e indígenas percebo de um lado a curiosidade, peculiar dessa fase da vida, para o novo... o inusitado. Mas, também, percebo o não acesso destes a historicidade do Brasil e do mundo.

Quase que inevitavelmente quando lanço às/aos estudantes perguntas que remete a fatos históricos, a reação é de nulidade de conhecimento. As perguntas ficam no ar: a expressão "Dragão do Mar" (nome dado ao importante Centro Cultural em Fortaleza) nos remete a que fato histórico? O que me diz sobre a Ditadura Militar? Como vivem as/os negras/os e indígenas nos estados da Bahia e do Ceará? Qual simbologia tem o "quebra-quebra" ocorrido contra o patrimônio público em Brasília, em 8 de janeiro de 2023?

Toco nesta questão da nulidade de conhecimento histórico, não para culpabilizar a juventude. Pelo contrário, trago esse fato para explicitar a importância de a educação pública ter mais e mais responsabilidade de contribuir com a ampliação de estratégias de construção de pensamento crítico e com o "direito à verdade" como caminho para a vivência democrática.

No mês de março existem muitas motivações para que as salas de aulas se tornem espaços de conhecimentos críticos: o 8 de Março - Dia Internacional da Mulher; o 21 de Março - Dia Internacional contra todas as Formas de Discriminação Racial; e, o 31 de Março - O dia do Golpe Militar de 1964. Estas datas não devem ser entendidas como comemorativas e/ou de lembranças "do BEM"; a rememoração é de denúncia, é de contestação às atrocidades históricas.

Ter consciência de classe e vivenciar o ativismo da esquerda diante de um poderio elitizado, colocou e coloca em prova as/os ativistas e formadoras/es de opiniões. Nos vinte anos do aviltante regime da ditadura militar, o poder oficial foi centralizado nas mãos das Forças Armadas, negando à população a participação política em todas as esferas.

Como resultado das lutas e resistências, algumas conquistas estão edificadas na CF - Constituição Federal, promulgada em 1988, conhecida como "Constituição Cidadã". A busca do fortalecimento da política educacional como alavanca para a cidadania passou a ser continuada cabendo o destaque do artigo 205 da CF - Constituição Federal, que afirma a educação, como direito de todos e dever do Estado e da família que "será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho".

Para tanto, antes de qualquer coisa, superar o caráter autoritário do atual Estado Democrático de Direito, por meio da participação plena de todos os envolvidos nos processos de transformação da natureza e das condições de vida da produção, é o que existe de mais revolucionário. Toda e qualquer ação e/ou linguagem deve ser baseada na multiplicidade dos seres humano e da história, respeitando-se as mais diversas formas de ser e estar no mundo.

 

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