
A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
* desde 1928: As notícias reproduzidas nesta seção obedecem à grafia da época em que foram publicadas.
8 de agosto de 2006
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou ontem a Lei Maria da Penha, que prevê punição mais rigorosa em casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. Seguindo recomendação da coordenação da sua campanha à reeleição, Lula fez da sanção um evento em Brasília, no Palácio do Planalto, que contou com a presença de militantes dos direitos das mulheres.
O nome da lei é uma homenagem a uma militante dos direitos das mulheres. A cearense de Fortaleza, biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, foi agredida pelo marido, o colombiano Marco Antonio Heredia Viveros durante seis anos.
Em 1983, por duas vezes, ele tentou assassiná-la. Na primeira, por arma de fogo (quando deixou-a paraplégica) e, depois, por eletrocução e afogamento. O marido de Maria da Penha só foi punido depois de 19 anos. Ficou apenas dois anos na cadeia.
A lei sancionada altera o Código Penal e possibilita que agressores sejam presos em flagrante ou tenham sua prisão preventiva decretada. A legislação atual não previa a prisão em flagrante. Os agressores também não poderão mais ser punidos com penas alternativas, como pagamento de multas ou cestas básicas.
A lei também aumenta o tempo máximo de detenção previsto para os agressores, de um para três anos. As mulheres da iniciativa privada igualmente poderão ficar afastadas de seus empregos por seis meses, sem remuneração, mas com estabilidade. Prevê ainda medidas que vão desde a saída do agressor do domicílio e a proibição de sua aproximação física da mulher agredida e filhos, até o direito dela de reaver seus bens e cancelar procurações conferidas ao agressor.
Em 2001, após 18 anos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos responsabilizou o Brasil por negligência e omissão em relação à violência doméstica. Será criado também um Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para dar mais agilidade aos processos.
10 de outubro de 2006
"Quanto mais visibilidade se der em relação à violência contra a mulher, mais noção a gente vai ter dessa situação. Com a lei, nossas filhas, netas, irmãs vão estar mais protegidas. Eu me sinto muito feliz com essa homenagem de hoje". A declaração é da biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, 60, inspiradora da lei federal de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, em vigor desde o último dia 22. Na manhã de ontem, ela foi homenageada em sessão solene na Câmara Municipal.
Em maio de 1983, Maria da Penha foi atingida com um tiro disparado pelo marido e ficou paraplégica. Ele foi preso 18 anos depois. Mãe de três filhas, ela diz esperar que a lei, também conhecida como Lei Maria da Penha, possa inibir os casos de violência e estimular as mulheres a denunciar. "Na época do tiro, não existia delegacia da mulher nem movimentos. Eu não tinha nem a quem recorrer", lembra.
Depois de cumprimentar Maria da Penha com um beijo, a prefeita Luizianne Lins (PT) disse que a lei é a primeira no País a punir quem praticar violência contra a mulher. "Maria da Penha é uma guerreira, um exemplo para toda mulher. E transformou a indignação que ela teve em luta", resumiu. Segundo a prefeita, o Brasil "fez justiça" ao aprovar a lei. Em Fortaleza, 12 homens já foram presos desde que a lei entrou em vigor.
Para a vereadora Regina Assêncio (PHS), autora do pedido de homenagem a Maria da Penha, a lei deve diminuir os casos de agressão à mulher e cita como exemplo a lei que pune quem promove atos de racismo. "Esperamos que essa lei venha a surtir o mesmo efeito. É o primeiro passo, mas a lei só não adianta. As ações têm de ser divulgadas, difundidas pela sociedade civil".
As iniciativas direcionadas às mulheres feitas pela administração municipal foram destacadas por Luizianne Lins, dentre elas o Hospital da Mulher. A unidade será instalada no bairro Henrique Jorge. A inauguração está prevista para 2008. Sem dar detalhes quanto a orçamento e obras, Luizianne Lins disse que o hospital será referência no Brasil. "Fertilização in vitro, inseminação artificial, problemas de esterilidade. Tudo isso será tratado no hospital".
7 de agosto de 2016
Hoje, completam-se 10 anos da Lei Maria da Penha. Os leitores do O POVO estão tendo acesso, desde ontem, a uma série de reportagens sobre essa legislação que se tornou um dos mais importantes instrumentos de combate à violência contra as mulheres e referência mundial na área.
A lei foi batizada com o nome da bioquímica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, que foi vítima de duas tentativas de assassinato por parte do marido: na primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e na segunda, por eletrocussão e afogamento. Desde então, Maria da Penha, depois de longos anos denunciando o caso e tentando punir o agressor, vem se dedicando à causa do combate à violência contra as mulheres. A abrangência da legislação estende-se a qualquer caso de violência contra uma mulher, independentemente do local da agressão e do parentesco e sexo do agressor. É aplicada também a casais de mulheres e transexuais que se identificam como mulheres em sua identidade de gênero. Portanto, a violência doméstica contra a mulher independe de sua orientação sexual.
Apesar dos efeitos benéficos já produzidos pela legislação, a violência contra o gênero feminino continua alta. A taxa de homicídios de mulheres, no Brasil, por exemplo, é de 4,8 para cada 100 mil mulheres, fazendo o Brasil ocupar a quinta posição, entre 83 nações, no ranking mundial de proporção de assassinatos de mulheres. Os dados de dois anos atrás (2014) apontavam que quase 107 mil brasileiras buscaram socorro médico, naquele ano, por causa de violência doméstica e sexual, sendo que as negras se destacam como as mais agredidas. No caso específico de assassinatos, os que atingem o gênero feminino distinguem-se do masculino pelos meios utilizados e o local onde ocorrem. Os motivos passionais revelam-se no uso da força física e de objetos cortantes e penetrantes.
Registram-se no País um estupro contra mulher a cada 11 minutos - podendo ser um número até dez vezes maior, ou seja, quase um abuso por minuto (mais de 500 mil casos por ano), segundo os especialistas.
No Ceará, entre 2008 até julho deste ano, 24.855 mulheres foram vítimas de violência doméstica. E o estudo Tolerância Social à Violência contra as Mulheres (Ipea, 2014), apontou a resiliência da cultura patriarcal como pano de fundo da violência doméstica e da aceitação da violência sexual pela sociedade. Um desafio e tanto.
Maria da Penha foi vítima de um disparo de arma de fogo enquanto dormia, em maio de 1983. O autor do crime foi o então marido, Marco Antônio Heredia. No mesmo ano, ele ainda tentou assassiná-la por choque elétrico e afogamento. Foi após esse dia que Maria da Penha, 71, iniciou uma saga de quase 20 anos até o agressor receber algum tipo de punição. Conseguiu.
A vitória dela ultrapassou e muito o próprio caso. A farmacêutica bioquímica, com mestrado em Parasitologia, carrega no nome a sobrevivência própria e de muitas outras mulheres. Ao O POVO, ela faz uma avaliação da lei que batiza, de número 11.340/2006, sancionada dez anos atrás, que marca o início de uma era de fortalecimento da mulher contra a violência doméstica.
O POVO - São dez anos da Lei Maria da Penha. Quais avanços a senhora percebe em relação ao combate à violência contra a mulher neste período?
Maria da Penha - Os avanços são a conscientização dos gestores em criar as políticas públicas que fazem com que a lei saia do papel. A lei não pode funcionar sem as políticas públicas. No ano de 2014, todas as capitais brasileiras conseguiram estar estruturadas para atender a mulher em situação de violência doméstica. São avanços e isso deu visibilidade à violência. Não é que a violência aumentou, mas as mulheres começaram a acreditar nas instituições e a realizar as denúncias. Infelizmente, os pequenos e médios municípios não foram estruturados para isso, com raras exceções. O que se deseja é exatamente que esses gestores vejam como criar essa estrutura.
OP - A senhora percebe a mudança cultural no comportamento das pessoas em relação à violência doméstica?
Maria da Penha - Nós queremos que essa mudança seja feita por meio da educação. Em nível médio, fundamental e universitário. A criança que sabe da lei, já jovem vai se tornar menos violenta. E os profissionais que futuramente estarão atendendo as vítimas de violência doméstica também têm que passar por essa formação, por essa educação. O Instituto Maria da Penha está executando um trabalho no Ceará e em Pernambuco, em parceria com as universidades, e está sensibilizando esses universitários para eles saberem o porquê da lei e como atuar quando forem profissionais dessas políticas públicas.
OP - O que ainda precisa avançar na legislação?
Maria da Penha - A lei não precisa ser mudada, ela precisa ser implementada. Mexer na lei não é viável. Se não está funcionando a contento é porque não foram criadas condições de ela funcionar. A gente tem que criar primeiro as políticas públicas para o atendimento à mulher e depois verificar o que precisa melhorar. Acreditamos que se tudo for feito com responsabilidade, dentro do que foi criado, não há necessidade de melhorias. É tudo uma questão de aplicabilidade. Eu acho que a capacitação das pessoas envolvidas nos aparelhos de antedimento é fundamental. O funcionamento (da lei) é efetivo quando o Estado cumpre seu papel. Se ele não faz isso, os agressores sabem que nada mais vai acontecer e as mulheres não querem querem denunciar e chamar a Polícia.
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.