A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
* desde 1928: As notícias reproduzidas nesta seção obedecem à grafia da época em que foram publicadas.
O ator Grande Otelo morreu ontem, aos 78 anos, vítima de ataque cardíaco, no Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris. Ele ia participar do 15º Festival dos Três Continentes, a convite do Governo francês. Foi atendido imediatamente, mas fracassaram os esforços para salvá-lo, feitos pelo pessoal do aeroporto e por uma médica brasileira que estava no mesmo vôo.
Grande Otelo nasceu Sebastião Bernardo da Costa, a 18 de outubro de 1915, em Uberlândia, Minas Gerais. Por alegada travessura, mudou o nome para Sebastião Bernardes de Souza Prata. Bernardes, em homenagem ao presidente Arthur Bernardes; Souza, num tributo ao lugarejo em que viveu, e Prata, em respeito a Chico Prata, o pai verdadeiro. "Bastiãozinho", como era chamado em sua terra natal, adotou muitos nomes no decorrer da vida artística.
Filho de uma empregada doméstica, o menino foi adotado por Isabel Parecis, de uma companhia teatral que excursionava pelo interior de Minas. Em São Paulo, o maestro italiano Felipo Alessio elogiou sua voz de "tenorinho" e previu que, quando crescesse, poderia cantar a ópera Otelo. Dessa forma, o ator ganhou a base do apelido definitivo.
Ainda criança, Otelo fugiu da família Parecis em busca de aventura. Dessa atitude resultou o confinamento no extinto abrigo de menores de São Paulo, e uma nova adoção, desta vez pela família Queiroz. Nessa época, já fazia suas incursões pela companhia negra de revistas, de Oduvaldo Vianna, para muitos, o responsável por sua "descoberta artística". Sua carreira começou bem antes, em 1925, fazendo figuração num circo - era a mulher do palhaço, papel em que exercitava bem seu lado "moleque", reforçado pela baixa estatura, apenas 1,50 metro, que viria a marcá-lo por toda a vida. A pantonima chamava-se O Tesouro da Serra Morena.
Abandonou os estudos no terceiro ano ginasial, quando foi descoberto pelo empresário teatral Jardel Jercolis, em 1935. A fama veio rápido. Na década da 30, Grande Otelo ja era atração no cassino da Urca, no Rio de Janeiro. A carreira no cinema começou em 1935, com Noites Cariocas, de Enrique Cadicamo. Em 1942, filmaria It's All True, de Orson Welles, que ficou na gaveta e só agora foi finalizado. Em 1969 faria sua participação mais importante no cinema, em Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade.
As tragédias da vida do ator ficaram por conta das esposas. Em 1948, Lúcia Maria se suicidou, depois de matar o filho Osmar, de dois anos. O próprio Grande Otelo nunca soube dizer se foi por causa da cachaça (uma de suas manias, junto com a groselha) ou se foi por ciúme. Da segunda mulher desquitou-se logo que o mais novo dos quatro filhos do casal completou 18 anos. Maria Helena Soares da Rosa, ou Josephine Helene, nome artístico de sua terceira mulher, 28 anos mais jovem, deu-lhe uma facada no peito em 1987.
Segundo alegou o artista na delegacia de polícia, os dois chegaram bêbados em casa e a briga começou porque ele contratara a Josephine que havia namorado há 30 anos a mulher do violinista Baden Powell, Silvia de Sousa. "Se não fosse o menino, ela teria me matado", disse, referindo-se ao filho da mulher, Orson Soares. No final, Grande Otelo a perdoou.
Tido, em vários momentos de sua vida, como dependente da bebida e de drogas, sempre negou tais dependências, garantindo de forma bem-humorada que seu vício mesmo era mulher. Na verdade era um incorrigível boêmio que, em 78 anos de vida e 70 de carreira artística nunca manteve uma agenda, mas cumpria os compromissos como podia. Cômico de mão cheia, ele soube, por outro lado, como poucos, impor vida e grandeza com papéis da marginalidade urbana, em filmes dramáticos, fugindo ao rótulo que quizeram impor-lhe.
28 de novembro de 1993
Rio - O corpo de Grande Otelo, o ator brasileiro falecido na sexta-feira última ao desembarcar em Paris, chega hoje ao Rio de Janeiro, graças à intervenção pessoal do presidente Itamar Franco, que solicitou às autoridades consulares brasileiras em Paris para que agissem junto às autoridades francesas para que completassem o mais rapidamente possível as operações administrativas, indispensáveis para acelerar o embarque.
Ontem, a repartição competente autorizou, em caráter excepcional, a liberação do corpo, permitindo que ele pudesse ser embarcado no vôo da Varig que deixou Paris às 22h30min. Desde que os médicos do Samu, o Serviço de Socorros de Emergência constataram a morte do ator de 78 anos, seu corpo foi transferido para a funerária de Gonesse, um município nas imediações de Roddiy, onde foi velado por poucas pessoas.
No início da tarde de ontem o corpo de Grande Otelo foi velado por cerca de 30 pessoas, franceses e brasileiros, que estiveram na funerária Gomesse para prestar a última homenagem ao ator desaparecido.
29 de novembro de 1993
Rio - A família do ator Grande Othelo, que morreu sexta-feira, em Paris, pretende homenagear o artista com a criação de um centro de memória no Rio. A idéia foi lançada ontem, durante o velório de Othelo, pelo filho mais novo do ator, José Antônio Prata. O corpo de Grande Othelo, que chegou às 9 horas de Paris, foi levado em um caminhão do Corpo de Bombeiros para o Palácio de Cultura, Centro do Rio, onde ficará até meia-noite de hoje. O enterro será realizado terça-feira, no cemitério municipal de Uberlândia, em Minas.
José Antônio disse que a família Prata vai pedir ao Ministério da Cultura a cessão de um espaço no Rio para a implantação do centro. Segundo ele, os quatro filhos de Othelo reúnem um vasto acervo do ator, com roupas de cena, cartazes, medalhas, fotografias, imagens e outros documentos sobre a sua carreira.
1º de dezembro de 1993
Uberlândia (MG) - O enterro da ator Grande Othelo, ontem, em Uberlândia (MG), demorou mais de três horas porque a ex-companheira de Othelo, Maria das Graças, e os filhos não aceitaram a sepultura destinada para receber o corpo de Othelo, localizada no Cemitério Municipal São Pedro. Durante o velório na Câmara, familiares e autoridades discutiram a questão, sem que uma solução fosse encontrada antes das 18h30min, quando o corpo do ator foi finalmente enterrado. O Presidente da Câmara, vereador Aristides de Freitas, se comprometeu com os familiares de Othelo que mandará edificar um mausoléu na sepultura 77 usando padrão internacional "classe A, a título de homenagem". Mesmo assim, Maria das Graças fez questão de ir antes ao cemitério para supervisionar a nova sepultura aberta para receber o corpo do ator
02 de dezembro de 1993
Uma das mais belas sequência do cinema brasileiro é aquela, no fim de Rio, Zona Norte, (1957), quando o compositor Espírito da Luz Soares tem um momento de inspiração. Perigosamente pendurado no trem, olha a paisagem e canta seus novos versos exaltando o samba que o Brasil despreza. Está feliz o pingente, mas logo morrerá.
Neste filme de Nelson Pereira dos Santos, o personagem é vivido por Grande Otelo (1915-1993). É um dos vários trabalhos em que o extraordinário ator, tão associado ao gênero cômico, mostra o seu brilho dramático também na tragédia. Este é um de seus trabalhos a disposição em vídeo. Cinco anos antes, ele já havia comovido o público brasileiro ao "desaparecer" na história de Amei um Bcheiro, de Jorge Ileli.
Essa introdução é só para lembrar que Otelo não deve ser reduzido à imagem (merecida) de grande cômico do cinema nacional, consagrado ao lado de outro gênio do riso, Oscarito, nas chanchadas da Atlântida. No caso, é inesquecível aquela hilária cena no balcão, onde ele faz Julieta e o outro, o Romeu.
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