
A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO
* desde 1928: As notícias reproduzidas nesta seção obedecem à grafia da época em que foram publicadas.
Os olhos das Américas estão voltados neste domingo para a Bolívia, onde se realizam eleições presidenciais e legislativas no meio de uma crise que consome o país há vários anos. Cerca de 3,6 milhões de eleitores, de uma população composta de quíchuas (30%), aimarás (25%), cholos ou mestiços (30%), e apenas de 15% de brancos, escolherá entre o líder indígena Evo Morales, do MAS (Movimento ao Socialismo) e Jorge “Tuto”, Quiroga, do Podemos (Poder Democrático Social), representante das forças conservadoras.
O candidato socialista é apontado como o preferido nas pesquisas de opinião (34%), enquanto seu adversário está cinco pontos percentuais atrás.
Além do Presidente da República, e o vice-presidente, serão escolhidos 130 deputados, 27 senadores e, pela primeira vez, os prefeitos ou governadores dos nove departamentos (estados) do país.
Há um pequeno detalhe: a Bolívia, que comparece às cabines eleitorais, neste domingo, teve cinco presidentes nos últimos quatro anos e está profundamente dividida por uma crise que parece interminável. Aliás, crise é uma palavra que desde a independência do país, em 1825, nunca saiu do cenário. Nesse ínterim, ocorreram pelo menos 154 quarteladas.
Os bolivianos guardam uma grande mágoa do chilenos, pois graças a uma guerra como o Chile, no século XIX, perderam o acesso ao Pacífico tornando-se um país mediterrâneo. Na sua parte amazônica, a Bolívia igualmente foi constrangida a ceder território quando o Brasil resolveu reconhecer a independência do Acre, proclamado república em 1902 pelo gaúcho Plácido de Castro (1873-1908). Com o Tratado de Petrópolis, assinado em 1903, a Bolívia, em troca da cedência de um território de mais de 142.800 km² para o Brasil, recebeu uma indenização de 2 milhões de libras esterlinas e a promessa de ter um acesso Atlântico pela construção da futura estrada-de-ferro Madeira-Mamoré. Por último, a Bolívia perdeu 249.500 km² da região fronteiriça na Guerra do Chaco contra o Paraguai, uma área cobiçada então por empresas petrolíferas estrangeiras.
O Brasil está no centro da crise boliviana por conta do projeto de nacionalização de duas refinarias da Petrobras. Evo Morales quer introduzir uma espécie de controle do governo para as reservas de petróleo e gás do país, que são as segundas maiores da América do Sul. Esse projeto encontra resistência nas classes dirigentes. Aliás, estas defendem uma autonomia completa para a região de Santa Cruz, a parte mais rico do país e ameaçam retalhar o território nacional.
O mais grave de tudo é que o sistema eleitoral boliviano é tão complicado que as eleições ocorreram mais para agravar a crise do que para animá-la. Só é considerado vencedor do pleito, que obtiver 50% dos votos mais um. Caso ninguém consiga, a disputa vai para o Congresso, que escolherá o presidente da República. Como as eleições parlamentares dificilmente reproduzem a mesma correlação de forças da eleição para o Executivo, o mais provável é a confusão intensificar-se, no caso de a decisão ficar com o Parlamento.
Além do mais, o líder socialista não é bem visto pelo Departamento de Estado americano. Washington teme uma aliança da Bolívia com a Venezuela, ajudando a levar a América do Sul ainda mais para a esquerda. Por conta disso, vem construindo bases militares no Paraguai e na Colômbia.
As regras atuais da Constituição boliviana favorecem as propostas de livre mercado e isso provocará um choque com as posições de Evo Morales, caso seja eleito. De qualquer forma, está marcada a convocação de uma Assembléia Nacional Constituinte em julho, mas os setores tradicionais talvez compliquem o processo por temor da eleição de uma assembléia dominada pela esquerda. Por isso, não se enxerga o fim da crise boliviana para um futuro próximo.
Há, porém, uma cobrança para que os países do Mercosul pressionem as forças políticas locais a não fugirem da institucionalidade democrática. Por conta disso, espera-se uma atuação mais fino do Brasil no sentido de garantir que os próprios bolivianos resolvam seus problemas internos, sem interferência estrangeira (no caso, dos Estados Unidos).
Cerca de 3,6 milhões de eleitores foram convocados para ir às urnas neste domingo na Bolívia para eleger o presidente da República, o vice-presidente, os governadores das nove departamentos (províncias) do país e os 130 deputados e 27 senadores que irão compor o Congresso em La Paz. Mais de 200 observadores internacionais já estão no país para acompanhamento da jornada eleitoral.
Em seguida, começará a apuração dos votos. O voto no país é obrigatório e, segundo pesquisas, 11,6% dos eleitores ainda não decidiram em quem optar. A escolha dos indecisos será fundamental para o processo, já que nenhum dos candidatos à Presidência deve obter a maioria absoluta. Por isso, a eleição do presidente deve ser decidida no segundo turno, diretamente, pelo Congresso.
O vencedor do pleito assumirá a Presidência em janeiro e será o quarto presidente no país em menos de três anos. Em 2003, Gonzalo Sánchez de Lozada renunciou à Presidência devido a uma onda de protestos violentos que provocou a morte de mais de 60 pessoas.
Carlos Mesa, que assumiu após a desistência de Lozada, entregou sua carta de renúncia em março deste ano, porém só saiu do poder em junho passado, quando Eduardo Rodríguez assumiu o poder, seguindo a linha sucessória recomendada pela Constituição boliviana. Ele era presidente da Suprema Corte, e terceira na sucessão. Após assumir, Rodríguez tinha o prazo de 180 dias para convocar eleições gerais.
O líder cocaleiro Evo Morales aparece como favorito na disputa, com uma proposta que obteve o apoio da maioria pobre e indígena do país. Morales prega a independência dos interesses estrangeiros.
De acordo com uma pesquisa publicada na última semana pelo instituto de pesquisas Ipsos-Captura no jornal boliviano La Prensa, Morales aparece em primeiro entre os oito candidatos à Presidência, com 34,2% das intenções de voto. Jorge Quiroga, conservador de direita que já foi presidente da Bolívia, aparece em segundo lugar, com 29%. Em seguida, está o empresário Samuel Doria Media, que conta com o apoio de 9% dos eleitores. A pesquisa tem margem de erro de 2,4 pontos percentuais.
19 de dezembro de 2005
Pesquisa de boca-de-urna divulgada ontem às 20h em La Paz mostrava o candidato socialista Evo Morales com 44,5% dos votos, dez pontos percentuais à frente do segundo colocado, o ex-presidente Jorge ‘‘Tuto’’ Quiroga, com 34,3% dos votos, informou a rede de TV Unitel. Caso essa porcentagem seja confirmada, será a maior de um candidato a presidente obtida desde a volta da Bolívia à democracia, em 1982.
A alta porcentagem do líder indígeno-cocaleiro não chega a atingir a maioria simples, o que faz que o segundo turno seja realizado de forma indireta, no Congresso, entre os dois mais votados, em meados de janeiro. Mas a ampla vantagem lhe dá grande força política e inibe uma reversão do resultado no Parlamento em favor de Quiroga. Além disso, o terceiro colocado na pesquisa boca-de-urna (11,7%), o empresário Samuel Doria Mediana, disse que, se um candidato conseguisse mais de cinco pontos percentuais sobre o segundo colocado, deveria ser escolhido presidente.
A pesquisa de boca-de-urna tem três pontos percentuais de margem de erro. Em novembro, quando estava à frente nas pesquisas, Quiroga defendeu que o mais votado no primeiro turno deveria ser proclamado presidente. Depois de ser superado por Morales, porém, tem evitado falar sobre o assunto.
Morales votou ontem de manhã em Villa Tunari, na região do Chapare (centro do país), onde se projetou politicamente como o principal líder dos plantadores de coca bolivianos. ‘‘Esta é a hora dos desprezados, dos massacrados, dos esquecidos em 180 anos de história boliviana’’, disse.
Em La Paz, onde votou, ‘‘Tuto’’ Quiroga, 45, prometeu fazer ‘‘mudanças com estabilidade e não um salto no vazio. Nossa proposta não é boicotar nem atirar pedras.’’ Engenheiro com graduação nos EUA, Quiroga assumiu a Presidência da Bolívia entre 2001 e 2002, em razão da morte de Hugo Banzer por câncer.
Estima-se que cerca de 3,6 milhões de bolivianos tenham comparecido às urnas ontem para escolher os futuros presidente, vice-presidente, senadores, deputados e, pela primeira vez na história governadores.
As comemorações pela vitória de Morales começaram já no início da noite de ontem na sede da Federação de Cocaleros da cidade de Cochabamba (400 km ao leste de La Paz), depois que foram divulgados os primeiros resultados extraoficiais confirmando uma possível vitória esmagadora.
‘‘Evo, Evo Presidente, o país está presente’’, gritavam os simpatizantes de Morales, pulando e dançando juntos na sede ‘‘cocalera’’. ‘‘O projeto de Evo é o mais viável’’, disse Carlos Reynold, um engenheiro petroleiro que preside um grupo de profissionais que apóia Morales, ‘‘agora com mais razão’’.
21 de dezembro de 2005
Depois da vitória do líder indígena Evo Morales como presidente da Bolívia, cresce a curiosidade sobre o que vai se passar daqui para a frente. Trata-se de mais um líder popular eleito na América Latina com a missão de resgatar a dívida social e traçar um caminho mais autônomo para seu país. E, mais uma vez, há o temor de que o excesso de expectativas e as limitações econômicas e as imposições de ordem externa provoquem uma frustração nos eleitores.
Evo Morales parte com uma vantagem inicial: obteve mais votos do que o necessário para assumir o governo, sem contestações à sua legitimidade (fato inédito, visto que o sistema eleitoral boliviano dificilmente permite que um candidato a presidente alcance metade mais um dos votos). Pulou, assim, uma fogueira: a de ter de disputar o mandato no Congresso, como determina a Constituição, quando não se obtém a maioria absoluta nas urnas. Também está respaldado pela maioria confortável, obtida na Câmara dos Deputados, embora, não seja esmagadora a ponto de não depender da oposição. No Senado, perde por poucas cadeiras.
O grande problema do novo dirigente boliviano vai ser a resistência dos departamentos, agora sob a direção de governadores eleitos. O que não existia antes. Sobretudo, a oposição do governo da província de Santa Cruz, que representa os interesses da parte mais rica do país, onde é latente a ameaça de cesseção. Lá estão concentradas as forças que defendem a manutenção do modelo de teor neoliberal contestado pelo restante do país.
A proposta de retomada pelo Estado das reservas naturais (petróleo e gás) atualmente sob o controle de empresas privadas estrangeiras (inclusive a Petrobras) causa apreensão nos meios econômicos. O compromisso foi assumido claramente por Morales, que terá no seu calcanhar a cobrança dos movimentos de sua base de apoio social. Caso não o cumpra, sofrerá um desgaste maior do que o sofrido por Lula, ao não romper com a política monetarista de seu antecessor. As desconfianças a esse respeito são muitas, posto que a Bolívia não tem muita margem de manobras para enfrentar o modelo hegemônico defendido pelos EUA, no Continente.
Presume-se que o país poderá ser isolado pelos centros financeiros internacionais. Contudo, Morales se fia na esperança de uma composição com seus aliados continentais - Venezuela, Brasil, Argentina e Uruguai. Será mais um a defender o projeto de integração sul-americana que está sendo costurado por esses países.
O Departamento de Estado americano já avisou que acompanhará a situação com muita atenção. O problema é que as alternativas apresentadas por Washington não têm funcionado para os governos da região. A maioria não aceita sujeitar-se às condições do modelo mexicano. Este só favoreceu, até aqui, alguns segmentos das camadas dirigentes. E o custo político tem sido alto, pelo comprometimento da autonomia do país.
Por outro lado, é esperada uma intensificação do conflito de interesses quando da convocação da Assembléia Constituinte para elaborar uma nova Constituição para o país. Evo Morales pretende avançar para um modelo de democracia participativa, que garanta a maior intervenção dos cidadãos no processo de tomada de decisões. A possibilidade da criação de mecanismos que possibilitem a destituição de mandatários, pelos eleitores insatisfeitos com seu desempenho, está no horizonte, pois essa seria a forma de evitar os vícios de uma política fisiológica e elitista como a que tem sido aplicada tradicionalmente no país.
De outro modo, uma política participativa faz com que os governantes dividam suas responsabilidades com os governados e estes, por sua vez aprendam a se sentir responsáveis pelas conseqüências de suas próprias decisões, deixando de debitá-las apenas aos dirigentes. Esse compartilhamento de responsabilidades é a maior vantagem da democracia participativa, pois ninguém poderá eximir-se alegando que não tem nada com isso. Acompanhar o processo boliviano será certamente muito pedagógico para os povos da América Latina.
22 de dezembro de 2005
O presidente eleito da Bolívia, Evo Morales, começou a definir em seu reduto de Cochabamba (centro) o perfil de seu governo de esquerda, depois de ter confirmada oficialmente ontem, pelo tribunal eleitoral em La Paz, a vitória nas eleições de domingo.
Morales conseguiu a maioria absoluta com 54,1% dos votos válidos, depois de contabilizados 93% dos sufrágios, segundo a Corte Nacional Eleitoral (CNE). O adversário de direita de Morales, o ex-presidente Jorge Quiroga (2001-2002), se estabilizou em 28%, depois de contados 2,7 milhões de votos.
O primeiro governante de origem aymara quechua da Bolívia, que assumirá no dia 22 de janeiro próximo, anunciou um período de austeridade durante uma reunião ampliada da qual participaram cerca de 500 delegados de setores sociais vinculados a seu Movimento Ao Socialismo (MAS).
Morales antecipou uma etapa de ‘‘grande austeridade’’ no aparelho estatal para ‘‘garantir realmente a mudança’’. O presidente eleito chegou a anunciar entusiasmado: ‘‘Não ganhamos as eleições para um governo de três meses ou cinco anos, ganhamos para pelo menos 50 anos’’.
Os resultados oficiais das eleições presidenciais bolivianas, que confirmaram como vencedor o líder ‘‘cocalero’’ de esquerda, apontaram de um total de 2.693.003 votos válidos, apenas 7,8% de preferência para o candidato de centro, Samuel Doria Medina (7,8%). O candidato boliviano de origem japonesa Michiaki Nagatani obteve 5,9% dos votos, enquanto o líder aymara Felipe Quispe acumulou apenas 2,21%.
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