Logo O POVO+
Elis morre, a música está de luto
Foto de O POVO é História
clique para exibir bio do colunista

A história do Ceará e do mundo desde 1928, narrada pelas lentes do acervo de O POVO

Elis morre, a música está de luto

* desde 1928: As notícias reproduzidas

nesta seção obedecem à grafia da

época em que foram publicadas.

20 de janeiro de 1982

Elis morre, a música está de luto

Morreu ontem, em São Paulo, vítima de parada cardíaca, a cantora Elis Regina. Ela estava ao telefone, no apartamento, quando se sentiu mal e foi encaminhada ao Hospital das Clínicas, onde, mesmo atendida por 15 médicos, veio a falecer. O corpo está sendo velado no Teatro Bandeirantes e será sepultado hoje, às 11 horas.

A morte de Elis causa uma tristeza imensa, sobretudo no meio artístico. Com apenas 36 anos, era considerada a maior intérprete da música popular. Ontem a Rádio FM do POVO apresentou especial "Elis por Fagner" e deverá reprisá-lo hoje, às 22 horas. A vida de Elis, seu pensamento, sua morte.

Parada cardíaca mata Elis Regina

São Paulo - Elis Regina chegou morta às 11h45min, de ontem, ao Hospital das Clínicas, em São Paulo, cujos médicos nada puderam fazer. "Ela deu entrada com sinais vitais finais", explicou o Superintendente do HC, médico Primo Curtis. O aparelho ressuscitador foi inútil. Elis, 36 anos, três filhos, morreu durante um telefonema mantido, de seu apartamento perto da avenida Paulista, com seu namorado, o advogado Samuel MacDowell Figueiredo.

A notícia da morte de Elis emocionou seus amigos e fãs. No corredor do Pronto Socorro do Hospital das Clínicas, funcionários e médicos ficaram surpresos. Um amigo de Elis telefonou, por volta do meio-dia, para o apartamento: João Marcelo atendeu e disse que sua mãe tinha saído com Celina Silva, sua sua secretária. "Mas, mamãe vai voltar para almoçar", explicou o garoto.

João Marcelo, 11 anos, estava então sozinho no apartamento sem saber que o corpo de sua mãe saía do Hospital das Clínicas para o IML para ser autopsiado. Rogério, irmão de Elis Regina, seguiu imediatamente para o apartamento para ficar com João Marcelo e evitar que ele soubesse da morte da mãe através de estranhos. Pouco depois, o guitarrista Sérgio foi se encontrar com Rogério.

No Instituto Médico Legal, o advogado Samuel MacDowell, a secretária de Elis, Celina Silva e o advogado Marco Antônio Barbosa, companheiro de escritório de Samuel, estampavam no rosto o espanto e dor pela morte de Elis. Amigos lembravam que também o advogado Marco Antônio tentou socorrer Elis, levando um médico para o apartamento da rua Mello Alves. Quando tentavam salvá-la, os filhos estavam no play-ground do edifício e nada viram.

No IML

Às 13h, uma pequena multidão rodeava o prédio do Instituto Médico Legal, emocionando-se com o som das músicas cantadas por Elis e sua voz de recentes entrevistas, que as rádios de São Paulo repetiam a todo instante. "Atrás da Porta", de Chico Buarque um dos grandes sucessos da cantora provocou lágrimas em algumas pessoas.

Mas, em algumas rodas de conversa, surgiu uma versão de que, na véspera, uma reunião noturna no apartamento de Elis foi interrompida por uma discussão, o que teria provocado até queixas dos vizinhos à Polícia. Essa versão incluía outra: Elis Regina deveria ter tomado comprimidos em excessão e essa "overdose" motivou sua morte, pela manhã.

As 13h40min chegou a notícia do término da autópsia do corpo de Elis, cujas vísceras, sangue, urina e estômago foram retiradas para o exame toxicológico, que vai apurar, em 48 horas, qual a real causa-mortis. O deputado Eduardo Suplicy (PT) chegou ao IML, lamentando sua morte: Elis, disse ele, era filiada ao Partido dos Trabalhadores.

O policiamento no local foi aumentado incluindo uma equipe do DOPS. Apesar do acúmulo de gente pelos corredores do IML, não houve nenhum incidente. Às 15h, o namorado de Elis Regina, advogado Samuel MacDowell de Figueiredo saiu de uma sala onde se trancara o tempo todo, evitando responder qualquer pergunta dos jornalistas. O rosto cansado, mostrando sinais de que havia chorado.

Local do velório

O irmão de Elis, Rogério e produtor de televisão, Cláudio Petraglia, cuidaram da liberação do corpo. A essa altura decidiram que o velório seria no Teatro Bandeirantes, palco de vários espetáculos de Elis Regina. O Secretário da Cultura, da Prefeitura de São Paulo, Mário Chamie, ofereceu também o Teatro Municipal para que todos velassem o corpo da cantora.

O trajeto

Às 16h20min, o caixão de Elis foi transportado para uma camioneta Caravan azul do IML, que tomou o rumo da avenida Brigadeiro Luiz Antônio. No meio dos curiosos, poucos artistas famosos, entre eles, Tônia Carrero e Clara Nunes. O cortejo congestionou o trânsito em todo o trajeto.

Depois de passar pela avenida Paulista, o carro funerário chegou ao Teatro, onde Elis apresentou, com sucesso seu espetáculo "Falso Brilhante". Centenas de pessoas reuniram-se à porta do Teatro, enquanto uma longa fila dobrava a esquina. A avenida Brigadeiro Luiz Antônio, uma das mais movimentadas de São Paulo, congestionou e os policiais tiveram dificuldades em controlar a situação.

As primeiras visitas

Sob a luz de refletores, o caixão de Elis Regina permaneceu aberto apenas para amigos íntimos e jornalistas. O povo tentou em vão, ocupar as cadeiras do Teatro, policiais ordenavam "circulando, circulando". O namorado de Elis, Samuel MacDowell, debruçou-se, chorando sobre o caixão aberto, durante 15 minutos. Depois foi levado amparado para um dos lados do palco.

Pouco tempo depois, a Polícia deixou que os fãs chegassem para ver Elis: alguns faziam o sinal da cruz, outros choravam copiosamente, e houve uma mulher que saiu do Teatro, maldizendo a vida com palavras de baixo calão. Elis Regina não queria música em seu velório, revelou um de seus primeiros empresários, o jornalista Walter Silva. Seu desejo, porém, não foi cumprido, pois rádios de pilha transmitiam em baixo volume, os sucessos da cantora.

Às 17h10min, o músico César Camargo Mariano, seu ex-marido, chegou ao Teatro, pálido, óculos escuros e se dirigiu a longa fila, mas acabou levado ao palco por uma entrada lateral. A Polícia interrompeu a visitação pública. César Mariano ficou chorando sobre o esquife por 20 minutos. Ouvia-se apenas o zumbido das máquinas fotográficas. Seu ex-marido não fez nenhuma declaração.

Clara Nunes, presente no IML e também no Teatro, contou que soube da morte no rádio do carro, quando se dirigia para o Aeroporto de Congonhas, pois viajaria para o Rio. De fé espírita, como era Elis, ela disse que "foi chamada pois já cumpriu sua missão nessa encarnação". Negou que Elis Regina estivesse passando por uma crise emocional: "mudou de gravadora e preparava um novo disco. Elis estava entusiasmada com a nova vida". Um amigo de Elis, que não quis se identificar, revelou porém, que a morte de Elis pode estar ligada aos dois telefonemas mantidos por ela com o advogado Samuel MacDowell. Segundo esse amigo, o primeiro telefonema durou 35 minutos. No segundo, o advogado inquietou-se, pois Elis parou subitamente de falar.

No Teatro, chegaram as primeiras rosas-apenas três embrulhadas num papel branco. Foram deixadas próximas a um candelabro por uma mulher desconhecida, que as depositou com a ponta dos dedos. Beijou o vidro do caixão, que mostrava o rosto do cadáver de Elis Regina. O sepultamento está marcado para hoje às 11 horas, no Cemitério Morumbi.

Foto do O POVO é História

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?