Paulo Sérgio Bessa Linhares é um antropólogo, doutor em sociologia, jornalista e professor cearense
Paulo Sérgio Bessa Linhares é um antropólogo, doutor em sociologia, jornalista e professor cearense
Paris da revolução francesa. Paris das barricadas. Paris das vanguardas artísticas. Paris gastronômica. Paris da moda. Paris de Sartre, Simone Beauvoir e dos cafés.
Paris testemunhou mais acontecimentos importantes do que qualquer outra grande cidade do mundo. E viu o pensamento sobre as grandes ideias de liberdade e igualdade se transformarem em livros, discos, ações e reações, modas.
Mas decifrar Paris, hoje, não é fácil.
A maioria das pessoas não passa da visita ao Louvre, o passeio de barco no Sena e o chatíssimo Champs Elysees.
Que Paris ainda é uma festa, repetindo a frase Ernest Hemingway, todo mundo concorda.
Mas saber como entrar nessa festa, e participar dela, é um longo aprendizado.
É que Paris tem muitas camadas, muitos tempos históricos, e para entender o impacto dessas camadas hoje é preciso uma educação sentimental e urbana.
Saiu um livro de Rosa Freire D'Águiar ("Sempre Paris - Crônica de uma cidade, seus escritores e artistas", da Companhia das Letras), que permite penetrar numa fresta histórica e enxergar Paris e sua relação com o Brasil nos anos 1980.
É pouco. Mas é um bom começo.
Rosa foi jornalista da extinta Revista Manchete no seu apogeu e esposa do ex-ministro da Cultura e economista paraibano Celso Furtado.
Ela começa o livro descrevendo sua chegada no antigo aeroporto de Orly. E conta as agruras do primeiro endereço no Hotel San Michel. A cearensada que morou lá depois, como eu, deve estranhar a descrição do Hotel. É que uma estrela na rua Cujas, bem na entrada da Sorbonne, virou um quatro estrelas inacessível para nós bolsistas.
A partir daí, ela descreve num paralelo à cidade nos anos 1980 - fim do Gaullismo e ascensão de Valéry Giscard D'Estaing - e o Brasil da ditadura Figueiredo e Geisel.
Rosa conta a Paris das livrarias da Rive Gauche. A velha PUF, Presse Universitaire de France e a Gibert Joseph. Os cafés, como se comportar, o que pedir e como pedir.
A criação do centre Georges Pompidou. A nova estética que nascia naquele momento. Tudo entrelaçado com as vergonhosas visitas de nossos generais presidentes até a volta dos exilados. Para concluir este pórtico, ela resenha algumas matérias sobre os dez melhores restaurantes daquele tempo e suas boas histórias.
Rosa Freire não se furta a falar sobre seu marido morto, o grande Celso Furtado, professor de economia da Sorbonne por vinte anos. Ela ressalta o carisma e a inteligência, mas também a retidão e a humanidade.
Essa introdução é uma espécie de grande painel de apresentação da cidade nos anos 1970 e 1980.
A partir daí, ela reproduz as grandes entrevistas que fez com os personagens daquele tempo: Alain FinkielKraut, Elizabeth Badinter, Fernand Braudel, Júlio Cortazar, Michel Serres, Roland Barthes entre outros.
O livro é muito bem escrito e abre uma porta da cidade que entramos com muito prazer.
O problema é que Paris da segunda metade do século XX teve duas grandes fases áureas: os anos cinquenta do existencialismo sartriano e os gloriosos anos Mitterrand (81 até 95). O livro pega apenas o começo dos tempos Mitterrand.
Os personagens entrevistados no livro não têm reflexões brilhantes. Alguns deles sucumbiram ao tempo. Alain Finkielkraut, por exemplo, é hoje um reacionário anti-imigração, por exemplo. E o que Cortázar estava preocupado naquele tempo, a ditadura argentina, não é o melhor do seu pensamento.
Enfim, o livro vai maravilhosamente até a página 120. Depois tudo é dispensável.
Leiam. São 120 páginas de uma introdução a Paris que nos traz muito prazer.
A USP que ainda
merece respeito
Se a cada dia que passa as ideias sobre patrimonialismo e sobre a Semana de Arte Moderna parecem mais páginas de propaganda da tal exceção paulista (que tenta nos convencer que São Paulo é melhor porque trabalha mais) deixadas originalmente por Sérgio Buarque, alguns raros pensadores sobrevivem à derrocada geral.
Robert Schwarz, o grande pensador de cultura da USP (e não António Cândido, como a maioria pensa) foi entrevistado pela excelente revista da editora Boitempo, Margem Esquerda. Para quem quer entender alguma coisa da cultura brasileira ainda (precisamos fazer uma alfabetização cultural no nosso campo) é uma excelente pedida.
Swartz, como velho e bom marxista, mostra que para transformar o Brasil é preciso saber interpretá-lo, seja por qual forma for.
Os Africanos, os
mouros e os orientais
de Goa na cabeça
de Marcelo Rebelo
de Sousa
O presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, disse na terça-feira que Portugal foi responsável por crimes cometidos durante a escravidão transatlântica e a era colonial, e sugeriu a necessidade de reparações.
Portugal traficou quase 6 milhões de africanos, mais do que qualquer outra nação europeia, mas até agora não conseguiu confrontar seu passado e pouco se ensina sobre seu papel na escravidão transatlântica nas escolas.
Falando em um evento com correspondentes estrangeiros, Rebelo de Sousa disse que o atual primeiro-ministro português Montenegro tem "comportamentos rurais" e o ex-primeiro-ministro António Costa era "lento" por ser oriental.
As duas falas de Marcelo Rebelo dizem tudo das elites portuguesas: elas querem passar por uma atualização mínima (reconhecer a escravidão colonial) mas continuam achando que quem teve contato com os mouros (Montenegro) ou foi criado em Goa e teve contato com povos orientais (António Costa) não pensam muito bem.
Dragão aos 25
O Centro Dragão do Mar está completando 25 anos.
Quando me perguntam o que ele precisa, tenho que repetir para o que ele foi criado:
1. Ser uma grande escola de formação e exercício das atividades artísticas.
2. Ser um centro de debates e elaboração do pensamento produzido no Ceará em confronto permanente com o que aqui chega.
3. Ser um centro de inovação de alto repertório de arte e cultura.
Alguém aí ouviu falar com formação, pensamento e inovação no Dragão nos últimos anos?
Vejam, não é culpa de quem está lá. Estão lutando bravamente…
Nunes ou o caos
José Nunes, indicado pelos italianos da bagunça Enel para salvar o contrato da empresa do Ceará, é de fato a última réstia de esperança para a empresa.
José Nunes, além de gentleman e extremamente competente, é formado pela UFC e se criou na antiga Coelce, uma empresa pública que superou dificuldades e se tornou num celeiro de bons quadros.
Está na hora de mostrar como nossas instituições - nem chamo de empresas - públicas como Banco do Nordeste, Coelce, e mesmo a Cagece formaram quadros de grande excelência. Quando ouço essa extrema-direita falar das empresas públicas com desprezo, tenho gana de enfiar o caso Enel goela abaixo. Vejam o que era a Coelce e observem no que se transformou a Enel.
Menos imposto para
quem trabalha
com bens simbólicos
A reforma tributária que o Ministro da Fazenda Fernando Haddad apresentou têm alíquotas reduzidas em até 30% para profissionais que trabalham com prestação de serviços de natureza científica, intelectual, literária ou artística, desde que sejam submetidos a fiscalização por conselho profissional.
Num país que historicamente trata mal quem trabalha com a inteligência, é uma grande notícia.
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