
Paulo Sérgio Bessa Linhares é um antropólogo, doutor em sociologia, jornalista e professor cearense
Paulo Sérgio Bessa Linhares é um antropólogo, doutor em sociologia, jornalista e professor cearense
Walter Moreira Salles, o dono do primeiro Oscar brasileiro, é um velho conhecido do audiovisual cearense.
O trio Karim Aïnouz, Sérgio Machado e Marcelo Gomes - que me ajudou a desenhar o projeto de formação em audiovisual na sua segunda fase, na primeira foram Orlando Senna e Maurice Capovilla - tem uma parceria afetiva e profissional com Walter Salles de muitos anos.
Sérgio fez direção de elenco e assistência de direção em três filmes de Salles: "Central do Brasil" (1999), "O Primeiro Dia" (1999) e "Abril Despedaçado" (2001). Em "Abril Despedaçado", Sergio foi roteirista. Walter Salles foi produtor de quase todos os longas de Sérgio.
Karim iniciou praticamente sua carreira como roteirista de "Abril Despedaçado" e goza da intimidade da família a ponto de ser chamado para as reuniões anuais dos dois irmãos da cultura, nas quais eles fazem um balanço das ações e investimentos e decidem o que vão fazer nos próximos anos.
Com uma fortuna estimada em R$ 26,4 bilhões, segundo o ranking de bilionários brasileiros da revista Forbes, Walter Salles Jr. é hoje o 11º homem mais rico do Brasil, empatado com o irmão João Moreira Salles, diretor de documentários como "Notícias de uma guerra particular" (1999) e "Santiago" (2006), e fundador da revista Piauí e do instituto de apoio à ciência Serrapilheira. A família tem ainda o Instituto Moreira Salles (IMS) na área cultural.
Waltinho e João já vieram diversas vezes ao Ceará participar de eventos e apoiar projetos cearenses. Das 12 pessoas mais ricas do Brasil atualmente, quatro são filhos de Walther Moreira Salles: os irmãos Fernando, Pedro, João e Walter Salles Jr.
Para entender os filhos, é preciso conhecer um pouco da história do patriarca e avô João Moreira Salles e do pai Walther Moreira Salles - diplomata, banqueiro e empresário de diversas atividades.
João Moreira Salles (1888-1968) nasceu em Cambuí, no Sul de Minas Gerais, filho de agricultores. Em 1918, ele se mudou para Poços de Caldas (MG), onde criou a Casa Moreira Salles, atuando como comerciante e correspondente bancário — agente que, na falta de banco no local, exercia parte de suas funções.
Em 1933, Walther Moreira Salles — um dos seis filhos do patriarca, dois morreram na infância — entrou como sócio na casa bancária, enquanto o pai mudou para Santos e passou a se dedicar mais de perto aos negócios de café.
Walther se formou em Direito na faculdade do Largo São Francisco em 1936 e, já à frente dos negócios, liderou uma fusão da Casa Bancária Moreira Salles com outras duas instituições financeiras da região, criando em 1940 o Banco Moreira Salles, com sede em Poços de Caldas, que se tornaria no futuro o Unibanco, depois vendido para o Itaú.
O jornalista Luiz Nassif tem uma boa biografia sobre o fascinante diplomata e empresário chamada "Walther Moreira Salles: O banqueiro-embaixador e a construção do Brasil" (Cia. das Letras, 2019).
Nassif conta que "Poços de Caldas naquele período era como se fosse uma capital do Brasil nas temporadas de veraneio", e, a partir de lá, Walther criou uma fantástica rede de relações com as principais autoridades federais e empresários paulistas. Walther namorou a filha de Getúlio Vargas, e quando foi para os Estados Unidos, Walther criou uma forte relação com a família Rockefeller, de quem até se tornaram sócios. Sua rede de relações levou Walther a também exercer uma série de cargos públicos ao longo dos anos.
Passou pelo Banco do Brasil, Ministério da Fazenda e foi embaixador em Washington, servindo sob quatro ex-presidentes: Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart.
Muita gente pensa que a família é dona do Itaú. Na verdade, eles têm 33% do banco, que é controlado pela família Setúbal. E, hoje, o grande negócio dos Moreira Salles foi o investimento em um mineral que até então ninguém sabia para que servia: o nióbio.
O nióbio — hoje se sabe — é um metal de grande resistência e condutividade. Utilizado na produção de um décimo de todo o aço do mundo, ele melhora a qualidade da liga, sendo aplicado no setor automotivo, aeroespacial, de construção, em baterias e em equipamentos de saúde.
"É um caso único. Eles encontraram esse mineral no subsolo, que não tinha mercado, pesquisaram para o que aquilo serviria, desenvolveram as aplicações e os produtos — o ferronióbio, os óxidos de nióbio —, e agora estão trabalhando nas baterias elétricas de recarga rápida. É uma grande verticalização", destaca Aline Nunes, gerente de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) em entrevista para BBC News.
Os Moreira Salles detêm 70% da CBMM (empresa que explora o nióbio).
Mas a teia de investimentos do grupo não termina aí. Ela é complexa e inclui a participação de cerca de 33% no Itaú Unibanco e dos 70% da CBMM, o controle da Cambuhy Agrícola, produtora de laranja e, em 2017, a família também comprou o controle da Alpargatas, dona das sandálias Havaianas.
Waltinho e João não falam em dinheiro. Este trabalho, na família, é feito pelos irmãos Pedro e Fernando. Se você quer conversar com eles, tem que ser sobre cinema, literatura, educação.
O que me faz lembrar uma historinha que uma amiga me contou recentemente. Ela combinou um café com João Moreira Salles, em Paris, onde ela concluiu um doutorado, e saiu de casa com dinheiro contado, o do metrô e três ou quatro euros para o cafezinho. A conversa transcorria muito boa, mas, de repente, João recebeu um telefonema e teve que sair às pressas.
A amiga, então, percebeu que ficou com a conta de dois cafezinhos e teve que voltar a pé, cantando amor febril, como dizia meu pai (nunca entendi o que significa esse negócio de cantar amor febril).
Pois é, como observou o escritor americano F. Scott Fitzgerald, os ricos são diferentes de você e eu. Claro, digo eu, nunca recebem aqueles emails com a frase: problemas na cobrança.
David Rockefeller, que criou o Museu de Arte de Nova Iork (Moma) e a Universidade de Chicago, comprou uma fazenda no Mato Grosso com Walther Moreira Salles, onde caçavam onças, costumava dizer que quando se reunia com empresários ninguém falava em dinheiro. Já quando se encontrava com artistas e intelectuais, eles só falavam em grana.
Enfim, João e Walter são dois caras inteligentes, cultos e muito sensíveis. O curioso é que apesar de não falarem em dinheiro eles puxaram o pai. "Ainda estou aqui" custou R$ 45 milhões. Apenas o aluguel daquela casa da família foi mais de R$ 1 milhão. E, até agora, o longa já arrecadou R$ 104 milhões em renda. O filme, é bom que se diga aos bolsonaristas, não usou um centavo de lei federal, e deu lucro. Acho que Waltinho pagou a produção toda com seu cartão de crédito - para desespero do Eduardo Bolsonaro.
O CÉU AINDA ESTÁ LONGE.
Saiu uma pesquisa Atlas/Intel sobre a popularidade dos ministros do Lula. E ela traz notícias importantes. Vamos por partes. A pesquisa foi realizada entre 24 e 27 de fevereiro. O levantamento apontou Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) como a mais bem avaliada, com 62% de aprovação. Mauro Vieira (Relações Exteriores) e Macaé Evaristo (Direitos Humanos) vieram na depois, ambos com 54%.
Camilo Santana (Educação), apesar de liderar programas de visibilidade como o Pé-de-Meia, ficou em 16 entre os ministros mais bem avaliados. O nordestino mais bem avaliado foi Wellington Dias, do Desenvolvimento Social (leia-se: Bolsa Família).
Minha AOC (análise, opinião, crítica): Camilo ainda não tem índice de conhecimento. Tebet se beneficiou de sua lembrança como candidata a presidente. Um ministro nordestino, por mais que tenha força no seu estado de origem, precisa de muita visibilidade no Sudeste/Sul ou um programa popular para ter seu nome massificado. Ah, mas o Wellington Dias também é nordestino e não foi candidato a presidente. Mas tem o Bolsa Família.
O que a pesquisa mostra é que Camilo tem que subir muito para chegar perto do céu. Entre os obstáculos estão: o preconceito contra nordestinos; seu índice de conhecimento; e associar seu nome a programas que tenham centralidade na estrutura familiar. Imaginar que sua popularidade no Ceará seria transposta diretamente para o Sul/Sudeste é ingenuidade
(ou burrice).
Para superar o primeiro obstáculo sugiro ler o livro do Jessé (Pobre de direita). Para o segundo, trabalhar visibilidade fora dos nichos geográficos. E quanto à centralidade: creche e educação de tempo integral. Ou seja, para ir pro céu sem morrer, melhor ficar no Senado, como dizia Virgílio Távora.
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