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Quantas vidas custam um teste político?
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Rachel Gomes é jornalista, mãe da Serena e da Martina e produz podcasts de maternidade há cinco anos. Em 2022, deu início ao MamyCast, primeiro podcast de maternidade do Ceará, onde aborda pautas informativas sobre maternidade, gestação e infância

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Quantas vidas custam um teste político?

É uma vitória do conservadorismo de papel, que finge proibir o aborto ferrenhamente, mas que fecha os olhos para os inúmeros procedimentos ilegais que sempre ocorreram e sempre vão ocorrer no Brasil
Tipo Opinião
Gravidez na adolescência (Foto: FÁBIO LIMA)
Foto: FÁBIO LIMA Gravidez na adolescência

Ser mulher no Brasil é um risco e a frase já está tão batida, que soa como um clichê. Só de nascer mulher, a sua vida já vai ser naturalmente mais difícil e mais arriscada. Agora, se você for mulher e criança ao mesmo tempo, os riscos são ainda maiores.

Os números não me deixam mentir: segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, mais de 60% das vítimas de estupro no Brasil têm até 13 anos e mais de 70% dos agressores são conhecidos das vítimas. Pai, avô, tio, irmão, vizinho. É muito mais comum do que se imagina.

E agora, algo igualmente ou ainda mais violento pode ser regulamentado no Congresso: o PL 1904/2024, que iguala a pena do aborto feito após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples. Na prática, crianças que forem vítimas de estupro e não identificarem a gravidez antes das 22 semanas (o que é muito comum e possível, principalmente as mais vulneráveis), terão de seguir com a gravidez, por mais arriscado e indesejado que isso seja para a sua vida. Caso optem por interromper a gravidez, poderão pegar uma pena igual ou maior do que o agressor que lhes causou a violência sexual.

Na linguagem mais didática e simples, é uma maneira de minar o aborto no Brasil de maneira radical e brutal, sem considerar contextos históricos e sociais. É uma vitória do conservadorismo de papel, que finge proibir o aborto ferrenhamente, mas que fecha os olhos para os inúmeros procedimentos ilegais que sempre ocorreram e sempre vão ocorrer no Brasil. A diferença é paga com a vida dessas gestantes. Quem tem dinheiro, tem menos chance de morrer. Simples e duro assim.

A justificativa vexatória dos autores (33 deputados, a maioria do PL) é bem objetiva e previsível: política. A ideia é testar o governo sobre o tema, já que na campanha presidencial de 2022, Lula afirmou ser contra o aborto.

Caso o PL prossiga, mesmo com toda a polêmica em torno, eu os questiono: quantas vidas e destinos irão pagar esse teste político na guerra de egos do Congresso?

 

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