Professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFC, é especialista nas áreas de História da Arquitetura e do Urbanismo, Teoria de Arquitetura e Urbanismo, Projeto de Arquitetura e Urbanismo e Patrimônio Cultural Edificado. Escreve para o Vida & Arte desde 2012.
Meu nome é José, Zé para os chegados. Ou Joe, como sou (era) conhecido por aqui. Há três horas estou em pé nesta fila, com mulher e filho na mesma situação, aguardando o embarque na aeronave do governo dos EUA com destino ao Brasil. Ninguém nos informou ainda o local de chegada, talvez Belo Horizonte, já que muita gente de Governador Valadares veio para cá. À nossa volta, como cães de guarda, militares armados até os dentes e com a cara de pouquíssimos amigos. Nunca esperei ter que passar por isto, apesar de saber que poderia acontecer a qualquer momento. Imigrante ilegal é fogo, principalmente agora quando somos criminalizados. Minha mulher chora baixinho, meu filho parece não compreender o que ocorre. A enorme porta traseira do avião se abre.
Nasci em Fortaleza, no Pirambu, no ano de 1990. Nunca gostei do Brasil, do Ceará e da cidade onde vim ao mundo. Pobre, com cara de índio, amorenado, era sempre visto com desconfiança pelas pessoas. Comecei cedo a dar duro, fiz de um tudo. Sempre admirei meus patrões, mesmo sendo todo dia humilhado por eles. Jamais dei valor, é verdade, àquela esquerdalha comunista que ficava na porta da fábrica falando de mais valia e exército de reserva. Quando a Dilma foi eleita, disse: "Já deu para mim, dois governos do sapo barbudo e agora vem essa mulher". Decidi ir para a terra do Tio Sam. Juntei uns trocados e me mandei. Entrei pela fronteira mexicana. Foi dureza, mas consegui. Acabei no Queens, em New York. Aqui fui faxineiro, entregador de pizza, lavador de carro, yes, biscates.
Conheci uma venezuelana, Rosario, moradora do mesmo bairro e também ilegal, numa festa no Bronx. Decidimos viver juntos num cortiço na área central, onde a polícia dava batida diariamente atrás de viciados e traficantes, barra pesada total. Vivia sem dinheiro, mas nunca passei fome. Melhor ser livre para fazer o que quiser do que viver em um país dominado pelo marxismo. Hoje lá, com toda certeza, seria chamado de pobre de direita. Oh, my God, fuck anyone who thinks like that! Passado um tempo após a minha chegada, não conseguia aprender a língua local e estava esquecendo a minha. Hoje domino bem o inglês, mas terei que dar conta do português novamente, it's life, right? Em 2015, nasceu nosso filho Bob, nossa sonhada garantia de ficar aqui. Agora estamos dentro do avião.
Na hora que o asa-dura levantou vôo, Rosario chorava feito criança, com Bob tentando consolá-la. Tememos ser separados pela diplomacia norte-americana quando chegarmos ao Brasil e ela ter que voltar à sua terra natal, dominada pelo ditador Maduro. O jus soli a que Bob tinha direito, babau. Mesmo não podendo votar e apesar do que estou passando, sempre idolatrei o Trump, o cara que, se pudesse, gostaria que fosse presidente eterno dos EUA. Sua parceria com o Musk, o Bezos e o Zuckerberg fará a América grande de novo. Quando chegar ao Brasil vou me ajuntar aos bolsonaristas. Será que ainda estão acampados nas portas dos quartéis? Temos que colocar o Mito de novo no poder. Súbito, somos informados que o avião teve um problema e vai pousar em Manaus. Shit!
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