
Psicóloga e psicanalista
Psicóloga e psicanalista
Faço parte dos 50,38% da população da nossa capital que disse sim à democracia no último domingo, depositando na urna um não aos discursos de ódio nas suas mais diversas nuances. Venceu Eros. Venceu a possibilidade de sustentarmos laços, vínculos e a perspectiva de um amanhã menos sombrio. Venceu Dionísio, o deus do coração, do falo, de tudo o que é vida, palpitação, jorro, intensidade, porque a experiência dionisíaca é eminentemente civilizadora.
Vencemos, mas ao mesmo tempo, a constatação de que praticamente a outra metade da população acredita em: "dane-se o feminicídio", é lastimável. Vencemos, mas assistir a orgia de candidatos derrotados e ressentidos aliarem-se a discursos fascistas, é desolador. Certamente reside aí boa parte do fascínio que tais discursos conseguem capturar. O cidadão identifica-se, por exemplo, com um sujeito que faz um vídeo maltratando um animal, explicitando a ferocidade humana, a face noturna da nossa humanidade, como nos disse Michel de Certeau. Como disse Guilherme Boulos é o pensamento coxinha primário que tem infestado o debate político atual substituindo argumentos por xingamentos, transformando insuficiência em insulto.
Em um vídeo que circulou nas redes sociais nas vésperas da votação no segundo turno, uma empreendedora social explicitou sua lucidez ao alertar acerca do que poderia significar o voto em um candidato que desdenha de dados estarrecedores no que diz respeito ao feminicídio. Os efeitos desse vídeo demarcam que precisamos lutar pela construção de novos projetos civilizatórios, por um mundo menos desigual, que é urgente insistirmos em convocar quem quiser estar junto no time do conhecimento, da ciência, da arte e não da barbárie, da ignorância, da misoginia dos santinhos do pau oco e sua onda conservadora apelativa.
Vencemos porque ainda somos uma intrusão incômoda que resiste diante do ressentimento de muitos. Como já disse aqui mesmo anos atrás, enquanto estivermos prisioneiros de mundinhos particulares, enquanto a estupidez, a ignorância e a credulidade acrítica persistirem; enquanto os discursos de ódio às diferenças, a brutalidade e o caráter pandêmico do rebaixamento radical do que entendemos por civilidade forem a regra, o tecido social continuará se desintegrando.
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