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O choro de quase três mil mães de filhos assassinados no Ceará
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Sara Oliveira é repórter especial de Cidades do O Povo há 10 anos, com mais de 15 anos de experiência na editoria de Cotidiano/Cidades nos cargos de repórter e editora. Pós-graduada em assessoria de comunicação, estudante de Pedagogia e interessadíssima em temas relacionados a políticas públicas. Uma mulher de 40 anos que teve a experiência de viver em Londres por dois anos, se tornou mãe do Léo (8) e do Cadu (5), e segue apaixonada por praia e pelas descobertas da vida materna e feminina em meio à tanta desigualdade

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O choro de quase três mil mães de filhos assassinados no Ceará

Os assassinatos se tornaram parte da rotina cearense, infelizmente. Na produção de notícias, em meio a tantos casos, é preciso escolher qual homicídio ganhará mais destaque, diante do contexto social, das condições do crime e suas repercussões
Homicídio registrado em Messejana  (Foto: via WhatsApp O POVO )
Foto: via WhatsApp O POVO Homicídio registrado em Messejana

Você já parou para pensar nas 2.983 mães que choram as mortes dos filhos assassinados no Ceará em 2024? As dores sobre as tantas mortes que fazem do Estado um dos mais violentos do País acabam sendo encobertas por ocorrências policiais, o domínio das facções criminosas e a mensagem cínica de que "bandido bom é bandido morto".

"Nenhuma mãe cria filho para ser bandido. E mesmo quando é bandido, tem mãe, tem família, que chora pela morte". A frase é de uma mãe, de 65 anos, que buscava notícias sobre os filhos que moram em Boa Viagem, no interior do Ceará.

Foi lá que uma abordagem policial acabou com um PM baleado na cabeça. Em menos de 24 horas, parte da cúpula da segurança pública do Ceará foi para a cidade, distante 221 km de Fortaleza. Poucas horas depois do crime, uma dupla, de 25 e 28 anos, suspeita de envolvimento na ocorrência, foi morta.

A mulher mandava mensagens aos parentes e falava sobre como conseguiu manter os filhos fora de ações criminosas, as dificuldades, os pedidos a Deus, os medos, a sorte. A empregada doméstica assistia ao jogo de futebol do filho da patroa enquanto mostrava as fotos dos corpos e alertava: "esse morreu de olho aberto, é porque vai ter mais morte".

Ela estava certa. Não só sobre o caso de Boa Viagem, mas sobre o fato de assassinatos se tornarem algo que já faz parte da rotina cearense, infelizmente. Na produção de notícias, em meio a tantos casos, é preciso escolher qual homicídio ganhará mais destaque, diante do contexto social, das condições do crime e suas repercussões.

Estudantes mortos ao sair da escola, no meio da rua. Mãe assassinada dentro de casa por denunciar o desaparecimento da filha. Triplo homicídio em um bar, tentativa de chacina em outro. Irmãs mortas a tiros em um dos bairros mais violentos da Capital.

As informações disponibilizadas pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) sobre as ocorrências que somam os quase três mil corpos não informam muito mais do que o local da morte e a arma utilizada.

Em muitas das falas de gestores e policiais de alta patente, a indicação de que as mortes são oriundas de "guerra entre facções" tenta quase justificar que aquele indivíduo morreu "porque estava envolvido".

As notas policiais destacam antecedentes criminais - inclusive durante a adolescência -, e a tipificação dos crimes não contempla situações específicas, como os feminicídios em contexto de violência urbana. O discurso das autoridades, onde o "não admitiremos" e "Polícia entra em todo lugar" parece lidar com uma realidade paralela em que só os números importam. E não aquela em que mães perdem seus filhos, filhos perdem seus pais, pessoas perdem seus familiares. n

 

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