Veneno jogado sob plantações, varandas, vidas e corpos no Ceará
Sara Oliveira é repórter especial de Cidades do O Povo há 10 anos, com mais de 15 anos de experiência na editoria de Cotidiano/Cidades nos cargos de repórter e editora. Pós-graduada em assessoria de comunicação, estudante de Pedagogia e interessadíssima em temas relacionados a políticas públicas. Uma mulher de 40 anos que teve a experiência de viver em Londres por dois anos, se tornou mãe do Léo (8) e do Cadu (5), e segue apaixonada por praia e pelas descobertas da vida materna e feminina em meio à tanta desigualdade
Veneno jogado sob plantações, varandas, vidas e corpos no Ceará
Em dezembro último, a Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) aprovou outro Projeto de Lei, o de nº 1075/23, que permite a pulverização de agrotóxicos através de drones. Apenas cinco anos depois de ela própria proibir a pulverização aérea, por aviões
"Quando batia o vento, vinha tudo pra cima de quem tivesse dentro. Tinha um que cheirava igual hortelã, cheiroso, esse aí é que era perigoso". A frase é do agricultor Juvenal (nome fictício). Ele falava sobre o uso de agrotóxico em uma empresa de fruticultura na Chapada do Apodi, quase divisa entre o Ceará e o Rio Grande do Norte.
O relato foi publicado no caderno Ciência & Saúde, do O POVO, em 30 de julho de 2018. Matéria discutia o Projeto de Lei 6.299, que flexibilizava as regras existentes no Brasil sobre o uso de pesticidas.
Em dezembro último, a Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) aprovou outro Projeto de Lei, o de nº 1075/23, que permite a pulverização de agrotóxicos através de drones. Isso, apenas cinco anos depois de a própria Alece proibir a pulverização aérea, por aviões, através da Lei 16.820/19, conhecida como Lei Zé Maria do Tomé, agricultor e líder comunitário que atuou contra a prática e foi assassinado em abril de 2010.
Quando fui à Chapada do Apodi, em 2018, ouvi relatos de pessoas que apresentaram casos de puberdade precoce, infertilidade e doenças genéticas. Foi quando encontrei Seu Juvenal, trabalhando na própria lavoura. Era fim de tarde e ele detalhava, enquanto aguava as plantações, os motivos que o fariam não usar pesticidas nas suas plantações de banana pacovan.
"Eu via que o 'caba', quando a gente ia almoçar, ele não almoçava. Os outros já diziam que era o veneno, matando devagarinho", contava, descrevendo as histórias sobre casos de câncer dos colegas de trabalho.
Lembro de ouvir Patrícia (nome fictício) explicar que a filha tinha pelos na vagina, mostrando os exames dela, da criança e do marido, que confirmavam a presença de compostos de agrotóxicos.
O sítio onde ela morava há 10 anos jogava inseticida nas plantações através de um trator, no método conhecido como expurgo. "Tudo isso aqui ficava branco de fumaça, sei lá, de aguazinha", contou Patrícia, apontando da varanda de casa.
Questionado diversas vezes sobre apoiar a pulverização por drones, o governador Elmano de Freitas (PT), que foi coautor da Lei Zé Maria do Tomé, repetiu que preferia que a pulverização fosse feita pelo equipamento do que por uma pessoa. Ressaltando que haverá menos uso do "costal", uma mochila como aquelas armas que se vê em filme futurista, com carga infinita nas costas.
Não há, porém, nenhuma garantia que, usando-se o drone, não se use o costal. Não há nenhuma garantia de que o veneno não continuará sendo jogado sob as plantações, atingindo a varanda, a vida e os corpos dos trabalhadores rurais no Ceará.
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