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Até carro-pipa veio ajudar no banho de Juçara
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Jornalista, compositor, escritor, humorista, cantor e pesquisador da cultura popular. Escreveu várias composições em parceria com Falcão. É autor do livro

Tarcísio Matos arte e cultura

Até carro-pipa veio ajudar no banho de Juçara

O exagero do cearense legítimo prejudica. Tudo que é demais da conta lasca, mas o caso do perfume e da beleza de Juçara, sempre muito asseada, é emblemático, se aludimos à característica nossa de tudo multiplicar por dez ao quadrado, vezes 20 vezes até o infinito. Para melhor ilustrar, vide o caso do mulheril menos abonitado da comunidade onde se deu o presente episódio. Haja confusão. Morrendo de inveja dos predicados naturais de Juçara, 15 senhoras da igreja providenciaram cortar o mal pela raiz.

- Que mal? Que houve de tão cismativo nessa garota para provocar a ira das senhoras?

- Não foi o sestroso rebolado, tampouco o rosto angelical. O que lascou religiosas era a donzela sempre muito asseado, bem banhadinha, cheiro de lavanda por onde passava - informa J. Crocodilo Maria, testemunha do fato, que tem detalhes.

- A pele limpa e o cabelo arrumado de Juju arrasavam, estocando as senhoras.

- Entendi, o ciúme delas disparou a peleja.

- Na verdade!

Eis que, súbito, o macharal do Arraial passou a observar de mais perto o desabrochar da mulher que até há pouco habitava a inocência da menina Juçara. E as esposas dos "caba véi" ficaram em pé de guerra. O nome de Juçara era mais comentado que o dia de liberação do Bolsa Família reajustado em 50%. Crocodilo também sofreu: "Carmosa, minha nega, também se invocou comigo, logo eu, que até pra urinar hoje em dia dou trabalho. Tu precisava conhecer Juçara! Ah mulher mais ou menos aquela!"

- Onde a gota d'água da querela, Jota? Por Santo Antônio da Saboneteira, me fale!

- A insegurança doméstica das 15 donas de casa fê-las ir à prefeitura reclamarem-se.

- Precisamente de que?

- Do açude que tava secando!!!

Dos encantos de Juçara a incomodarem, do perfume de virar a cabeça do cristão desprevenido, do andar "rebolativo" da moçoila, até aí dá pra entender a antipatia das reclamantes, mas, o açude secando...

- Estávamos num período de seca.

- Sim, reservatórios pedindo penico...

- As senhoras da igreja foram enredar ao prefeito, dizer que Juçara gastava um açude e meio só num banho!

- Nossa Senhora dos Encardidos! E o gestor municipal?

- Ligou na hora pra Defesa Covil e pediu 15 carros-pipas!

O exemplo arrebata!

A cidade inteira sabia que Justino era morto e vivo no cabaré Lagarta Pintada. "Quenga e cachaça eram o barato dele", afirmavam. Que fazer pra retirá-lo de lá? Prejuízos manifestos já rolando em casa, para tormento da mulher e dos filhos. Desperdício de saúde e dinheiro, moral lá para baixo, o péssimo exemplo que dava. Todos já haviam tentado fazê-lo sair daquilo, ninguém conseguia. O escritório de Justino era a zona.

- Nem o papa tira ele dali! - reclamava-se a esposa sofrida. - Tem mais jeito não! Entreguei os pontos...

- Posso fazer uma tentativa, Dinaura? - ofereceu-se padre Zé Mário.

- Quem, pelo amor de Deus, para consertar o carga torta? Me fala, padre!

- O Dr. Moacir! É muito amigo de seu
marido! Um santo! Ou é no trabalho, ou na academia em casa ou na igreja. Uma pomba sem fel.

- Pois fale com ele, urge resgatar essa alma do inferninho!

Zé Mário, o pudico, o imaculado, espera Justino sair do lupanar e o aborda, solene.

- Querido amigo! Por nossa amizade, te peço: largue mão do cabaré e volte pra casa. Do fundo do coração, me atenda.

- Ok, beleza. Mas tem uma condição: fale com o seu irmão Jurandir, que é morto e vivo comigo no cabaré. Se ele sair, saio também!

 

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