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Comer e pensar a ceia do Natal
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Antropóloga, pesquisadora de culturas alimentares, doutoranda UFBA e Coordenadora de Cultura Alimentar e Pesquisa da Escola de Gastronomia Social Ivens Dias Branco

Vanessa Moreira gastronomia

Comer e pensar a ceia do Natal

Tipo Opinião
Comida natalina ativa status social, memória e cultura  (Foto: TATJANA BAIBAKOVA/adobe stock)
Foto: TATJANA BAIBAKOVA/adobe stock Comida natalina ativa status social, memória e cultura

Datas comemorativas com a função de celebrar um fato importante social e historicamente, como Natal, Réveillon e Festa Junina, e que acontecem há séculos, acionam muitas instâncias vividas, que interagem com religiões, mitos, agricultura, organização dos tempos, política, moral, turismo e trabalho. Esses fatores certamente definem as práticas alimentares vividas para cada situação especial.

A ceia do Natal no Brasil, como costumamos nomear o banquete preparado para ser comido no dia 24 de dezembro, dia marcado pelo nascimento de Jesus Cristo, é representada atualmente por peru, pernil, tender, chester, salpicão, panetone, muitas passas e acompanhamentos que variam conforme a região. Como a cultura não está parada no tempo, essas preparações se mantêm ou foram ganhando espaço à mesa porque têm grande adesão, são encontradas com facilidade em qualquer mercado e possuem receitas difundidas. O sucesso é tão grande que a gíria "R.O.", que significa "resto de ontem", se popularizou, criando mais um dia no calendário para se comer comida de Natal.

O peru faz parte da ceia natalina de muitos países. Vários pesquisadores da alimentação acreditam que a grande produção nos Estados Unidos e no Canadá de uma ave grande, associada à fartura, reverberando uma prática asteca difundida na Espanha, transformou as aves grandes no desejo de consumo no mundo. Na França, onde o inverno está no ápice, juntamente com a produção de moluscos, o prato principal do banquete natalino se difere, sendo as ostras, acompanhadas de champagne, a representação associada à ceia.

Como toda comida ativa status social, a festa de Natal é também uma oportunidade de apresentar muitos símbolos. De repente, o Ceará tem uma oferta maior de tâmaras, damascos, espumantes, champanhes, queijos importados, bolos e doces que não fazem parte do dia a dia da maioria das famílias, mas tornam-se itens desejados e símbolos de um momento especial.

No Japão, a ceia de Natal tem características peculiares. Apesar de o Natal não ser uma tradição religiosa predominante naquele país, a data foi incorporada como uma celebração moderna, com destaque para o hábito de comer frango frito, especialmente da rede KFC. Esse costume, que começou nos anos 1970 como uma campanha publicitária, associou o frango frito ao espírito natalino, conquistando o imaginário japonês. Além disso, o "Christmas Cake" (um bolo branco com morangos e chantilly) tornou-se outro ícone dessa festividade.

Essas diferenças culturais mostram que, em qualquer lugar do mundo, a mesa natalina refere-se ao que se come e com quem se come. Seja ao redor de uma mesa com peru e farofa, com ostras e champagne, ou com frango frito e bolo de morango, o verdadeiro sabor das festas está na alegria do encontro. Comer junto é celebrar a vida e os laços que nos unem, além da manutenção da identidade social e de pertencimento.

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