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Separação amorosa
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Zenilce Vieira Bruno é psicoterapeuta de adolescente, adulto e casal, especialista em educação sexual e membro da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. Escritora, é autora dos livros

Zenilce Bruno comportamento

Separação amorosa

O homem atual parece fragilizado ante o espetáculo do feminino acontecendo, doendo, mas rompendo cercos, quebrando modelos, desarrumando o castelo patriarcal. Há dores universais nas entranhas do ser mulher, há indignações nesse feminino ferido ancestralmente
Tipo Opinião

O sofrimento que se apossa no processo de separação é nutrido pelo imaginário que age contra, que volta a lembrar do que é preciso esquecer, que mantém a luta entre o desejo e a necessidade de libertação do outro. Monta-se um cenário que se impõe a memória como uma rede, um entrelaçamento de oposições e resistência à largada ao desvencilhar-se das pessoas. O aprisionamento se dá tanto pela lembrança positiva, como pela imagem duvidosa ou negativa. A agonia do abandono pela separação amorosa, de certo, nos remete a outros abandonos mais primários. A angústia da separação compõe a experiência humana desde o nascimento. Ela é, portanto, para cada um de nós uma emoção familiar, quase epidérmica. Mas ela nos assusta, porque sinaliza o caráter efêmero das relações humanas, a possibilidade da solidão tão temida. O doer amoroso que é tão intenso, pode perdurar como uma doença crônica ou pode possibilitar transformações de grande significação existencial.

Não há separação sem dor. Desde o corte umbilical, reagimos aos gritos. É assim que nascemos. É primal, pois, nossa relação com a angústia. A dor se revela inerente a todo processo de afastamento, por mais necessário que ele se apresente. Não fomos exercitados a compreender a separação como passagem para novos estados de vida. No entanto, a separação amorosa, como outras separações, repete a expulsão fetal do útero, em benefício da vida e do crescimento. Se não nascer, o indivíduo morre. Também, certas relações geram mortes, se as pessoas não enfrentam a possibilidade de separação. Sem exceção, a vida aponta para a aventura de partir ou ficar, mas tendo que inventar formas de não se negar, não se anular, não matar dimensões próprias que dizem do respeito que se tem por si mesmo.

A escuta clínica ainda aponta para uma espécie de fosso escavado entre o ser homem e o ser mulher. Um fosso que parece crescer na proporção em que cresce também a mulher. Isso parece ameaçar alguns homens que ainda não cresceram, que têm medo de crescer juntos, de uma comunhão mais profunda. O homem atual parece fragilizado ante o espetáculo do feminino acontecendo, doendo, mas rompendo cercos, quebrando modelos, desarrumando o castelo patriarcal. Há dores universais nas entranhas do ser mulher, há indignações nesse feminino ferido ancestralmente. Uma infinita inconformidade resulta desse distanciamento onde o masculino continua desejando a mulher em seus modelos viciados de patriarcalismos.

Fica um sentimento maternal pelas meninas desse tempo. Receio que elas se machuquem com o "ficar". Será que elas ficam para não se sentirem sós ou, quem sabe, "ficam", tentando algum vínculo? Tomara que não escrevamos com isto outra página doída da história feminina. De qualquer modo reconheço que ensaiam contatos, perdas, e antecipam separações. Receio esse sofrimento por entender que, na mulher, a sedução suscita-lhe sonhos de eternidade. Sofisticados jogos acordam-lhe a "Bela Adormecida", mas o príncipe mal lhe beija a testa, parece recear vê-la desperta, recua em seu gesto e foge da aventura de encontrar-se com a "bela acordada".

 

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