Com 22 anos de experiência na Guarda Municipal de Fortaleza (GMF), a inspetora Cristiane Fernandes foi escolhida para comandar a corporação durante a gestão do prefeito Evandro Leitão (PT). Ela é a primeira mulher a gerir a GMF em mais de 60 anos de existência. Ela foi empossada na quarta-feira passada, 22, na cerimônia de Passagem de Comando da GMF.
Cristiane já atuou no Pelotão de Ronda Preventiva Escolar (Rope) e na Coordenadoria das Inspetorias Cidadãs (Coinsp). Entre os anos de 2014 e 2016 foi auxiliar técnica da Cédula de Segurança Escolar da Secretaria Municipal de Educação. Em 2024 assumiu o comando da Guarnição Noturna da Corregedoria da Secretaria Municipal da Segurança Cidadã (Sesec).
Em entrevista ao O POVO, a nova diretora-geral compartilhou um pouco da sua experiência e dos desafios de ser a primeira mulher a comandar a GMF.
O POVO - Qual o peso de ser a primeira mulher a gerir a Guarda Municipal de Fortaleza?
Cristiane Fernandes - É histórico ter uma mulher no comando da guarda. É algo a se comemorar e ao mesmo tempo é uma reflexão do porquê isso causar tanto impacto. Não deveria causar, mas no contexto em que vivemos sabemos que causa sim um grande impacto. Ser escolhida é um reconhecimento de que a gente (mulher) tem capacidade sim de comandar a força de segurança. Eu comento que para as mulheres as barreiras são um pouco mais altas e para eu estar aqui como comandante é porque o meu esposo (que também é inspetor) tem essa noção da importância de a gente, tanto eu quanto ele, crescer profissionalmente. Eu tenho a parceria, esse suporte do meu esposo e é importante que os outros homens tenham essa visão de que a parceria tem que ser completa, não pode ser só pra um ou outro. É uma honra enorme estar em uma instituição que eu amo, que eu entrei e me encontrei.
A gente, que é inspetor, sempre almeja, se prepara para que no dia que chegarem (as oportunidades) estejamos preparados para isso, e eu tenho me preparado, tanto que eu fui escolhida, não que não tenha outros técnicos na instituição. Inclusive, quando eu passei a comandar o grupo operacional, outras mulheres começaram a ter comandos, tanto operacionais como de gestão mesmo, instituição. Boa parte do meu quadro de planejamento, e de jurídico, são mulheres. Vão ter inspetorias também comandadas por mulheres. É muito importante que a instituição tenha esse lado técnico, mas que esse lado técnico seja para todos, tanto homens quanto mulheres.
O POVO - No que se refere aos desafios de ser comandante, qual você acredita ser o principal?
Cristiane Fernandes - Uma coisa que percebi é que a Guarda Municipal tem 65 anos e ainda existe fortalezense que não sabe o que a GMF faz. Eu entrei na Guarda em 2003 sem saber o que a guarda fazia. Eu entrei com aquele pensamento de ser servidora pública e ter estabilidade, mas quando cheguei eu me encontrei: "É aqui que vai ser minha casa". Mesmo depois da gente já ter avançado muito com programas de ronda escolar, salvamento aquático, Controle de Distúrbios Civis (CDC), a gente ainda tem pessoas que não sabem o que a guarda faz.
O meu objetivo é que a guarda seja reconhecida não só pelo fortalezense, mas que seja referência no Brasil. As guardas municipais têm um papel muito importante dentro do sistema único de segurança, a gente tem condições sim de trabalhar e contribuir com a segurança pública de Fortaleza com qualidade, qualificação, prevenção, com ocupação de território, até porque a Cidade merece. Você merece estar numa praça sabendo que está protegido, levar seu filho para a escola sabendo que está protegido, acessar o posto de saúde sabendo que está protegido. A gente tem que voltar à cidade, por meio do Poder Público e políticas públicas, reocupar os territórios de Fortaleza.
O POVO - Qual seu posicionamento sobre a segurança por meio de drones? Acredita ser viável?
Cristiane Fernandes - Têm operadores de drones formados na Guarda Municipal de Fortaleza. A tecnologia é uma aliada fundamental para a área de segurança pública, porque a Cidade é grande e muito populosa. Você vai ter efetivo mas ele precisa ser otimizado através da segurança como videomonitoramento, boa comunicação, sistemas que possam gerenciar indicadores de onde a gente pode melhorar, onde a gente pode colocar mais guardas, onde podemos trabalhar melhor. O que eu digo muito: "Quando a gente não tem objetivo certo, serve qualquer caminho", mas a gente tem um objetivo e sabe onde aplicar o recurso humano, o recurso financeiro, o recurso material da instituição, então a tecnologia, o uso de drones, vai ajudar muito nisso. Em operações como o Réveillon ou outros grandes eventos, por exemplo, você está com o drone e a equipe de videomonitoramento fica localizando pontos para garantir que o efetivo chegue mais rápido no local que precisa de uma presença maior da instituição.
O POVO - Sobre a integração da GMF com as forças de segurança, tem algum diálogo ocorrendo?
Cristiane Fernandes - Para podermos fazer isso (utilizar os drones) precisamos trabalhar integrado, com outras políticas públicas do Município, porque a segurança não é só o guarda na rua, não é só a viatura na rua, ela também parte de uma boa iluminação em uma praça, ela parte de garantias de serviços públicos, poda, limpeza de territórios, serviços prestados. A segurança pública está integrada com as outras áreas da Prefeitura e o prefeito deixou isso muito claro, ele quer que as secretarias trabalhem juntas, que a gente consiga alinhar para deixar a cidade segura, também com outras forças de segurança, como a Polícia Militar e Polícia Civil.
O POVO - Uma frente de atuação da GMF é a Patrulha Maria da Penha. Além desta ação, há algum outro projeto previsto para proteção da mulher?
Cristiane Fernandes - Temos previsão de ampliar porque é uma política fundamental, a gente sabe que o Brasil e Fortaleza têm grandes números de feminicídio e precisa, sim, que a gente aumente. Também é preciso ter ações de conscientização, não só a patrulha em si. Digo que essa conscientização tem que ser em toda a sociedade porque não adianta empoderar a mulher se o homem não entende que é preciso esse espaço. Costumo brincar: "O Brasil diz que quer ganhar da Alemanha mas não combinou com a Alemanha", é importante que essa conscientização seja para todos e para as próprias mulheres, porque tem mulher que é machista e não se vê na situação, no ambiente.
O POVO - Como foi a escolha para ser comandante da GMF?
Cristiane Fernandes - A escolha para comandante da GMF foi técnica, houve uma entrevista com os inspetores para saber o histórico e capacidade técnica dos inspetores e dentro do novo desenho de gestão, como o prefeito quer fazer a segurança, o secretário entendeu que eu estava dentro do novo desenho de segurança municipal de Fortaleza. A gente vai trabalhar e passa tanto tempo junto que acabamos virando uma família. A minha sorte é que meu esposo também é inspetor da GMF. Nos conhecemos no curso de formação e depois que fomos nomeados começamos a namorar e vamos fazer 20 anos de casados. Nesse sentido ele me ajuda muito porque ele sabe como é o serviço, tive muita sorte e fui muito abençoada por ter uma pessoa que me entenderia.