O Ceará é a unidade da federação que mais degradou a área de restinga em 2022 e 2023. O Estado é líder na supressão dessa vegetação costeira, presente principalmente em dunas, pelo menos desde 2017. Os dados são do Atlas da Mata Atlântica, coordenado pela Fundação SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Segundo o levantamento, o Ceará ainda é um dos quatro estados com aumento no desmatamento de mata atlântica. Enquanto o Brasil teve uma queda de 27% no desflorestamento do bioma, Ceará, Piauí, Mato Grosso do Sul e Pernambuco foram na direção contrária. Foram 7 hectares (ha) desmatados no período de 2022 e 2023 no Estado, contra 6 ha na edição de 2021 e 2022 da pesquisa.
As áreas de restinga são parcialmente protegidas pela Lei da Mata Atlântica, já que são consideradas parte do bioma. O Ceará tem 56.818 ha de restinga arbórea. No entanto, 526 ha foram perdidos em 2022 e 2023. Houve redução de quatro hectares quando comparado ao período de 2021 e 2022. Entre as cidades do País que mais desflorestaram essa vegetação, a principal foi Itapipoca, no litoral Oeste, suprimindo 281 ha.
“O Ceará está passando por um movimento econômico de ocupação desses ambientes costeiros. Por estarem próximas do mar, essas vegetações acabam atraindo essa pressão de urbanização, infraestrutura e construção”, afirma o biólogo e professor do curso de Ciências Ambientais da Universidade Federal do Ceará (UFC), Marcelo Freire Moro.
Edificações turísticas, hoteleiras e residenciais ocupam cada vez mais a faixa de areia do litoral cearense, prejudicando os ecossistemas ali presentes. Outras dez cidades do Ceará aparecem na lista de municípios do Brasil com maior degradação de área de restinga.
São elas: Aquiraz (87 ha), Acaraú (45 ha), Paracuru (20 ha), Paraipaba (19 ha), Jijoca de Jericoacoara (19 ha), Cruz (19 ha), Caucaia (16 ha), Camocim (9 ha), Itarema (9 ha), Bela Cruz (4 ha).
A restinga é um ecossistema resistente, que suporta ventos fortes, alta radiação solar e terrenos arenosos. Ela é espaço de reprodução para espécies de tartarugas marinhas que põem ovos na praia, e de descanso para outros animais, como é o caso de aves migratórias.
Além de manter uma biodiversidade de fauna e flora, a restinga ajuda na fixação de dunas. “A vegetação costeira, e não só restingas, mas também manguezais e florestas de dunas, ajudam a conter processos erosivos que podem ser problemas para a sociedade humana. Se você desmata uma duna que estava fixada pela vegetação e ela passa a ser erodida, aquele sedimento depois pode invadir um bairro, uma zona urbana”, explica Marcelo.
O ecossistema também é fundamental na manutenção dos lençóis freáticos e de lagoas costeiras, tendo ainda papel importante na contenção do avanço do mar. “Essa vegetação precisa ser protegida, principalmente no contexto das mudanças climáticas, das grandes marés que acabam destruindo as praias, como está acontecendo em alguns locais do Nordeste”, diz Luís Fernando Guedes Pinto, diretor executivo da SOS Mata Atlântica.
Desmatamento tem redução em áreas de florestas maduras
O balanço do desmatamento na Mata Atlântica no último ano aponta em duas direções. Por um lado, o desmate caiu 27% (de 20.075 para 14.697 hectares) entre 2022 e 2023 nas áreas superiores a três hectares, consideradas de floresta madura, com maior biodiversidade. Mas, o desflorestamento no bioma aumentou cerca de 10% (de 74.556 para 81.356 hectares) nos fragmentos menores e menos consolidados, ou que estão em áreas de transição e incrustados na Caatinga e no Cerrado. No total, foram mais de 200 campos de futebol desmatados por dia.
Os dados foram divulgados ontem, 21, na nova edição do Atlas da Mata Atlântica, que é feito há 13 anos.
O diretor executivo do SOS Mata Atlântica, Luís Fernando Guedes Pinto, conecta os resultados nessas áreas com perfis distintos principalmente às diferenças na aplicação da lei federal 11 428/2006, que protege o bioma.
"O aumento do desmatamento no Nordeste está nas regiões de expansão da fronteira agrícola, que está derrubando matas em velocidade até maior do que no ano passado. Isso indica que nessas regiões a lei da Mata Atlântica não está sendo aplicada", disse.
Por isso, ele considera a queda do desmatamento na floresta madura uma notícia boa, mas com restrições: "É sinal de que a governança está funcionando e que a lei da Mata Atlântica está sendo respeitada nas áreas maiores. Mas, sempre com a ressalva de que a gente não está satisfeito, que é para comemorar com cautela, disse."
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima informou que um plano de proteção à Mata Atlântica deve ser lançado entre setembro e outubro deste ano. (Agência Estado)