Logo O POVO+
Professores refletem sobre motivações e desafios da carreira
CIDADES

Professores refletem sobre motivações e desafios da carreira

No Ceará, há 106.057 professores de ensino básico. Apesar das dificuldades, eles encontram motivação nas histórias de sucesso de seus alunos
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
BRUNA Oliveira é professora no município de Paraipaba (Foto: Arquivo Pessoal/Reprodução)
Foto: Arquivo Pessoal/Reprodução BRUNA Oliveira é professora no município de Paraipaba

O Dia do Professor é celebrado nesta terça-feira, 15 de outubro, em todo o território nacional. A data é dedicada não apenas à comemoração, mas à reflexão sobre os desafios e conquistas da profissão que molda o futuro de uma sociedade.

No Ceará, conforme o Censo Escolar de 2023, há um total de 106.057 professores de ensino básico. Desses, 47 mil (52%) são concursados da rede pública e 42 mil (47%) são funcionários temporários. Outros 348 professores (0,4%) possuem contratos formais pela carteira de trabalho assinada e 135 (0,1%) são contratados como terceirizados. Além disso, o número de professores da rede privada é de 22 mil.

Para entender melhor as realidades enfrentadas por esses profissionais, O POVO conversou com educadores do Ceará. Histórias que revelam as nuances de uma carreira marcada por dedicação, obstáculos e, acima de tudo, pela paixão de ensinar.

Maria Eliswagna da Costa, 35, sabe bem o impacto que a educação pode ter na vida dos alunos. Professora há 16 anos, ela explica que a vontade para ingressar na profissão surgiu aos 13 anos. No entanto, sua trajetória foi marcada por desafios pessoais até conseguir concluir o sonho. "Meus pais se separaram quando eu era criança. Naquela época, eu fazia de tudo para chamar atenção. Cheguei a ponto de colocar apenas o meu nome nas provas, mesmo sabendo o conteúdo”, conta.

Ela explica que, felizmente, teve o privilégio de ter uma boa professora. “Ela percebeu o que eu estava passando e me acolheu. A partir daí, decidi que queria ser como ela, alguém que toca a vida das pessoas”, relata. Hoje, Elis leciona no 5º ano da rede municipal de Caucaia, após anos de dedicação em Pacajus, onde nasceu.

CAUCAIA, CEARÁ,  BRASIL- 14.10.2024: Maria Eliswagna da Costa, professora em Caucaia. Dia do professor. (Foto: arquivo pessoal)
CAUCAIA, CEARÁ, BRASIL- 14.10.2024: Maria Eliswagna da Costa, professora em Caucaia. Dia do professor. (Foto: arquivo pessoal) Crédito: arquivo pessoal

Entre as memórias mais marcantes da carreira, Eliswagna destaca o caso de um aluno que, devido a dificuldades familiares, estava prestes a abandonar a escola. "Ele cuidava do irmão mais novo, que tem autismo, para que a mãe pudesse trabalhar. Insisti para que ele voltasse para a escola, mesmo que ele tivesse que trazer o irmão também”

“Apesar de ele perder praticamente todo o segundo semestre, no dia da prova ele tirou 9. Eu chamei ele e falei: eu sabia que você era capaz! Também foi emocionante receber uma mensagem da mãe dele agradecendo por não ter desistido do seu filho. Esses momentos nos fazem continuar, apesar das dificuldades."

Para ela, o Dia do Professor é uma data para relembrar dos mestres que marcaram nossas trajetórias, sejam eles da educação básica ou superior. Elis, no entanto, ressalta que na Educação ainda permanecem desafios, como a falta de parceria com as famílias. "Muitas vezes, os pais não acompanham a educação dos filhos, o que faz muita diferença. Além disso, temos que lidar com salas superlotadas, principalmente nas cidades menores."

Ser mulher num ambiente predominado por homens

Bruna Oliveira, 31, é professora há cerca de 12 anos. Natural de Fortaleza, atualmente ela é servidora em uma escola de ensino fundamental no município de Paraipaba. Ela também leciona em cursos preparatórios para concursos públicos.

Atuando em diferentes níveis de ensino, Bruna destaca que, enquanto as crianças são mais afetuosas, os adolescentes e adultos exigem mais da profissional. "O desafio é maior, porque eles já têm opiniões formadas e, muitas vezes, resistência ao novo. Porém, com paciência e humildade, conseguimos conquistá-los", observa Bruna.

Apesar dos bons momentos, ela descreve as dificuldades enfrentadas na profissão, especialmente por ser mulher em áreas onde predominam homens. "Principalmente em concursos, na área militar ou administrativa. Alguns alunos, inclusive, pensam que não vamos dar conta de ensinar os conteúdos”, ela explica.

Além de comemorar, o 15 de outubro para Bruna é de refletir sobre seu propósito como profissional. “Sobre como incentivamos nossos alunos. Eu sempre lembro de como eles nos veem como exemplo. Não é fácil ser professor, mas, apesar das dificuldades, é gratificante ver os frutos do nosso trabalho."

Uma missão para com seu povo

Já Glaubiana Alves, professora da Escola Indígena do Povo Jenipapo-Kanindé, em Lagoa Encantada, Aquiraz, carrega desde a infância o sonho de ser educadora, um desejo que foi moldado pelas suas raízes e pela convivência na própria aldeia.

"Fui crescendo e estudando na escola da minha aldeia, e sempre falava que ainda seria professora daquela escola. Hoje, sou licenciada pela Universidade Federal do Ceará e leciono na educação infantil, no 6° ano do ensino fundamental e na educação de Jovens e Adultos”, revela.

Glaubiana destaca que os professores indígenas têm a responsabilidade de preparar os jovens tanto para para o mercado de trabalho e vida em sociedade, como para guiá-los sobre as tradições da etnia.

"Para mim, sempre foi muito gratificante contribuir para as futuras gerações. Assinei meu contrato como professora do meu povo em 2000. A partir dali, minha missão era grande, pois, além de transmitir minha cultura, eu precisava preparar aquelas crianças tanto para a aldeia quanto para o mundo”, conta a educadora.

Ela ressalta, no entanto, que o Dia do Professor é uma data que deveria ter mais visibilidade. “Nós, professores, somos detentores do conhecimento, e é por meio de nós que outras profissões se formam. Somos os formadores de novos cidadãos", conclui.

Uma carreira que merece valorização

Já Rogério Silva Cardoso vivencia diariamente os desafios de uma carreira que, segundo ele, é cada vez mais desvalorizada. Com 24 anos de profissão, ele é graduado em Matemática e, atualmente, é diretor da EEMTI Professora Adalgisa Bonfim Soares, no bairro Conjunto Esperança, em Fortaleza.

Rogério vê o Dia do Professor como um momento para refletir sobre as dificuldades enfrentadas no dia a dia. "Infelizmente, não há muito o que comemorar. A carreira é desvalorizada pela população e pelos governantes. O ambiente escolar, hoje, muitas vezes é adoecedor", lamenta.

Ele aponta a falta de interesse dos alunos como um dos maiores desafios. "Os alunos, com algumas exceções, não querem mais estudar ou fazer as tarefas. Nós concorremos com celulares, tentamos adaptar nossas aulas para captar a atenção deles. Mas sem o apoio das famílias é difícil", desabafa.

Mesmo com esses obstáculos, Rogério encontra motivação nas vitórias cotidianas. "Comemoramos quando vemos nossos alunos sendo aprovados em vestibulares ou se destacando em suas profissões. Essas conquistas nos dão forças para continuar, pois mostram que nosso trabalho faz a diferença", afirma.

Políticas de valorização de professores

Ao O POVO, a secretária da Educação do Ceará, Eliana Estrela, declarou que é fundamental reconhecer que o Dia do Professor deve ser celebrado todos os dias. “Essa missão envolve contribuir para a construção do conhecimento de nossas crianças e jovens. É um momento festivo em que celebramos com a comunidade escolar e colegas, um dia de agradecimento genuíno”

De acordo com a gestora, entre as ações de valorização dos docentes estão os pagamentos retroativos de 2023, além do pagamento das parcelas dos precatórios. “Também implementamos a lei que permite o afastamento para mestrado e doutorado sem prejuízo, bem como a entrega de notebooks a todos os professores e o incentivo a viagens para desenvolvimento profissional”, declarou.

Segundo a secretaria, até o dia 30 deste mês está aberta a seleção para contratos indeterminados. “Desde 2018, convocamos 3.793 aprovados e seguimos comprometidos em valorizar e ouvir as demandas dos profissionais da educação”, conclui.

Origem da data

D. Pedro I foi o precursor da educação no Brasil ao assinar, em 1827, um decreto que estabelecia a criação de escolas de primeiras letras em todo o País, com avanços como a descentralização do ensino, padronização de conteúdos e remuneração dos professores. Mais de um século depois, em 1963, o presidente João Goulart oficializou o dia 15 de outubro como feriado nacional escolar.

O que você achou desse conteúdo?