A 12ª edição da Marcha da Periferia, realizada ontem, 30, reuniu dezenas de movimentos sociais, coletivos e organizações na Praça Santa Cecília, no bairro Bom Jardim, em Fortaleza. Com o tema "Periferia Livre: Políticas Para a Vida e Não Para a Morte", o evento denunciou as práticas repressivas e criminalizadoras presentes nas políticas de segurança pública aplicadas nas periferias do Ceará.
A mobilização cobra uma segurança pública popular, anti-armamentista e não repressiva, com foco no investimento em ações que garantam qualidade de vida e dignidade à população desses territórios. O evento contou com rodas de debate, intervenções artísticas e discursos políticos.
Segundo os organizadores, o dia da Marcha simboliza um momento em que os moradores da periferia se organizam para ampliar o debate sobre as questões que atravessam os territórios.
A escolha do Grande Bom Jardim marcou um retorno da mobilização à periferia. Nesta edição, a movimentação se concentrou na praça, considerando as dificuldades de transitar em áreas dominadas pelo crime organizado.
A coordenadora do Coletivo Vozes, Alessandra Félix, reforça que a região foi escolhida após um consenso entre os diversos organizadores. De acordo com ela, a decisão contempla a resistência e a articulação organizada dos moradores dessa área.
“Quando aconteceu a chacina do Curió, a gente saiu dos territórios para dizer, na Beira Mar, que a polícia estava matando na periferia. Nessa 12ª Marcha, todo mundo quis voltar, mas como é que a gente faz isso? O Grande Bom Jardim, por ter uma rede muito ampla de coletivos que se reúnem, aqui tem muita resistência. Então, a gente falou: vamos!”, explica.
Durante o evento, diversos representantes de coletivos, entidades e frentes discursaram sobre as políticas de controle, vigilância e repressão, especialmente ligadas à segurança pública, que atingem as periferias.
No meio do palco, a educadora social do Centro de Defesa da Vida Herbert de Souza (CDVHS), Lany Maria, reforçou que a escolha daquele espaço simboliza a articulação das demandas dos moradores dentro do próprio território. Para ela, a atual política de segurança pública adotada pelo Estado atua para promover a morte e o encarceramento do povo negro e empobrecido.
“Eu faço essa fala de ‘chega de política pobre para pobre’, porque a gente sempre vê as nossas políticas chegando no papel; porque a gente denuncia e a gente pensa nessas políticas públicas para que elas sejam executadas, mas elas nunca são implementadas”, relata.
Além das pautas de segurança, a educadora reforça que a Marcha amplia o debate sobre outras questões que afligem os moradores dessas regiões. “A Marcha da Periferia tem algumas demandas, como a saúde mental do povo negro e periférico, que é uma demanda enorme. Não dá mais para a gente ter, por exemplo, os CAPS gerais e infantis superlotados”, denuncia.
Edna Carla, representante das Mães do Curió, chamou a atenção para o sofrimento das mães das vítimas afetadas pela política repressiva e vingativa adotada pelos agentes de segurança pública.
A pesquisadora social é mãe de Alef Souza Cavalcante, uma das vítimas da maior chacina do Estado do Ceará, articulada por policiais militares. A chacina do Curió foi tema da 11ª edição da Marcha, realizada no ano passado. Este ano, o impacto da violência policial nas famílias vitimadas pelos crimes também foi pauta do evento.
“São muitas mães morrendo, muitas mães sofrendo, e a gente tem que trazer uma fala e um conhecimento para essas mães. E também para que a gente não deixe mais os nossos jovens serem mortos pela polícia. Isso é uma luta muito grande. Queremos nossa periferia viva. A gente não pode ficar ausente da dor das mães da periferia, são muitas dores”, enfatiza.
O evento também contou com a participação de representantes políticos. Ao falar sobre a temática da segurança pública, o vereador Gabriel Aguiar (Psol) reforçou a importância de tratar do tema por uma perspectiva mais ampla, indo além do caráter ostensivo.
“Se o ambiente da comunidade tiver propício para fomentar a arte, fomentar cultura, a educação, a integração da comunidade; os espaços serem públicos e cheios de gente e atividades, a gente tem, comprovadamente, uma queda vertiginosa da violência”, ressalta.
A construção de uma agenda afirmativa focada na promoção da qualidade de vida e no bem-viver dos moradores de territórios periféricos é o principal objetivo da iniciativa. Abaixo, veja um resumo das principais denúncias e proposições da 12ª Marcha da Periferia.