Logo O POVO+
25 anos depois, como está o jovem apontado como primeiro bebê a nascer em Fortaleza em 2000
CIDADES

25 anos depois, como está o jovem apontado como primeiro bebê a nascer em Fortaleza em 2000

Além disso, o termo "bebê do milênio" é utilizado para marcar a transição do milênio e o impacto das tecnologias, globalização e mudanças culturais e sociais que ocorreram no período
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
JOÃO Mateus de Sousa com a companheira Samire Fernandes e a filha Aurora Sousa (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS JOÃO Mateus de Sousa com a companheira Samire Fernandes e a filha Aurora Sousa

Enquanto a maioria dos brasileiros comemorava a chegada do ano 2000, Silvia Helena de Sousa dava à luz ao terceiro filho, João Mateus, na Maternidade-Escola Assis Chateaubriand, localizada no bairro Rodolfo Teófilo, em Fortaleza. Aos 24 anos, Silvia já era mãe de Rikássia, 6, Rute, 3 e do recém-nascido. Neste 1° de janeiro, Mateus completou 25 anos de idade. 

João é considerado foi a primeira criança a nascer no ano 2000 na Capital e foi chamado à época de bebê do milênio. O termo “bebê do milênio” é utilizado para marcar a transição do milênio e o impacto das tecnologias, globalização e mudanças culturais e sociais que ocorreram no período.

João Mateus tinha previsão de vir ao mundo no dia 7 de janeiro, contudo, nasceu no primeiro minuto do primeiro dia do ano 2000, com 3,480 kg e medindo 50 cm.

Atualmente, com 25 anos de idade, completados ontem, Mateus vive no bairro Parque Dois Irmãos ao lado da companheira, Samires Fernandes, 29, e da filha Aurora de Sousa, de um ano e nove meses. João também é pai de Ana Júlia, de seis anos, fruto do seu primeiro relacionamento.

 

A renda da casa provinha da venda de marmitas, no entanto, o ponto comercial onde os materiais de produção eram guardados, no bairro Genibaú, foi invadido há cerca de três meses. Devido à perda e ao prejuízo, Mateus passou a fazer bicos de pintor e a esposa conseguiu um emprego em uma pizzaria do bairro onde residem.

“A gente estava indo bem, mas aí levaram nossas coisas e desde esse tempo que estou trabalhando avulso. Hoje faço pintura em condomínios, apartamentos, em Fortaleza”, relata.

Além de pintor, Mateus também trabalha com instalações elétricas, papel desempenhado pelo pai, Francisco Alves Ricarte. Ele destaca que aprendeu as técnicas quando ainda tinha 12 anos, observando Francisco trabalhar nas instalações da casa onde a família morava, no bairro Genibaú. O núcleo era formado pelo casal Francisco e Silvia, e pelos filhos: Rikássia, Rute e Mateus.

Questionado acerca da infância, João destaca que a casa simples onde a família morava ficava em frente a um canal, dentro de uma comunidade. O milênio principiava, porém, a violência social já estava instalada no bairro há anos. Mateus cita que a infância “foi muito difícil”, tanto pelo contexto social quanto pelo econômico.

“Tive tudo pra estar naquele meio até hoje, mas eu quis sair por opção. Nunca foi o melhor canto pra viver, nem pra mim e nem pra ninguém. Tanto que eu crio minha filha aqui no Parque Dois Irmãos, é bem melhor pra ela”.

Mesmo diante das dificuldades, Mateus cita que a infância dele foi como a de outra criança daquela época, que diferente da atual geração, costumava brincar de bolinha de gude e soltar pipa. Ainda quando menino, Mateus relembra, com carinho, o dia em que o pai o presenteou com a primeira bicicleta.

“Era uma bicicleta usada, de segunda mão. Aí quando eu andava com ela o pessoal ficava fazendo hora, perguntando ‘ei, macho, tá andando numa lacraia?’. Naquela época não tinha celular, a gente brincava disso mesmo”, complementa.

A pré-adolescência de Mateus foi marcada por aventuras. Aos 15 anos, o hobbie favorito do pintor era surfar. Em uma tarde da alta estação marítima, João foi saltar da ponte metálica, que fica na Praia de Iracema. Ele relata que praticava o salto habitualmente, no entanto, naquele dia, o forte vento o levou diretamente para uma coluna oxidada pela maresia.

“Eu bati o pé na coluna quebrada, não conseguia nadar e me afoguei. Um surfista que estava lá me colocou na prancha e me levou até a areia”, recorda.

Uma quantidade significativa de água entrou no corpo de Mateus, fazendo com que ele perdesse boa parte da audição no ouvido esquerdo. O pintor relata que fez exames e foi constatado que ele precisaria de um aparelho auditivo para amenizar as consequências do acidente.

“Trabalhei em uma empresa de tecidos, mas fui colocado pra fora porque não estava mais conseguindo operar as máquinas. Por causa da baixa audição, não conseguia ouvir o sinal do galpão. Passei três meses lá”, menciona.

Com o passar do tempo, a chegada da adolescência sinalizou que ele precisaria de espaço e liberdade. Para isso, aos 16 anos começou a trabalhar com um amigo montando cercas elétricas, conquistando, assim, sua independência pessoal e financeira.

“Eu chegava tarde em casa, gostava de namorar e quando eu chegava depois das 22 horas meu pai fazia uma confusão. Aí foi por isso que eu fui embora”, pontua.

Os estudos, ele explica, não eram uma prioridade. Para conciliar o trabalho e os estudos, Mateus começou a Educação de Jovens e Adultos (EJA).

“Quando saía de lá (da escola) ia trabalhar. Minha rotina era essa, passei um bom tempo assim. Trabalhei com meu amigo por uns três anos montando cerca elétrica e tive que me manter, foi difícil no começo”, afirma.

O EJA não foi concluído. Mateus cita que cursou até a sétima série da modalidade, faltando apenas duas séries para finalizar o ensino e receber o certificado.

O crescimento de Mateus ocorreu em paralelo aos avanços tecnológicos. Questionado acerca dessas mudanças e os impactos na geração atual, o pintor explica que o papel dos pais é dosar a quantidade de informações às quais as crianças estão expostas.

“O celular em si não está mostrando tanta coisa, mas a criança vai querer pesquisar, dependendo do que ela vai aprender com os pais”, destaca.

A formação cultural de João Mateus converge para três clássicos dos anos 2000: Dragon Ball Z, Mamonas Assassinas e o rapper paulistano Sabotage, assassinado em 2003.

“Todo dia eu chegava da escola, corria para a televisão e ia assistir Dragon Ball Z, que passava na TV Globinho”, prossegue. “Em relação à música, minha mãe costumava ouvir Mamonas Assassinas, escutava muito quando era menino. Mas também curtia ouvir o Sabotage”.

Os aniversários, conforme Mateus, eram simples e não tinham “nada de muito especial”. Isso porque, segundo ele, as comemorações da virada do ano eram sempre realizadas em casa, uma vez que os pais temiam pela segurança dos três filhos.

“Eu cansei de estar brincando no portão de casa e ver o pessoal passando armado. Estava deitado e ouvia tiroteio. Não tínhamos aquele costume de sair no ano novo por causa disso. Às vezes íamos pra Caucaia, pra casa da minha avó, lá a gente podia brincar, o bairro era mais tranquilo”, complementa.

Como hobbie, Mateus adotou o desenho, mais precisamente a tatuagem. No braço esquerdo ele carrega uma das suas criações, que também podem ser notadas no antebraço da esposa.

“Nas minhas horas livres eu gostava de tatuar. Até hoje eu faço, mas hoje em dia eu não faço com tanta frequência por causa da minha filha, evito fazer isso na frente dela porque ela gosta de repetir tudo que a gente faz”, segue. “E hoje em dia, se quiser seguir a profissão, tem que estar estudando e praticando, eu não tenho todo esse tempo”.

As expectativas para o futuro, segundo Mateus, é comprar um carro e continuar as obras da casa da família.

“Por enquanto estamos morando num quarto, pretendo terminar a construção e comprar um carro, porque eu tinha um, mas perdi. Usava ele pra trabalhar, não tinha habilitação porque, na época, eu tinha o dinheiro do carro, mas não tinha como tirar a carteira, acabei me acomodando e passei numa blitz e perdi”, detalha.

O nascimento

A mãe, Silvia Helena, concedeu uma entrevista ao O POVO à época em que João Mateus nasceu, relatando que o médico chegou a brincar, afirmando que João seria o primeiro bebê de 2000.

“Ele me disse que o bebê deveria nascer entre os dias 30 e 31, e que eu me preparasse para ter o bebê na madrugada da virada do ano", disse na ocasião.

Aos 24 anos, Silvia já era mãe de Rikássia, 6, Rute, 3 e do recém-nascido.

O pai de João Mateus, o eletricista Francisco Alves Ricarte, tinha 40 anos de idade quando João nasceu. Devido à ansiedade, Ricarte optou por ficar em casa.

“Eu não aguentei esperar e liguei para a maternidade. Agora, a única coisa que espero para o meu João é que ele cresça com saúde”, disse ao O POVO à época.

Nos dias atuais, Mateus relembra da infância difícil que enfrentou ao lado do pai, mãe e das duas irmãs. A família morava na rua Quintela, n° 80, no bairro Genibaú, em uma casa de tijolos que ficava em frente a um ponto de alagamento durante a quadra chuvosa.

O cenário precário se dava porque o chefe da família não conseguia um emprego fixo na área que atuava. O motivo, conforme a esposa relatou à época, era a idade de Francisco.

Já para Silvia, as possibilidades de contratação eram ainda menores, uma vez que a mulher só havia estudado até a quarta série do ensino fundamental. Como doméstica, Silvia citou que os contratantes optavam por aquelas que dormiam no serviço, o que para ela era inviável por causa das crianças.

Quando Mateus tinha seis anos de idade, Silvia e Francisco optaram pela separação. Diante disso, Francisco retornou para a cidade natal, Iguatu, e Silvia permaneceu na casa onde a família residia, local onde hoje mora com o padrasto de Mateus e Rute, a filha do meio.

 

O que você achou desse conteúdo?