A média de chuvas acumulada até esta terça-feira, 21, já está entre as três maiores registradas para o mês de janeiro dos últimos 14 anos no Ceará. Com 145 milímetros (mm) somados desde o primeiro dia do ano, o período está atrás apenas dos valores de 2016 e 2022, quando foram anotados respectivamente 190 e 163 mm.
Os dados foram coletados pelo O POVO por meio do Calendário de Chuvas da Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme) e refletem o acentuado volume de precipitações que têm caído sobre o Estado, como as da última quarta-feira, 15, quando todas as cidades cearenses registraram chuvas.
Foi nesta data que o Ceará registrou suas três maiores precipitações do ano até aqui, nas cidades de Pacujá (230 mm), Cariré (217 mm) e Forquilha (203 mm), todas na macrorregião da Ibiapaba. A localidade está entre os destaques do cenário de chuvas neste início de ano e já supera em 67% o acumulado previsto para todo o mês.
Faltando 10 dias para o fim de janeiro, a média acumulada tende a subir com novas precipitações no Estado. Segundo previsão da Funceme, há possibilidade de chuvas intensas, em alguns momentos acompanhadas de trovoadas, na manhã de quarta-feira, 22, e noite de quinta-feira, 23.
Contudo, mesmo que os próximos dias apresentem tempo firme, a Terra da Luz superou o intervalo entre 66 e 133 milímetros, considerado pela Funceme como variação dentro da média para o mês.
O início do ano foi tímido no quesito chuvas em todo o Ceará. Com a primeira semana caracterizada por altas temperaturas e poucas chuvas, os registros mais acentuados começaram no dia 7 de janeiro, quando a região do Cariri teve acumulados de até 155 mm.
Conforme publicado pelo O POVO à época, as chuvas foram resultado da formação de nuvens em áreas de instabilidade que estavam posicionadas sobre a Região do Cariri e no sul do Sertão Central e Inhamuns.
Já na semana seguinte, a partir do dia 13, as precipitações chegaram de forma simultânea a todas as macrorregiões, por causa da atuação simultânea de dois sistemas meteorológicos, a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) e a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT).
Posicionada próxima à Bahia, a ZCAS é responsável pela formação de nuvens no Centro-Sul do Estado, enquanto a ZCIT favorece a incidência de precipitações na porção Norte, como a Região Litorânea e Ibiapaba.
Previsão oficial da quantidade de chuvas a cair sobre o Ceará no primeiro semestre, o prognóstico da quadra chuvosa será apresentado nesta quarta-feira, 22, pela Funceme. O documento deverá ter indicações sobre os cenários esperados para os meses de fevereiro, março e abril, que compõem o período de maiores precipitações no Estado.
Antes mesmo do prognóstico geral, a Fundação antecipou que pelo menos na Capital e na Região Metropolitana, o trimestre será de chuvas dentro ou acima da média. Em 2024, a Funceme indicou 45% de chance de chuvas abaixo da média entre fevereiro e abril, indicativo que foi atualizado dois meses depois, para 40% de chance de chuvas dentro da média entre abril e junho
Moradores de Independência relatam terror com transbordamento de barragem: "Medo de acontecer de novo"
Moradores da zona rural de Independência, município a 306 km de Fortaleza, viveram momentos de terror no último domingo, 19. Isso porque cerca de dez localidades registraram alagamentos em decorrência das chuvas na cidade, que fizeram com que uma barragem transbordasse. Moradores e animais precisaram ser resgatados.
A enchente causou danos físicos e psicológicos aos moradores, além de perdas financeiras na comunidade, que vive principalmente da agricultura.
Segundo a Funceme, entre as 7 horas de sábado, 18, e 7 horas de domingo, 19, o município registrou 20 milímetros de chuva. O volume é considerado baixo, especialmente em área rural. O alagamento, no entanto, foi causado pela sangria de uma barragem em um reservatório, conhecido como açude “Catirina”.
De acordo com a Defesa Civil de Independência, as localidades atingidas foram: Várzea Grande, Araújo, Jucá, Miramar, Muquem, Assentamento Pintada, Oiticiquinha, Catirina, Promissão e Pereiros.
A barragem, de propriedade privada, não estava registrada no Cadastro Estadual de Barragens (CEB). Dessa forma, não era monitorada pelos órgãos responsáveis pela fiscalização dos recursos hídricos no Ceará. O proprietário da estrutura ainda não foi localizado.
Ana Cláudia Vieira, 33, moradora de Jucá, conta que estava chovendo na manhã daquele domingo, por volta das 8 horas. Ela explica que seu sogro, que estava trabalhando na fazenda, foi o primeiro a perceber a situação.
“Ele viu que a água estava vindo muito depressa pelo beco e me ligou pedindo por ajuda para atravessar as vacas. Quando cheguei lá, ele, meu marido e meu irmão estavam tentando salvar os animais, mas a correnteza estava muito forte”, conta Cláudia.
A situação se agravou quando o sogro de Cláudia foi arrastado pela força da água. Felizmente, ele conseguiu se agarrar a um galho. O marido também foi levado, mas conseguiu boiar e sair em segurança. Já o irmão ficou preso em um pedaço de terra cercado pela correnteza.
Em desespero, Cláudia utilizou as redes sociais para pedir socorro. “Eu estava nervosa demais, não conseguia ligar para ninguém. Gravei áudios e vídeos pedindo ajuda. Graças a Deus, um amigo do meu irmão que sabia nadar foi lá e conseguiu tirá-lo com uma boia antes de os Bombeiros chegarem”, relata.
Apesar do que foi inicialmente noticiado, o alagamento na região não foi causado pelo rompimento de uma barragem, como ressaltaram os moradores e a Defesa Civil. “Se a parede tivesse realmente arrombado, a situação seria ainda pior. A água poderia ter alcançado nossas casas”, explica Cláudia.
Confira registros feitos por moradores:
O Corpo de Bombeiros chegou à comunidade por volta do meio-dia, com um bote para resgatar pessoas e objetos arrastados pela água. Segundo Cláudia, a operação foi dificultada pela correnteza e pelas cercas de arame que impediam o acesso.
No total, cinco pessoas e dois cachorros foram resgatadas sem ferimentos, com o auxílio de um helicóptero da Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas (Ciopaer). A água começou a baixar lentamente no final do dia de domingo, mas foi apenas na manhã seguinte que a situação se estabilizou.
Taciany Pereira Melo Coutinho, 41, moradora da comunidade rural de Grota Grande, recebeu mensagens pedindo por socorro na manhã do incidente. Desesperada, ela foi até Miramar, comunidade próxima onde tem muitos amigos, para verificar a situação. “A gente vê essas coisas na TV ou no rádio, mas nunca imagina que vai acontecer com a gente. Quando você vê a situação de perto, é muito angustiante”, diz.
As consequências do alagamento foram graves, com plantações destruídas e muitos animais perdidos ou mortos, incluindo porcos, galinhas e gado. “As estradas carroçáveis estão péssimas por conta das chuvas, ficaram praticamente intransitáveis, com muita lama”, aponta Taciany.
Para Cláudia Vieira, as chuvas características dos próximos meses causam angústia. “O inverno aqui no interior está só começando, então não adianta plantar de novo agora, porque pode vir mais chuva e acontecer tudo outra vez”, lamenta.
Após o trauma, a comunidade ainda está em alerta. “Eu mal consegui dormir à noite. Nunca passamos por isso antes. Só víamos essas coisas pela televisão. Agora, a gente fica com medo de acontecer de novo”, conclui.
No domingo, 19, o prefeito de Independência, William Vieira (PT), usou suas redes sociais para alertar os proprietários de terrenos com açudes a verificarem possíveis erosões ou problemas estruturais. “Observem também as condições dos sangradouros e, caso identifiquem algum risco, entrem em contato para buscarmos juntos uma solução”, disse.
De acordo com a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos (Funceme), a região do Sertão Central e Inhamuns, onde se localiza o município de Independência, tem previsão de chuvas para esta quarta-feira, 22, e quinta-feira, 23.
Dessa forma, Lucio Ernandes, diretor do Departamento de Defesa Civil do município, explica que ainda é necessário se manter alerta. "Realizamos vistorias para identificar riscos de rompimento ou transbordamento e estamos orientando a população. Também monitoramos áreas que podem precisar de evacuação”.
A Prefeitura de Independência informou que, em caso de desastres ambientais ou emergências, a população pode acionar a Defesa Civil pelo número +55 88 9945-0809.
Novos equipamentos ajudarão na fiscalização
A Companhia de Gestão de Recursos Hídricos (Cogerh) adquiriu novos equipamentos que irão ajudar na gestão dos recursos hídricos do Ceará. O Drone (RPAS) de asa fixa com RTK e um receptor GNSS RTK, investimentos de R$ 449.970, ajudarão na fiscalização e no planejamento de segurança.
Em agosto último, o órgão adquiriu 10 novos equipamentos para medição de vazão. Os instrumentos foram destinados às gerências regionais em todo o Estado.
Ao O POVO, o diretor de operações da Cogerh, Tércio Tavares, afirmou que com os novos equipamentos, será possível ter um melhor controle da gestão de recursos hídricos em um curto espaço de tempo. Dentre as funções do drone, está a fiscalização no uso de água, dimensionando quanto um usuário pode captar.
Tércio destaca, também, o uso da batimetria, técnica de medir a profundidade em corpos d'água, e o Plano de Segurança de Barragem: "Caso haja uma ruptura, conseguimos obter um perfil topográfico, o caminho que aquela água vai correr e em quanto tempo vai chegar naquela cidade". (Bárbara Mirelle/Especial para O POVO)
Cenário
Macrorregião da Ibiapaba liderava resultados mais expressivos até essa terça-feira, 21