Logo O POVO+
Famílias que vivem debaixo de viaduto da Borges de Melo dizem que foram intimidadas a derrubar barracos
CIDADES

Famílias que vivem debaixo de viaduto da Borges de Melo dizem que foram intimidadas a derrubar barracos

Dois homens que diziam ser representantes da Prefeitura teriam intimidado moradores a destruírem casas situadas debaixo do viaduto da av. Borges de Melo. Município nega ação
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
ALGUNS barracos foram derrubados (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal ALGUNS barracos foram derrubados

Famílias que residem debaixo do viaduto da avenida Borges de Melo, em Fortaleza, contam que viveram um drama nessa sexta-feira, 25. Conforme denúncias, dois homens que diziam ser representantes da Prefeitura, mas sem identificação, foram ao local e intimaram moradores a derrubarem os barracos montados no espaço, chegando a oferecer dinheiro. Município diz que não foi o responsável pela intervenção. 

De acordo com relatos, a dupla apareceu no local por volta das 10 horas e ofertou uma quantia de R$ 420 para que eles colocassem abaixo a casa onde vivem. Caso não aceitassem a proposta, um "trator" passaria "destruindo" tudo. Homens também alegaram que a ação teria o apoio da polícia. Vídeos feitos via celular registram trechos da ação.

Leia também: Censo da população em situação de rua em Fortaleza deve ser apresentado até junho

Valor oferecido seria o equivalente à primeira parcela do programa Aluguel Social, benefício que auxilia pessoas em vulnerabilidade a alugarem uma casa, mas não houve a garantia de que as demais mensalidades seriam pagas. Também não existiu uma identificação formal de que ação era da Prefeitura. 

Moradores afirmam que homens já haviam aparecido no espaço com essa proposta na semana passada, mas dessa vez a intimação surtiu efeito. Muitos passaram dados de documentos e aceitaram o dinheiro, que foi entregue pra eles dentro de um tipo de saco usado normalmente para fazer "dindim". 

O POVO foi ao espaço e observou que muitos dos cerca de 80 barracos presentes foram destruídos. Sem as lonas ou tábuas que formavam as casas, o chão ficou tomado por objetos como garrafões de água, sofás, camas, armários e outros móveis.

Para os moradores, destruir os barracos foi como arrancar um pedaço da vida que há muito custo ergueram. É o caso de Valter Rodrigues, 59, que há cerca de cinco anos vive no local com a companheira.

No espaço, ele improvisou uma "casa", que aos poucos conseguia melhorar. Já havia passado cimento no chão e até chegou a botar cerâmica em uma parte dele. Agora, olha para o espaço sem teto e deteriorado com os olhos cheios de lágrimas.

"Isso daqui é meu rancho (...) Eu gastei todo dinheiro que eu tinha fazendo isso", conta com a voz embargada. Ainda não havia conseguido sequer comer de tristeza. 

Próximo a ele, Flávio dos Santos, 27, usava o martelo para tentar retirar tábuas de um barraco. Ele também teve a casa derrubada. "A gente tem medo de morar no meio da rua porque a gente não tem canto pra morar, não tem como a gente alugar porque as vezes é muito caro", conta.  

No espaço, só as crianças pareciam despreocupadas, alheias a situação. Entres elas, os três filhos de Maria da Silva, 35, que há pelo menos dez anos vive no local: "Sabe o que é você tá no meio da rua feito cachorro? Meus filhos são doentes, onde a gente vai ficar? O único canto que a gente conseguiu foi aqui".  

Prefeitura nega autoria da intervenção

Por não receberem comprovação formal de que a Prefeitura foi a responsável pela ação e de que ela vai auxiliar populares, os moradores temem por sua segurança e não sabem para onde podem ir. 

Procurada pelo O POVO via WhatsApp, a assessoria da Secretaria dos Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SDHDS) informou que as equipes de assistência não foram autoras da intervenção.

Além disso, por ligação, foi explicado que as moradias do local são de responsabilidade da Habitafor. Por sua vez, a Habitafor também negou que tenha realizado a ação e explicou que as políticas habitacionais que existem dependem de cadastro, não funcionando mediante entrega de dinheiro em mãos.

O POVO questionou por WhatsApp e por e-mail para ambos os órgãos se eles vão realizar alguma ação para proteger as famílias do local ou se vão averiguar a autoria da intervenção, mas até o fechamento da matéria não houve resposta para esse questionamento. 

Homens que foram ao local também informaram que a polícia ia montar um "acampamento" no lugar, para garantir saída das famílias. A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS) disse que a informação não é verdadeira e pontuou que não houve acionamento para essa ocorrência.

O que você achou desse conteúdo?